Novo planeta extra-solar leva-nos até ao futuro da Terra

Vai ser engolido já amanhã, em termos cósmicos, pela estrela que orbita. Trabalho sobre planeta controverso é de equipa internacional, que inclui dois astrofísicos portugueses.

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Representação artística da estrela gigante vermelha Kepler-91 e do planeta D. Cabezas

É como se o futuro ainda distante do Sol e da Terra tomasse corpo, à medida que nos inteiramos dos pormenores da descoberta de um planeta extra-solar e da sua estrela. Tal como acontecerá um dia quando o nosso Sol estiver a morrer, essa estrela já se transformou numa gigante vermelha e está a aumentar de tamanho, até um dia engolir tudo o que está à volta. O novo planeta, o mais próximo de uma estrela gigante alguma vez encontrado, a menos de 11 milhões de quilómetros dela, como foi anunciado, não escapará a esse destino — e que, no fundo, é uma antecipação do que pode suceder à Terra daqui a muito, muito tempo.

O planeta tem dado que falar desde a sua detecção, em 2011. Foi descoberto pela equipa do telescópio espacial Kepler, lançado pela agência espacial norte-americana NASA em 2009. A equipa da NASA tinha utilizado o método dos trânsitos para detectar a presença do objecto em órbita da estrela: ao passar à frente da estrela, este método permitiu ver que o planeta lhe roubava regularmente um pouco de brilho, denunciando que estava ali. Para esta equipa, este corpo era um planeta, que demorava apenas 6,25 dias a completar uma volta à sua estrela, a KIC 8219268 ou Kepler-91, na constelação da Lira.

Pouco depois, estes resultados foram contestados por outra equipa que analisou os dados do telescópio Kepler: dizia que este objecto emitia luz, por isso não era um planeta, mas uma estrela companheira da Kepler-91.

Planeta ou, afinal, estrela? Uma equipa de cientistas de Espanha, da Alemanha e do México — além dos astrofísicos portugueses Nuno Santos e Pedro Figueira, da Universidade do Porto — procurou deslindar a controvérsia. Na revista Astronomy & Astrophysics, esta equipa publicou um artigo científico a confirmar a natureza de planeta do objecto, na sequência de novas observações, através de outro método, no Observatório de Calar Alto, em Almería, Espanha.

Esta controvérsia evidencia “o quão difícil é detectar planetas e como a comunidade está empenhada em encontrar novas maneiras, cada vez mais precisas, de o fazer”, refere Pedro Figueira, num comunicado da sua instituição.

Desta vez, os cientistas utilizaram o método das velocidades radiais: detecta pequenas oscilações na estrela causadas pela gravidade de um objecto que a orbite, o que permite calcular a massa desse objecto. Assim, a equipa pôde concluir tratar-se, afinal, de um planeta. O Kepler-91b, como é o seu nome, é pouco maior do que Júpiter: tem 1,09 vezes a massa do maior planeta do nosso sistema solar. Determinou-se ainda, com outras técnicas, que tem 1,38 vezes o diâmetro de Júpiter.

No catálogo, cada vez maior, de planetas noutros sistemas solares — estão confirmados até agora mais de 1700 desde a descoberta do primeiro, em 1995 — constam alguns que se encontram muito próximos da sua estrela. Mas, falando de estrelas gigantes que esses planetas orbitam, o Kepler-91b é o mais perto de uma dessas estrelas alguma vez detectado.

Uma comparação com o nosso sistema solar dá uma noção mais clara das distâncias. Mercúrio, o planeta mais perto do Sol, está a 58 milhões de quilómetros dele. Ora o Kepler-91b está 5,3 vezes mais perto da sua estrela do que Mercúrio está do Sol, o que significa que estão separados só por cerca de 10,9 milhões de quilómetros. Já agora, a Terra está a 150 milhões de quilómetros do Sol.

A 3360 anos-luz de distância de nós, na Via Láctea, o Kepler-91b tem o futuro próximo traçado. Deverá ser engolido pela sua estrela daqui a 50 ou 60 milhões de anos, o que em termos cósmicos não é nada. Será apanhado pela estrela, de massa mediana como o nosso Sol e, neste momento, já moribunda. “Detectaram-se muito poucos casos como este, embora tenha havido alguns em que se detectaram indícios de planetas engolidos pela sua estrela”, sublinha ao jornal El Mundo o autor principal do trabalho, o espanhol Jorge Lillo-Box, do Centro de Astrobiologia, em Torrejón de Ardoz, na província de Madrid.

Ora quando as estrelas medianas começam a ficar sem hidrogénio, que foi transformando em hélio nas reacções nucleares ocorridas no seu interior, significa que estão a chegar ao final da vida. Nessa altura, para tentar contrariar o colapso da matéria sobre si própria, essas estrelas aumentam de tamanho à medida que ainda vão transformando em hélio o hidrogénio que lhes resta. As camadas exteriores da estrela expandem-se e arrefecem um pouco, o que lhe confere uma cor vermelha. A estrela transforma-se assim numa gigante vermelha, tendo várias vezes o diâmetro inicial. No caso do Sol, actualmente com 5000 milhões de anos e a meio da vida, irá engolir, quando for uma gigante vermelha, Mercúrio, Vénus e talvez a Terra. Mas só daqui a cerca de 7500 milhões de anos.

Quando o fim de uma estrela destas está mesmo a chegar, dá-se a produção de uma sucessão de elementos químicos, em fusões nucleares. Em períodos que se prolongam por milénios, a estrela tanto se expande como se contrai, pulsando, e de vez em quando expele as camadas exteriores. Nesses momentos finais, atira o revestimento para fora e deixa no interior um caroço, tornando-se então uma anã branca. Sem gravidade suficientemente forte, os restos mortais do nosso Sol deixarão de aprisionar os planetas sobreviventes.

Ainda que muito longe de nós, o Kepler-91b e a estrela sua companheira permitem-nos embarcar numa viagem até ao futuro do nosso sistema solar.

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