Merkel rejeita ameaças de Cameron e confirma que apoia Juncker para suceder a Durão Barroso

Cameron voltou a lançar a ameaça da saída do Reino Unido da UE que, disse, precisa de um presidente disposto a reformar as políticas comunitárias.

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Os quatro líderes (o sueco nos remos) juntaram-se para uma cimeir que se dizia ser "anti-Juncker" JONATHAN NACKSTRAND/AFP

O braço-de-ferro europeu sobre a sucessão de Durão Barroso na presidência da Comissão Europeia continua sem um desfecho à vista, embora a balança tenha voltado a pender para a escolha do ex-primeiro-ministro luxemburguês Jean-Claude Juncker.

Angela Merkel, chanceler alemã, deixou claro esta terça-feira que apoia Juncker, rejeitando pelo caminho as ameaças de David Cameron, primeiro-ministro britânico, sobre uma possível saída do Reino Unido da União Europeia (UE) em caso de escolha do luxemburguês.

Merkel, Cameron e Mark Rutte, primeiro-ministro da Holanda, encontraram-se durante dois dias na residência de Verão do chefe do Governo da Suécia, Fredrik Reinfeldt, nos arredores de Estocolmo, no que foi inicialmente visto como uma minicimeira do campo anti-Juncker.

Cameron tem subido o tom na oposição ao luxemburguês, europeísta convicto, defendendo que o que a UE precisa é de um presidente da Comissão disposto a “reformar” as políticas comunitárias. Acima de tudo, o chefe do Governo britânico quer obter uma devolução aos Estados de competências que foram sendo progressivamente transferidas para o nível europeu antes de submeter uma nova relação mais frouxa com a UE a referendo, em 2017, sobre a permanência, ou não, do país entre os 28.

O líder britânico voltou, aliás, a deixar implícito na terça-feira que a escolha de Juncker poderá acelerar a saída do país da UE, uma perspectiva que sabe que a Alemanha quer evitar a todo o custo. Se a UE não assumir um caminho de reformas, incluindo uma “menor interferência” nos assuntos dos Estados, será "muito prejudicial” para o referendo, afirmou.

Restrições à circulação na UE
Apesar disso, Cameron baixou o tom da sua oposição a Juncker, mas colocou na mesa o que é visto como a sua moeda de troca num possível compromisso: a alteração do princípio da livre circulação de cidadãos no espaço comunitário, uma das liberdades essenciais garantidas pelo Tratado da UE, que está a ser fortemente contestada pelos eurocépticos que acusam os cidadãos dos países pobres de se dedicarem a um “turismo de subsídios” nos mais ricos.

“Decidimos que temos de trabalhar juntos para combater os excessos da liberdade de movimentos”, afirmou Cameron. “É certo que devemos ser livres de viajar em toda a Europa para trabalhar, mas não devemos ser livres de aproveitar de forma indevida os sistemas de protecção social”, defendeu.

O seu homólogo holandês afirmou igualmente que, “para preservar a liberdade de movimentos, é preciso equidade no mercado de trabalho, o que significa combater os abusos que a põem em risco”. Merkel disse que a Alemanha partilha esta posição.

A chanceler, que nas últimas semanas deu sinais de hesitar sobre a escolha de Juncker — o candidato dos partidos de centro-direita (PPE), vencedores das eleições europeias de 25 de Maio —, tem vindo a colocar-se cada vez mais do lado do luxemburguês.

“Para mim, Jean-Claude Juncker é o candidato para o posto de presidente da Comissão e quero tê-lo como presidente da Comissão”, precisou. No entanto, avisou, “precisamos de agir num espírito europeu”, do qual “as ameaças não fazem parte”.

Parte da viragem de Merkel resulta da pressão que está a ser exercida pelo Parlamento Europeu (PE), que tem o poder de votar ou rejeitar o candidato à presidência da Comissão cuja escolha, segundo o Tratado da UE, pertence aos governos. Este poder de veto levou as grandes famílias políticas a decidir apresentar às eleições europeias de Maio um candidato à sucessão de Barroso, prometendo que o indicado pelo maior grupo parlamentar seria o próximo presidente da Comissão.

Embora resista a esta tentativa de tomada do poder pelo PE, Merkel está sob uma forte pressão interna para aceitar a lógica dos “candidatos-chefes de fila” e confirmar a escolha de Juncker.

Apesar disso, não é segredo que a chanceler está à procura de um candidato alternativo capaz de reunir o apoio tanto dos eleitos do PPE como dos socialistas (o segundo grupo) e mesmo dos liberais (o terceiro grupo), que terão de unir forças para reunir a maioria absoluta de 376 votos (em 751 eurodeputados) necessária para a eleição do presidente da Comissão Europeia.

Enquanto os trabalhistas ingleses já declararam que não votarão em Juncker, os socialistas portugueses deverão, em princípio, cumprir o acordo firmado entre os principais grupos parlamentares de apoiar o candidato da maior bancada.

“Privilegiamos a aplicação do princípio democrático”, disse ao PÚBLICO Carlos Zorrinho, chefe da delegação dos socialistas portugueses no PE. Por essa razão, adiantou: "Vou propor ao grupo que apoiemos a eleição de Juncker”. Segundo Zorrinho, o PE deverá insistir nesta posição “até às últimas consequências”. "A minha opinião pessoal é votar contra” qualquer candidato alternativo.

Martin Schulz, presidente (alemão) do PE e que foi o candidato dos socialistas às eleições em rivalidade com Juncker, recusou em contrapartida garantir que votará no luxemburguês, embora tenha considerado “inimaginável” qualquer solução que não passe pela escolha de um dos “candidatos-chefes de fila” apresentados aos eleitores europeus.

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