Um "smartwatch"? Fixe! Mas para que quero isso?

Talvez se perca mais tempo a tentar descobrir e comparar funcionalidades de um dispositivo do que propriamente a tirar rendimento de tal uso

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William Hong/Reuters

O computador de secretária, o portátil, o telemóvel, o "smartphone", o "tablet", o "smartwatch"... Esta tendência da tecnologia dedicada ao consumidor está a levar-nos à saturação de dispositivos pessoais. Hoje em dia, tudo não é suficiente. Para o consumidor até talvez possa ser, mas a febre do consumo não deixa. 

É a busca pela última tecnologia, é a necessidade por parte das empresas de vender e bater o recorde dos lucros. É a obrigatoriedade de olhar para as ações e para os mercados e não as deixar cair. É o fracasso de inventar o que já não é inventável. 2014 é o ano dos "wearables", mas também é o ano em que se começa a sentir que nem tudo pega. É o tudo por tudo na aposta em dispositivos que possamos "vestir", mas que não servem para nada. E as pessoas começam a notar isso.

A meia dúzia de "geeks" que se atiram a estes novos relógios e óculos depressa percebem que o partido tirado do uso de tais dispositivos é nulo. Talvez se perca mais tempo a tentar descobrir e comparar funcionalidades do que propriamente a tirar rendimento de tal uso. E a maior "feature" na defesa dos mesmos? Ver notificações sem retirar o telemóvel do bolso.

O carregamento de baterias de tudo o que nos rodeia é outro ponto. Para se poder usar tanto dispositivo à nossa volta, a procura de pontos de carregamento é absurda. O "smartphone" ficou sem bateria... O "tablet" ? Não posso usar mais para poupar… E como é com os relógios inteligentes? Carregar todos os dias... A pergunta é: qual é o limite de dispositivos que estamos aptos a poder usar aos olhos destas empresas e acionistas? Quando é que estas empresas - que tentam descobrir aquilo que "necessitamos, mas que não sabemos" - acham que já chega?

Febre do consumo

No entanto, não existe só a questão de já não tirarmos rendimento de tanto "gadget". É também o que a própria sociedade e planeta estão a sofrer com esta síndrome. Por um lado, temos a quebra de emprego nos países desenvolvidos, devido à conversão de empregos da indústria em empregos de serviços e, por outro, temos países, como a China, que integram praticamente a totalidade da indústria transformadora e vivem atualmente na necessidade de manter uma taxa louca de crescimento da economia. Todo o mundo está escravo desta globalização da economia e tecnologia sem regras e sem rédeas.

O que "ganhamos"? A degradação do planeta. Esta febre do consumo e da necessidade de produzir mais está a levar a natureza ao abismo. A busca impossível pelos recursos, a poluição, a destruição, o despejo. Não há lugar para tanto fabrico e desperdício. É preciso repensar todo o ciclo. Devemos continuar com tal velocidade no desenvolvimento da tecnologia de consumo? Devemos continuar a consumir as últimas tendências, quando na prática não nos acrescenta nada de útil ao nosso dia-a-dia? É necessário mudar o rumo. E mudar o rumo é criar produtos que estejam preparados para uma rotina de manutenção durante anos, e não torná-los obsoletos ao fim de seis meses.

Os produtos devem ser caros, possíveis de reparar e desenhados de série para durarem. Também é possível criar empregos baseados na reparação e manutenção. Na verdade fazia mais sentido do que andarmos a enganarmo-nos uns aos outros em querer vender o que já todos temos e não necessitamos. Este caminho de alcance do melhor e mais barato já não faz sentido no nível de tecnologia atual e no futuro irá custar-nos caro. 

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