Jorge Sampaio e a democracia

Há dias o ex-Presidente solicitou mudanças estruturais nos partidos e respeito pela Constituição, para manter a democracia representativa. Lídia Jorge, no auditório, indagou como fazê-lo e ficou sem resposta.

Fátima Campos Ferreira perguntou-me o mesmo no Prós e Contras, em 2010. Os que têm o poder fazem tudo para travar mudanças estruturais. A grande vitória do partido ABN, Abstenção-Branco-Nulo, é a prova de que o eleitor já não acredita na assim chamada "democracia", que representa o lobby que sustenta a atual estrutura, e não o cidadão.

“Mudanças estruturais só ocorrem por E-volução ou RE-volução”, respondi então à Fátima. Em 25 anos três países mudaram a sua estrutura por E-volução: Argentina, Suécia e Islândia.

A Argentina disse ao FMI que pagaria a dívida à medida que pudesse; alterou as regras de jogo, enfrentou os lobbies nacionais e estrangeiros, trocou o foco das finanças para a economia real e o emprego e, após três anos de ajustes, cresceu à média de 7% ao ano. Hoje recebe investimentos tecnológicos, pois é um “país do futuro”.

A Suécia tinha um sistema eleitoral parecido com o nosso. Há 25 anos mudou-o: as listas de cada partido são fixadas pela concelhia local, com diferentes cabeças de lista. Assim o eleitor não vota num partido, mas num grupo de cidadãos em quem ele confia; o deputado não é obrigado a seguir o que os chefes mandam, mas o que os seus eleitores esperam. Os partidos têm verbas públicas, não recebem doações e todas as listas têm direito a tempo de antena. A dívida pública foi paga ao longo desses 25 anos sem travar o poder de compra da população e a economia, na UE em crise 2009/12, lá cresceu uns 4% ao ano.

A Islândia, que como nós se endividou, processou e prendeu o seu ex-Presidente, como responsável pela crise que a assola. Exigiu abater parte da dívida. Mudou a Constituição, que durante um ano foi escrita pelos cidadãos, que, pela Internet, podiam propor itens, votados pelos eleitores.

Alguma destas alternativas é viável em Portugal? Quem as permitiria? Quem as faria funcionar na prática? Jorge Sampaio, um bom presidente, não as conseguiu realizar, pois a estrutura já está rota há décadas, também aqui.

Repito o que disse no Prós e Contras: precisamos de umA estadista, não de desacreditados políticos. Ou já não há tempo para a E-volução?

Consultor internacional, autor de Como Sair da Crise, Portugal Rural, e Ontem e Hoje na Economia

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