Não houve "Mestre de Avis" para tamanho inimigo
Na Praça Dom João I, no Porto, centenas viram uma dura batalha que acabou numa pesada derrota.
Na Praça Dom João I, no Porto, como é já tradição, centenas de apoiantes da selecção portuguesa reuniram-se em frente a um ecrã gigante para assistirem à estreia de Portugal no Mundial do Brasil.
“Já há dois e quatro anos foi igual, estive por aqui e ainda deu para ver uns joguitos”. Aníbal é um dos portugueses na praça mas, ao contrário dos demais, está mais habituado a ouvir no rádio os relatos e não veste uma camisola encarnada ou tem a cara pintada. Há dez anos taxista no Porto, esta é a sua postura preferida.
António também se vê forçado a trocar o cachecol pelo volante. “Se aparecer um cliente, primeiro está o trabalho, depois está o futebol. Vai ser um jogo muito difícil, se Portugal conseguisse um empate era muito bom”, argumenta.
A poucos minutos do pontapé inicial, sente-se um optimismo contido. Ainda assim, na Praça Dom João I aguarda-se com ansiedade que os jogadores portugueses repitam as façanhas do Mestre de Avis, que dá nome à praça e derrotou adversários de Portugal na Batalha de Aljubarrota. Está em jogo uma partida de futebol e o orgulho desportivo nacional, desta vez não ameaçado pelos espanhóis, mas sim pelos alemães e com um rosto em evidência: o de Angela Merkel. Os maiores coros de assobios da tarde ouviram-se quando a chanceler surgia na imagem.
De repente, um presságio, um sinal de que a tarde poderia não reservar coisas boas: um problema na instalação sonora impediu a multidão de adeptos de ouvir o hino nacional. Pouco depois, ao fim de dez minutos de jogo, de sol e de calor, o primeiro aperto no coração: penálti a favor da Alemanha. Thomas Muller inaugura o marcador e, a milhares de quilómetros, os adeptos portuenses abrem as hostilidades contra a equipa de arbitragem.
No meio de uma praça a torrar de calor e algum sofrimento, ainda se ouve “Portugal!” e adeptos a vibrar quando Cristiano Ronaldo tenta dar um ar da sua graça. Porém, estava escrito que a batalha iria ser dura, e que Portugal sofreria as maiores baixas. Num pontapé de canto, Matts Hummels saltou mais alto que Pepe e marcou o segundo para os alemães. O descrédito apodera-se da praça. “Queres ver que vamos levar uma banhada”, comentam uns adeptos, mais jovens, cuja faixa etária está em larga maioria. Vêem-se alguns adeptos da Alemanha, poucos, e uma ou outra cara conhecida, como a do presidente da Câmara do Porto, no meio da multidão, de camisa branca.
A expulsão de Pepe derruba os primeiros resistentes e o terceiro golo da selecção germânica, já perto do intervalo, serve de pretexto para não se voltar para o segundo tempo. “Não estou a gostar, tudo está a correr mal”, comenta João Araújo. O taxista, de regresso à viatura, também perdeu a esperança. “Fui ver a primeira parte, não houve cá clientes, mas a segunda, já que estou em primeiro na fila, não vou ver”.
E não perde muito. Com a Praça Dom João I já a meio gás, os fãs assistem resignados ao terceiro golo de Muller na partida, para o 4-0 da Alemanha. Uma minoria lança ainda enxofre vermelho e verde para o ar, acompanhado por uns tímidos cânticos. No final, nem aplausos, nem apupos. Apenas adeptos mais resistentes que começam a dispersar com uma festa adiada no bolso.