O tornado de tubarões – ou Sharknado – que pode comer as redes sociais nas próximas 24 horas

O filme série B que fez das redes sociais e do seu título o segredo do seu sucesso tem uma sequela: Sharknado 2 passa esta madrugada em Portugal e é mais um momento da paisagem televisiva a mudar.

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Ian Ziering e Tara Reid em "Sharknado" DR
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"Sharknado" DR
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"Sharknado" DR

Numa noite de Julho que parecia ser como outra qualquer, a actriz Mia Farrow, a Cruz Vermelha de Oklahoma, o criador de Perdidos Damon Lindelof e a Agência de Protecção do Ambiente do Governo dos EUA escreviam no Twitter sobre o mesmo tema. Um tornado de proporções épicas aproximava-se de Los Angeles e estava recheado de tubarões assassinos. Sharknado era o seu nome e tornou-se em 2013 num dos mais comentados filmes de sempre nas redes sociais. Sharknado 2 é o que acontece quando um filme de série B volta para mais uma rodada de festa online, já esta madrugada no canal SyFy.

Sim, um tornado de tubarões, que pululam na expectativa de abocanhar transeuntes e que dá origem a um festim de sangue falso, fugas e motosserras. “Tão mau que é bom” é uma expressão aplicável a filmes como Sharknado, cujo baptismo é parte do seu próprio sucesso – embora o título tenha sido escondido aos actores até aceitarem fazer o filme. O canal SyFy tanto alberga o sucesso crítico Guerra dos Tronos quanto os telefilmes SharknadoPiranhaconda, evidenciando que fantasia e terror, sobrenatural e implausível, série B e série Z são vizinhos naturais. E também mostra um pouco que hoje, com a erosão das audiências da televisão em directo, a chamada “televisão doida” e cheia de choque, como descreveu a revista do New York Times na semana passada, é um trunfo valioso. A série B ao serviço da mudança no audiovisual.

Os ingredientes são clássicos do género – catástrofes naturais que apelam às massas, como é o caso dos tornados, e o animal estrela do terror e do Verão desde que Steven Spielberg transformou um thriller no primeiro blockbuster estival em 1977. A eles juntam-se actores e actrizes mais ou menos (des)conhecidos, tipicamente estrelas de um passado não muito distante e/ou actrizes voluptuosas, um argumento sem medo do absurdo, efeitos especiais pouco sofisticados e momentos de fazer cair o queixo. Neste caso, os protagonistas são Ian Ziering, que há 20 anos foi grande com Febre em Beverly Hills, e Tara Reid, de American Pie e O Grande Lebowski, dos irmãos Coen. O fenómeno em que se tornou Sharknado fez com que nesta segunda dentada haja uma mão-cheia de aparições de vários quadrantes, de Kelly Osborne (filha do senhor Black Sabbath, Ozzy Osborne), ao jornalista Matt Lauer, da ABC, passando por actores como Judd Hirsch ou Judah Friedlander (30 Rock).

Voltando à noite de Julho em que Mia Farrow, no Twitter, e o líder republicano do Senado Mitch McConnell, no Facebook, comentavam Sharknado, o filme (editado em DVD em Portugal pela Films4You) foi visto por 1,5 milhões de pessoas. É um número que ronda a média dos filmes SyFy como Megashark vs. CrocosaurusTornado Metálico ou Ataque do Tubarão de Duas Cabeças – título que, aliás, faz parte da emissão do SyFy nesta noite de quarta-feira que antecede a estreia simultânea com os EUA de Sharknado 2, às 2h10, e que inclui o primeiro Sharknado e Tubarão Fantasma. (Na noite de quinta-feira há outro round de Sharknado 2, às 21h30.) Mas Sharknado tornou-se televisão-acontecimento quando o filme foi sendo comentado em directo no Twitter até que atingiu a marca das cinco mil pessoas a escrever sobre ele por minuto, mas também quando as repetições do filme ou estreias nos canais SyFy fora dos EUA (como foi o caso de Portugal) se tornaram pretextos para fazer festas de visionamento e para, claro, trocar impressões furiosamente através de telefones e computadores sobre a delícia do absurdo.

Sharknado 2 parece pronto para engolir novamente a Internet e está já posicionado, na era da pirataria, do DVR e das emissões televisivas que rebobinam, para ser esse evento televisivo que convida o espectador a ver em directo e em simultâneo com o resto dos seus pares (e com a respectiva publicidade a embrulhar e a rentabilizar o programa). É por isso que o canal de TV por subscrição promove esta transmissão madrugada dentro – algo ainda episódico no mercado português, reservado para event programing como os Óscares ou desporto, apesar de já ter acontecido com finais de séries como Perdidos.

E é por isso que o crítico de televisão da Time James Poniewozik escreve: “Já vi Sharknado 2: The Second One, mas não posso fazer a crítica devidamente. Porque vi o filme num disco, com antecedência. No meu escritório. Sozinho. Como um looser. Por outras palavras, vi Sharknado 2, o filme, mas não tive a experiência Sharknado 2. Essa experiência, quando o filme for para o ar, vai envolver vê-lo numa sala cheia ou, ainda melhor, com amigos ilimitados nas redes sociais”. Depois de Los Angeles e, agora, de Nova Iorque, um terceiro Sharknado deve abater-se sobre uma qualquer cidade no próximo ano.

Os filmes SyFy, que o canal começou a produzir em 2002, custam normalmente 1,5 milhões de dólares. Embora a estação não revele os custos de Sharknado 2, sabe-se que custou mais do que isso, nunca chegando ainda assim aos calcanhares de um filme de acção mediano - segundo a Bloomberg, em Sharknado 2 os figurantes fazem a sua própria caracterização e maquilhagem, por exemplo, e não há luxos para os actores principais. Um dos nomes por trás desta máquina de produção de filmes de mau gosto e parca qualidade, mas enorme potencial de riso e risco criativo, é o do histórico Roger Corman, um dos principais produtores do SyFy e que é responsável por pérolas dos anos 1980 como A Lojinha dos Horrores ou o iminente Sharktopus vs. Pteracuda (qualquer coisa como um tubarão-polvo e um pterodáctilo-barracuda).

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