Quadrienal de Praga de 2015 já tem comissários mas terá menos verbas

DG Artes anunciou comissários para a mais importante montra mundial de cenografia. Ainda não há projecto mas pede-se sustentabilidade e imaginação. Tudo com menos de 200 mil euros.

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A cenografia para "Propriedade Privada", de Olga Roriz, foi uma das que João Mendes Ribeiro levou a Praga em 2007 Paulo Pimenta

No próximo ano a cidade de Praga, na República Checa, pode esperar uma “panorâmica da cenografia portuguesa”. É a intenção de José Manuel Castanheira, cenógrafo e um dos três comissários responsáveis pela selecção do projecto que representará Portugal de 18 a 28 de Junho na 13.ª Quadrienal de Praga, a mais importante mostra mundial de cenografia e arquitectura teatral que existe desde 1967. Ainda não há projecto mas já se sabe que há menos dinheiro do que em 2011.

O convite feito pela Direcção-Geral das Artes (DGArtes) à Associação Portuguesa de Cenografia (Apcen) foi publicado esta quinta-feira em Diário da República, oficializando um trabalho que há meses envolve a sua direcção, presidida por Castanheira, Marta Carreiras e Rui Francisco, os três responsáveis pelo comissariado do projecto expositivo.

Ao PÚBLICO Samuel Rego, director-geral das Artes, diz que a escolha da Apcen representa uma opção “idónea, colegial e representativa” cuja missão terá como objectivo “dignificar a cenografia portuguesa no plano internacional” atendendo “ao sentido de responsabilidade [que resulta] das últimas duas representações terem sido muito bem recebidas”. Em 2007, a primeira vez que a DG Artes se responsabilizou pela escolha do nome a convidar, o trabalho do arquitecto e cenógrafo João Mendes Ribeiro foi distinguido com uma medalha de ouro por Best Stage Design. Em 2011, o cenógrafo e encenador João Brites foi o representante nacional com a retrospectiva Do outro lado, cujo projecto expositivo foi co-assinado por Rui Francisco e que incluiu ainda a estreia de três espectáculos d’O Bando, dirigido por Brites. “É este tipo de instrumentos que sabemos serem altamente imprescindíveis para valorizar e dar coesão à cenografia e às artes performativas [de modo a que] possam existir, e tenham um peso, no panorama artístico internacional”, diz Samuel Rego.

José Manuel Castanheira reforça que a Apcen, sendo “um organismo que reúne cenógrafos e não só, [tem] legitimidade e know-how para promover uma panorâmica que não centre, de forma redutora, [a realidade nacional] na exposição de uma só individualidade”, como aconteceu nas últimas duas edições.

Valores para o projecto futuro da APcen para Praga ainda não existem e José Manuel Castanheira não quis avançar ao PÚBLICO o que seria um orçamento ideal, mas garante haver “um acordo de princípio de que haverá um apoio com alguma dimensão”, trazendo à memória as experiências de 1991 e 1999, onde foi artista convidado e comissário, e em que a presença nacional foi feita de forma precária e sem apoios da cultura”. "Há um mínimo necessário", diz Castanheira, que acrescenta: "Se não houver dinheiro não podemos fazer, mas não creio que isso vá acontecer".  

Contudo, Samuel Rego disse ao PÚBLICO, que "a DGArtes deixará ao critério da sustentabilidade da proposta, mas está fora de hipótese trabalhar com os valores da última quadrienal, uma vez que superaram os 200 mil euros", que já eram menos 100 mil euros do que para o projecto de 2007. Em Outubro, o director-geral das Artes espera apresentar o projecto já orçamentado, uma vez que a 30 de Setembro os países têm de anunciar vão responder ao tema da Quadrienal, SharedSpace: Music Weather Politics [Espaço partilhado: Música, Clima, Político].

Diz a organização nas notas de apresentação que as manifestações públicas do últimos três anos em vários pontos do mundo mostram a “necessidade de usar a teatralidade como meio de expressão (representar, mascarar, construir espaços temporários)". "É altura de repensar o teatro como ‘o último espaço humano’”, escrevem . Os comissários terão até 31 de Janeiro do próximo ano para apresentar os seus projectos mas José Manuel Castanheira diz que o debate nacional sobre o que possa ser "uma panorâmica da cenografia nacional" só agora começou. "A cenografia é sempre um somatório de várias formas de pensar”, diz sobre o que possa singularizar a cenografia portuguesa, adiantando que a questão "já foi levantada, mas nunca foi balizada ou discutida no seio da associação”.

Do lado da DG Artes, Samuel Rego diz apenas que "não coloca entraves nem condições", mas quer garantir que a representação portuguesa "é um projecto sustentável que valorize a cenografia no plano internacional", esperando apenas "um impacto duradouro desta representação". E deixa em aberto a possibilidade e aproveitamento do projecto após o fim da quadrienal, como acontceu em 2007 ou, mais recentemente, com a reconversão do Trafaria Praia, o pavilhão flutuante que Joana Vasconcelos levou à Bienal de Veneza em 2013 (ver caixa). O director-geral das Artes acredita que este modelo "democrático e transparente" para as bienais e quadrienais se inscreve no modo como a DG Artes "conseguiu ir mais além no apoio à internacionalização das artes". "Em linguagem económica, diversificámos o investimento. Acima de tudo fomos à procura de uma fórmula mais democrática e transparente. Não ficámos cingidos ao formato do século XIX, de arte oficial de um estado-nação”, acrescentou o director-geral.

Portugal participou em cinco das 12 edições da Quadrienal de Praga: 1979, 1991, 1999, 2007 e 2011. Dessas, José Manuel Castanheira, que foi co-director do Teatro Nacional Dona Maria II, foi artista convidado em 1991, com João Brites, e comissário, em 1999, com Marta Carreiras, onde também apresentou trabalho seu.

A relação de Portugal com a Quadrienal de Praga começou, efectivamente, em 1979, facto que foi sublinhado pela imprensa internacional, que destacava a presença nacional ao lado de outro estreante, a Turquia, após ter falhado as edições de 1967, 1971 e 1975. Mas Portugal atrasou-se na entrega dos materiais para o catálogo e não se encontram hoje registos oficiais. Em 1991 a escolha dos cenógrafos coube à Bienal Universitária de Coimbra, quebrando um hiato de 11 anos.

Como a organização diria ao Expresso de 22 de Junho de 1991 “o escasso apoio deste ano (subsídios pontuais da Fundação Calouste Gulbenkian e do Ministério dos Negócios Estrangeiros) apenas permitiu que, simbolicamente, se abrissem as portas para uma participação verdadeiramente representativa em 1995”. Castanheira e Brites levaram trabalhos seus feitos nos anos anteriores. Em 1999, o comissariado de José Manuel Castanheira e Marta Carreira reunia, mais uma vez, o trabalho de Castanheira e Brites, aos quais se juntavam os olhares e criações de Nuno Carinhas (hoje director do Teatro Nacional São João), António Casimiro, José Rodrigues e Juan Soutullo. 

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