Os vários mundos que constroem a identidade de Paredes de Coura

Não há blockbusters como noutras edições, antes uma diversidade onde se reflecte um festival para a imensa minoria com a música popular urbana como companhia inescapável.

Fotogaleria
James Blake será generoso na sua passagem por Paredes de Coura: depois do concerto de sábado, encerrará o festival como DJ RUI SOARES
Fotogaleria
Os Franz Ferdinand regressam quase com aura de veteranos antes do tempo NUNO FERREIRA SANTOS

Não tem, como em edições anteriores, nomes absolutamente congregadores e transgeracionais como Nick Cave & The Bad Seeds, Pulp, Arcade Fire ou os regressados Ornatos Violeta. Não tem, ao contrário do ano passado, uma carta fora do baralho a gerar tanta desconfiança quanto expectativa como os The Knife. A edição de 2014 do Festival Vodafone Paredes de Coura é de outra natureza. Digamos que, sem blockbusters (James Blake é o que mais se aproxima, os regressados Franz Ferdinand já deixaram de o ser), o festival apresenta uma concentração de talentos da música popular urbana do nosso tempo que o torna particularmente aliciante.

No anfiteatro natural onde está instalado o palco principal e no palco Vodafone FM instalado na tenda acima daquele, acompanharemos a partir de quarta-feira, a noite de apresentação, uma programação que, na sua diversidade, é representativa de um olhar perante a criação musical contemporânea. Agrupam-se velhos conhecidos (Franz Ferdinand, Linda Martini) a nomes inescapáveis do nosso tempo (James Blake, Kurt Vile, Mac DeMarco), juntam-se-lhes o rock’n’roll (Black Lips, Thee Oh Sees) e o synth-pop (Cut Copy, CHVRCHES), a folk à americana (Conor Oberst) ou o hip-hop à portuguesa (Capicua), e forma-se um caleidoscópio que faz jus à identidade do Vodafone Paredes de Coura como festival para as imensas minorias que têm a música popular urbana como companhia de vida inescapável, como desbloqueador de conversa privilegiado, como fascínio alimentado diariamente.

Num extremo temos os Franz Ferdinand, os escoceses que deram ginga pós-punk, fogo rock’n’roll e cultura pop apurada à primeira década do século XX. Regressam sem o fulgor de outrora, quase com aura de veteranos antes do tempo, mas com um álbum, Right Thoughts, Right Words, Right Action (2013), celebrado como um reencontro com os bons velhos tempos de Franz Ferdinand e You Could Have So Much Better – além disso, terão os clássicos todos, de Take me out a Do you want to, para fazer do concerto de quinta-feira, dia em que serão cabeças-de-cartaz (tocam às 00h45) um momento de celebração particularmente festiva. No outro extremo, encontramos aqueles que podem transformar-se na surpresa do festival, grupos que subirão a palco como segredo bem guardado e que poderão sair dele como a nova banda preferida de muito boa gente: pensamos, por exemplo, nos Goat (sábado, dia 23, 22h20), suecos revelados por World Music (2012) e que tocam psicadelismo tribal cortado com hard-rock viking. Sobem a palco com máscaras na cabeça e a vontade de nos tornar a todos membros da sua tribo.

Entre os regressados Franz Ferdinand e a surpresa Goat, há todo um mundo. O da Sereia Louca de Capicua, autora de um magnífico concerto no último Super Bock Super Rock (quarta-feira, dia 20, 21h), e o de Janelle Monáe, soul-woman futurista, mulher sob a influência de Prince ou de James Brown (no mesmo dia, 23h30). O novo mundo de Thurston Moore [ver texto nestas páginas] e o mundo do rock’n’roll absolutamente imperdível dos Thee Oh Sees de São Francisco (quinta-feira, dia 21, 22h20) e dos Black Lips de Atlanta (sexta-feira, dia 22, 23h15). O da Americana, linguagem antiga, vista por olhos do presente através de Conor Oberst, renascido no recente Upside Down Mountain (sexta-feira, dia 22, 21h20), ou de Kurt Vile & The Violators (sábado, dia 23, 19h40). Entre quarta e domingo da próxima semana, as paisagens amplas de Beirut (o trompete ouvir-se-á às 23h15 de sábado, dia 23), o rock em tensão dos sempre celebrados Linda Martini (sexta-feira, dia 22, 19h40), a pop electrónica com nervo dos australiano Cut Copy, cabeças de cartaz na sexta-feira, dia 22 (0h45) e a pop electrónica mesmo pop dos escoceses CHVRCHES (quinta-feira, dia 21, 23h15).

E depois, sábado, James Blake, figura de culto cada vez mais massivo que poderá significar em palpitação cardíaca e emoção contida o mesmo que os Arcade Fire foram em 2005 enquanto épico encontro geracional. O londrino autor de Overgrown, verdadeiro cantautor do século XXI (voz sofrida erguendo-se entre paisagens digitais), é um dos nomes mais aguardados do festival. E será generoso na passagem por Paredes de Coura. Depois do concerto, à 1h do último dia, sábado, cabe-lhe o encerramento do festival enquanto DJ, integrando o colectivo 1-800 Dinosaur, cuja música começaremos a ouvir às 2h45.

Sugerir correcção
Comentar