Futebol feminino: uma realidade que vai ganhando destaque em Portugal

A qualificação do Atlético Ouriense para a Liga dos Campeões é um sinal do lento desenvolvimento da modalidade em Portugal.

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A final da última edição da Liga dos Campeões feminina decorreu no Estádio do Restelo, em Lisboa JAVIER SORIANO/AFP

A visibilidade é maior, ainda que pequena. A modalidade tem crescido, mas esse desenvolvimento não chega para pagar todas as despesas. A crise tem afectado os clubes porque os orçamentos são elevados e, prova disso, foi a recente suspensão da equipa sénior feminina do clube 1º de Dezembro. Mas há também sinais positivos, como o recente apuramento do Atlético Ouriense para a Liga dos Campeões, feito inédito no futebol feminino português.

A realidade da modalidade em Portugal reflecte esta dicotomia. Dificuldades no dia a dia e um ou outro fenómeno animador. Um deles tem a ver, por exemplo, com o número de praticantes, que tem aumentado. Os números são avançados por Mónica Jorge, directora do futebol feminino da Federação Portuguesa de Futebol (FPF): “Tem-se notado algum crescimento e, prova disso, foi que, de 2012 para 2013, aumentámos 11 equipas na II Divisão, mesmo com algumas dificuldades financeiras.”

Mas os problemas económicos que se evidenciam no país fazem com que os clubes tenham a vida dificultada. Um dos clubes que mais sofreu com estes factores, foi o Sociedade União do 1º de Dezembro, emblema campeão durante 11 anos consecutivos, na I Divisão, e que ganhou 140 jogos ininterruptos — entre Maio de 2006 e Novembro de 2012.Estas conquistas não foram suficientes para que se mantivesse. Para José Valentim, responsável pelo futebol feminino do clube de Sintra, “a crise é grande e não existem firmas que invistam. Não arranjamos patrocínios porque ninguém quer investir”.

“Sabia perfeitamente a realidade do clube e que, quando a equipa deixasse de ter títulos, as coisas iriam terminar”, disse Carla Cristina ao PÚBLICO. A atleta recuou até à data em que jogava no 1º de Dezembro e em que viveu de perto as dificuldades do clube. A futebolista foi capitã da equipa e sabia que o clube se mantinha porque o grupo ganhava tudo “a nível nacional”.

Apesar das complicações financeiras dos clubes, a FPF tem ajudado no que pode para que os mesmos não terminem com as equipas femininas. Um exemplo do apoio que é dado passa pela redução dos custos nas deslocações, nas inscrições das jogadoras nos clubes e também na oferta de algum material, como bolas de futebol em condições, para que as jogadoras se possam treinar devidamente. “Nos últimos anos, a FPF tem dado um forte apoio a nível das deslocações. Todas as equipas [que têm jogos a mais de 100 quilómetros do seu local de treino] são pagas pela federação e as de II Divisão também têm uma grande ajuda nas deslocações e os clubes têm agradecido imenso. Também entregamos bolas aos clubes, no início de cada época, revela a antiga treinadora da selecção nacional, Mónica Jorge.

No entanto, há quem não partilhe este optimismo. Para o ex-treinador da selecção feminina e antigo jogador do Benfica, José Augusto, as coisas não mudaram nada desde que deixou de ser seleccionador: “Queria ver isto alterado para melhor, em que haja mais apoio aos clubes e uma maior visibilidade”. Também Carla Cristina afirma que o pouco destaque da modalidade deve-se ao facto da mesma ainda não apresentar muitos resultados: “Como o futebol feminino não consegue apresentar resultados, porque não há trabalho nem alicerces, não se aposta na modalidade.”

Com o apuramento para a fase de eliminatórias da Liga dos Campeões, o Atlético Ouriense deu o seu contributo para que o futebol feminino ganhasse mais visibilidade. Mas será preciso mais do que um episódio efémero para o conseguir. Em países como a Suécia, a Islândia e a Alemanha, o futebol feminino tem uma importância extrema e algumas das jogadoras são tidas como “fora de série”. Mónica Jorge acredita que a valorização das jogadoras aparecerá quando a selecção nacional feminina apresentar resultados: “A nossa selecção está num bom caminho, mas ainda não está entre as 10 primeiras do ranking europeu e isso faz com que tenha menor visibilidade. Quando fizermos um feito maior, talvez essa valorização apareça.” Texto editado por Jorge Miguel Matias

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