E depois do adeus?

Em 6 de Abril de 2011 pelas 20 horas e trinta e oito minutos, e perante a iminência de colapso financeiro do país, o primeiro-ministro do Governo de Portugal solicita apoio à Comunidade Internacional, afirmando-se “firmemente convencido, avaliadas todas as alternativas, que a situação financeira tenderá a agravar-se se nada for feito”.

A 3 de Maio anunciava que tinha chegado a “acordo com as delegações das instituições internacionais quanto ao Programa de Assistência Financeira a Portugal”, acrescentando que o considerava um “bom acordo …. que defende Portugal”.

Em 4 de Maio de 2014 o primeiro-ministro do Governo de Portugal anuncia que “três anos depois, estamos a poucos dias de terminar o Programa de Assistência. O 17 de Maio de 2014 ficará na nossa história como um dia de homenagem a todos os portugueses…”, acrescentando que “o Governo decidiu que sairemos do Programa de Assistência sem recorrer a qualquer programa cautelar”.

Não havendo consenso sobre o significado do dia 17 de Maio que, para uns, representou “a falsa saída da troika que continua cá dentro” e, para outros, foi “o dia da libertação”, parece inequívoco que cumprimos o contrato que nos foi imposto (leia-se, Programa de Assistência Económica e Financeira – PAEF).

Dito isto, todos parecem colocar a mesma questão: Estaremos então pior ou melhor? Para responder a esta questão teremos de a precisar com a seguinte pergunta: Estamos melhor ou pior, relativamente a quê?

Se a alternativa tivesse sido o não cumprimento do Programa, seguramente estamos melhor.

Se a alternativa fosse a não existência do Programa, a resposta não é fácil, uma vez que não conhecemos o “anti-mundo”, ou seja, não sabemos como é que a situação portuguesa teria evoluído, nomeadamente no que respeita à garantia das nossas necessidades financeiras sem apoio internacional (tivemos efectivamente essa alternativa?).

Mas o que nos espera “depois do adeus”? Será que os desafios e as tormentas que nos esperam são maiores do que aqueles que já enfrentámos?

Em primeiro lugar, permanece por pagar uma dívida colossal do Estado Português, superior a 130% do PIB. Fica ainda por resolver o “anémico” crescimento de uma economia em que o PIB cai … porque uma empresa de refinação de petróleo está parada durante 3 meses.

Importa também resolver definitivamente os problemas de um mercado de trabalho em que o desemprego diminui porque a população activa diminui ou em que um número significativo de desempregados (curiosamente?) só encontra emprego depois de perder o direito ao subsídio de desemprego (teremos um desenho inadequado dos mecanismos de protecção no desemprego?).

Fica ainda por resolver o estranho paradoxo de um país em que os beneficiários do Rendimento Social de Inserção diminuíram de 404 mil (Março de 2010) para 222 mil (Março de 2014), mas em que, simultaneamente, são oferecidas diariamente cerca de 50.000 refeições através das cantinas sociais (será que duas refeições por dia permitiram retirar da pobreza milhares de pessoas?).   

Dito isto, coloca-se uma questão central. Estaremos salvaguardados de uma nova intervenção? A resposta a esta questão não é simples e implica uma reflexão sobre Portugal no quadro europeu. Por um lado, a adesão a uma moeda única, num quadro de perda de política cambial, implica rigor e disciplina orçamental. Por outro lado, e mesmo que a primeira condição se verifique, uma união económica e monetária não sobrevive sem um reforço da integração política e, consequentemente, sem um orçamento comunitário forte. Estaremos preparados para isso?      

Relativamente à primeira condição, parece claro, e atento aos enormes desafios que se avizinham, que sem consenso politico alargado em matérias estruturantes, o rigor e a disciplina orçamental são inatingíveis de forma consistente (este não é o tempo das promessas de “amanhãs que cantam”).

No que respeita à segunda condição, e que depende parcialmente de nós, as expectativas são limitadas, atentos, por exemplo, às dificuldades verificadas na construção da tão necessária União Bancária, bem como à ausência de debate sobre a Europa e ao crescente movimento anti-europeista  tão bem evidenciado nos resultados das recentes eleições europeias.   

Em face do anterior, resta-nos as palavras de conforto do Presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloem que recentemente afirmou que “se as coisas correrem mal, há sempre o Programa normal (PAEF). Mas as coisas não vão correr mal”.

Professor na Universidade Lusíada, ex-vice-presidente do Instituto de Segurança Social.

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