Natalia quer pôr as crianças de Kibera a contar a sua história
“My First Camera” é o nome do projecto que a jovem luso-moldava pretende desenvolver com as crianças de Kibera, bairro de lata gigantesco às portas de Nairobi, no Quénia. Campanha de crowdfunding de Natalia Jidovanu termina a 24 de Julho
É considerado o maior bairro de lata do continente africano, casa de um número impossível de determinar de pessoas: há estimativas que apontam para as 350 mil, outras que atingem o milhão. Kibera é “um lugar indescritível”, 225 hectares de “’casas’ feitas de barro, madeira e chapa, chão de terra batida e telhados enferrujados”. Quem o diz ao P3 é Natalia Jidovanu, uma luso-moldava de 28 anos que se mudou para o Quénia no início de 2014 e que criou o projecto “My First Camera”, direccionado para crianças de Kibera, nos arredores da capital Nairobi.
A psicóloga quer que sejam as crianças deste subúrbio a contarem a sua história, os problemas que vivem, as injustiças que sentem, através da fotografia. Para que o projecto se possa concretizar, Natalia lançou uma campanha de crowdfunding na plataforma IndieGogo, na qual pede 7 500 dólares (cerca de 5 500 euros) até 24 de Julho. A partir do Quénia, a jovem — que nasceu na Moldávia e veio para Portugal, aos 16 anos, com os pais — desenvolveu um conceito para poder ajudar as crianças de Kibera, com as quais teve um primeiro contacto durante um outro projecto pessoal de fotografia documental.
Em entrevista por e-mail, Natalia descreve a vontade de proporcionar a, pelo menos, dez crianças “uma oportunidade valiosa de educação e expressão artística que, de outra forma, nunca lhes será acessível”. “Através da participação no projecto, as crianças irão adquirir competências de comunicação e auto-expressão, melhorando a auto-confiança, alargando os seus horizontes e afirmando o seu lugar numa sociedade que se esqueceu da sua existência”, continua a jovem com dupla nacionalidade.
Em Kibera — onde “as casas, coladas umas às outras, com um tamanho médio de nove metros quadrados, têm apenas uma divisão sem janelas e chegam a ser abrigo para oito ou mais pessoas” —, as crianças “brincam nos rios de lama e de lixo, (…) cheiram cola” e, muitas vezes, nunca saíram do bairro. As máquinas fotográficas que Natalia pretende introduzir na comunidade serão, para muitas, as primeiras que vão ter (e ver).
Do plano de Natalia para “My First Camera” constam sessões de trabalho semanais nas quais “as crianças serão guiadas para entender a fotografia como uma ferramenta poderosa para denunciar injustiças, transmitir mensagens, mobilizar pessoas e incentivar mudanças sociais”. As fotografias produzidas semanalmente serão discutidas em grupo, ao mesmo tempo que são apresentadas noções de “storytelling” e casos de “artistas locais que nasceram ou viveram em condições semelhantes”.
O objectivo final é reunir o trabalho de todos os participantes num livro de fotografia, cujas vendas revertam “em benefício dos interesses das crianças”, nomeadamente no campo da educação. “Não menos importante”, sublinha, é o facto de o projecto pretender “alertar a comunidade internacional para a situação destas crianças, impulsionando uma mudança positiva nas suas vidas”.