“A Inapa não recebeu qualquer pedido de informação da CMVM sobre uma OPA obrigatória”

O presidente da Inapa descarta o cenário de nacionalização da empresa, pelo facto de o Estado ter subido a participação para 43%, via Parpública e CGD.

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Presidente da Inapa diz que não conhece posição do regulador sobre uma potencial nacionalização Enric Vives-Rubio

Portugal representa apenas 5% nas vendas da Inapa, distribuidora de papel e embalagens onde o Estado tem 10% de participação, através da Parpública, e o banco público CGD tem 33%. Mais de 50% do negócio passa pela Alemanha, mas é nos mercados fora da Europa que a Inapa está a apostar.

Sobre as dúvidas quanto a uma OPA obrigatória, que surgiram depois de a participação estatal ter aumentado com a conversão de acções emitidas num aumento de capital em direitos de voto fruto da ausência de dividendos, José Félix Morgado, presidente da empresa, garante que até à data não recebeu qualquer pedido de informação do regulador do mercado de capitais. A estrutura accionista muda todos os dias, recorda. Na semana passada, o Estado (através da Parcaixa) propôs uma alteração de estatutos, que será votada a 6 de Agosto, para eliminar quaisquer rumores sobre uma potencial nacionalização da Inapa.

A nova operação na Turquia impulsionou uma subida de 5,7% nas vendas no primeiro trimestre. A expansão para outros mercados está nos planos para este ano?
A estratégia da Inapa em termos de expansão assenta em todo este processo de internacionalização para fora da Europa que temos vindo a seguir. Do total, apenas 5% das vendas são feitas em Portugal e uma grande parcela é feita na Europa. Com os mercados europeus mais maduros e com crescimentos pouco interessantes, a internacionalização para fora da Europa tem em vista aproveitar o crescimento de alguns mercados emergentes, mas com alguma estabilidade do ponto de vista jurídico e político, e com potencial d crescimento. Em Angola começámos no ano 2000 com uma sociedade 100% detida por nós, e a Turquia, além do potencial, é muito interessante para os mercados que estão à volta.

Têm conseguido diversificar além da Turquia?
Não, neste momento a prioridade é consolidar e melhorar a operação turca. Está a acontecer e o grande objectivo deste ano é crescer na Turquia para depois olhar para os mercados à volta. A estratégia de internacionalização da Inapa assenta em duas estratégias: mercados geograficamente próximos ou próximos de Portugal, como Angola.

A Alemanha pesa 53% nas vendas. Quer reduzir a dependência deste mercado?
Está a crescer e, do ponto de vista económico, é muito pujante. É o maior mercado europeu mesmo em termos de papel. A nossa posição cresceu.

Quanto?
Na Alemanha estamos a crescer 3% a 4% este ano. Vamos consolidando a nossa posição, mas obviamente que o objectivo é que a Alemanha pese 50 ou 49%, à medida que vamos entrando noutros mercados não europeus. Mas será um processo progressivo e em termos de volume, de toneladas vendidas, não irá reduzir, pelo contrário.

Portugal vale 5%. O que é que este valor significa em termos de mercado nacional?
Significa que temos uma quota de mercado de praticamente 50% no papel. Sabemos que Portugal é um mercado pequeno e estreito e não podemos crescer mais. Temos uma abordagem ibérica ao mercado português e espanhol, ou seja, a equipa de gestão é ibérica. Espanha tem uma dimensão muito superior, onde somos o número três, num mercado em que 90% está nas mãos dos três principais operadores.

O negócio da embalagem em Portugal tem alguma expressão?
Em embalagem devemos fazer cerca 80 milhões de euros no total do grupo, metade na Alemanha. Portugal deverá ter à volta de 10% do valor global. As empresas neste sector são pequenas e médias. E, neste momento, atrever-me-ia a dizer que somos líderes em termos de distribuição de embalagem (estamos a falar de todos os tipos, desde caixas de cartão, esferovite, plásticos com bolhas, entre outros). Temos dois segmentos: a venda de produtos de embalagem standard e a transformação para clientes específicos.

O ano de 2013 marcou uma viragem nos resultados, com o regresso aos lucros depois de anos de prejuízo.
Foi a segunda viragem.

Qual foi a primeira?
Em 2008, 2009 e 2010 tivemos resultados positivos e sempre a duplicar. 2011 e 2012 foram anos de crise e uma estrutura com custos fixos não consegue reagir. Em 2013 voltamos à tendência anterior.

A crise não acabou. O que é que contribuiu para o regresso aos lucros?
A entrada em novos mercados, como a Turquia, e a diversificação dos negócios que não são papel, onde a margem crescimento é muito mais interessante. A nível de estruturas de custo, os ajustamentos que fomos fazendo em 2011 e 2012 – e alguns demoram tempo – também contribuíram para o regresso à tendência anterior.

Vai conseguir este ano superar a fasquia dos mil milhões de euros de vendas, valor que não é alcançado há três anos?
Continua a ser esse o objectivo. Não é atingido há três anos devido às quedas no mercado de papel que chegaram em Espanha aos 20%, em França foram de 6% a 8%. São significativas. Para chegar a esse nível de facturação é importante entrarmos noutros mercados.

Como é que tem gerido o peso da dívida, na ordem dos 340 milhões de euros?
Do ponto de vista de financiamento corrente, temos conseguido renovar todas as linhas e temos reduzido a dívida apesar do esforço do investimento. O objectivo é continuar a fazer essa redução, quer através dos meios gerados, quer através de soluções que possam contribuir para uma diminuição mais rápida.

Qual é o objectivo de redução de dívida para este ano?
Não lhe posso dar metas até pela legislação do mercado, mas temos objectivos.

Quais são os negócios estratégicos para a Inapa nos próximos anos? Será uma empresa cada vez menos de papel?
Vai ser uma empresa com maior peso do negócio fora da Europa, no que diz respeito ao papel, com menor peso do papel e a crescer claramente nos negócios complementares. Estas duas estratégias permitirão uma melhoria da rentabilidade.

Há pouco falou da reestruturação da empresa. Implicou o despedimento de 30 trabalhadores em Portugal. Haverá mais despedimentos?
Como gestor não tenho metas de redução de pessoas. Tenho outra metas, como o ajustamento da capacidade logística, concentração de tudo o que são funções de backoffice. Obviamente, quando se faz a reestruturação, há pessoas que saem. Mas em Portugal temos aumentado o número de trabalhadores porque temos um centro de serviços partilhados do grupo em Sintra e várias funções têm sido transferidas para Portugal. A reestruturação tem passado muito pelo ajustamento da capacidade de logística e pela procura de mercado. Temos, de facto, fechado alguns armazéns e redimensionado a estrutura de transporte e é aí que assenta uma parte importante da reestruturação. Além disso, temos reorganizado toda a força comercial para modelos mais eficientes.

Houve uma mudança no perfil dos trabalhadores?
Em Portugal sim. No grupo houve uma reestruturação na forma como fazemos o negócio. Houve clientes com maior utilização de canais directos e maior integração dos negócios.

Sobre a estrutura accionista, que é sempre um assunto presente…
Muda todos os dias (risos).

Apesar de estar a vender activos devido ao resgate da troika, o Estado detém agora mais de 43% da Inapa através da Caixa Geral de Depósitos e da Parpública. Não é um contra-senso?
O Estado tem 10% através da Parpública. Temos accionistas de referência que se mantêm e têm dado todo o apoio à estratégia e à gestão. Obviamente, a opção do Estado é vender, e isso foi anunciado há muitos anos. Quando vai ser feito, não posso responder. O que posso dizer é que a gestão todos os dias trabalha para que o valor das participações de todos accionistas seja o melhor.

A hipótese de uma OPA levou as acções da empresa subirem mais de 10%. Nacionalizar era bom?
Em primeiro lugar, houve uma notícia sobre alguma análise que estaria a ser feita pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários. Daí tiraram-se um conjunto de ilações que não me parecem correctas, designadamente quando se fala em nacionalização. Nacionalizar o quê? Já se passaram alguns meses e, por vezes, essas notícias nem sempre têm o fundamento que deveriam ter.

A CMVM não está a analisar essa questão?
Não posso dizer se está a analisar ou não porque não trabalho na CMVM. O que posso dizer é que a Inapa não recebeu qualquer pedido de informação da CMVM sobre essa matéria. Não conheço a posição do regulador.

A venda da participação do Estado teria um impacto positivo na empresa?
Penso que a Parpública tem uma posição muito correcta, como os demais accionistas. E precisamos de ter accionistas. Se é a Parpública que tem 10% ou não, é indiferente. Mas é uma decisão do accionista, tal como de outros.

Há manifestações de interesse de accionistas em aumentar a participação.
Há sempre. As acções são transaccionadas todos os dias.

E como é que é gerir uma empresa que, como disse, muda de accionista todos os dias?
Uma empresa cotada como a Inapa tem obrigações. Temos duas preocupações: prestar, de forma clara, toda a informação, e tratar de forma igual todos os accionistas. Posso dizer que este conselho, enquanto eu estiver na Inapa, trata todos os accionistas da mesma forma.

Mas não sente instabilidade, mesmo a nível interno e de gestão das expectativas dos trabalhadores?
Não. Esse tema coloca-se a todas as cotadas, daí a importância de saber qual é a missão e a estratégia da empresa e que compromisso temos para com os nossos accionistas em termos de execução do plano estratégico. As decisões dos accionistas, a eles caberão.

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