Ricardo, o "tour manager" que ganhou o Prémio Diáspora

O trabalho como tour manager leva este português de uma ponta à outra do planeta, sem grandes interrupções. "Talvez mude de ideias quando sentir que quero uma namorada, um cão e uma casa", disse ao P3

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Rui Gaudêncio

Ricardo Ribeiro é tour manager há 12 anos, tendo já trabalhado com nomes como Rolling Stones ou Madonna. Acabou de vencer o Prémio Diáspora da COTEC, que visa reconhecer o sucesso de jovens portugueses no estrangeiro.

Ricardo Ribeiro nasceu em Oiã, distrito de Aveiro. Foi lá que permaneceu até aos 20 anos, quando decidiu dar o salto para Londres. Pelo caminho ficou uma vaga ideia de estudar Arquitectura, da qual apenas restou uma formação em AutoCAD. Na verdade, mais do que a arquitectura era a música que o chamava. Ao P3 lembra como costumava organizar "excursões com os amigos". "Para podermos ir a Madrid ou Barcelona ver concertos que não passavam por Portugal" — Mudvayne, Fear Factory ou Incubus eram alguns nomes que passavam perto do nosso país mas insistiam em não entrar.

O ano do tal salto para Londres foi o de 2002, ainda o país não desconfiava da densa crise que se aproximava. A motivação de Ricardo para emigrar prendeu-se então com paixão, e não com necessidade. Assume que foi para Londres com o fito de tirar um curso que lhe permitisse conviver mais de perto com a música — "por mais concertos a que fosse, queria mais e mais, e aqui não os tinha". O plano era ingressar em formação de tour management, mas mesmo antes disso arranjou trabalho na lendária sala de espectáculos londrina Astoria, agora encerrada. Ainda antes de tentar começar a construír o sonho, ele já se estava a realizar: "Pagavam-me para estar ali a aprender. Foi juntar o útil ao agradável".

O emprego que conseguiu no Astoria era o de "stage manager", cabendo-lhe cumprir os requisitos de cada banda para a actuação. Mas não pensem em toalhas aquecidas e embalagens de rebentos de soja (isso é catering). A Ricardo Ribeiro cabia procurar o amplificador de certo fabricante ou proporcionar o material necessário para o tipo de iluminação desejada (o hardware). De Dropkick Murphys a Pink, Ricardo foi-se habituando à convivência com rockstars. Mas não era contagiado pelo ambiente de sexo, drogas e rock n' roll. "É preciso coordenar bem uma equipa muito grande, e garantir que tudo está a postos à hora certa", diz. A única intoxicação que procurava era a da música, e sendo que o seu trabalho era garantir que nada impedisse que ela acontecesse, precisava de se manter alerta e disciplinado no olho do furacão de excessos e fúria que é um concerto. "Tenho noção que a ideia das pessoas é essa, que por trabalhar nesta área passo o tempo todo em festas e em altas", admite. Mas para Ricardo a carreira está acima de tudo isso. "Para se estar ao nível em que estou actualmente é preciso garantir consistência e não permitir que humores interfiram", assegura. Diz também que uma cabeça limpa é fundamental para conseguir manter uma grande equipa tão motivada quanto ele.

Entretanto, o cargo de stage manager transformou-se no de tour manager quando começou a ser reconhecido profissionalmente, e a trabalhar pelo próprio nome. Iniciou aí uma fase em que aeroportos e jetlag se sucedem. Recorda dois bons momentos na carreira: primeiro, quando uns dias após uma longa conversa com Mick Jagger sobre comida recebe um gift basket de variados queijos e salpicões, tão grande que quase não cabia na secretária. "Foi tudo tratado pelo pessoal dele, claro, mas vinha com um cartão de agradecimento assinado pelo Mick". Outro momento, num espectro oposto, foi quando fez a tour de uma banda com quem já havia trabalhado antes. O vocalista estava numa fase bastante avançada de alcoolismo, "a precisar de uma chapada na cara" como descreve Ricardo. "Literalmente, foi isso que aconteceu, seguido de uma longa conversa", diz "e ainda bem que ele hoje já se recuperou — mais tarde agradeceu-me aquele momento que foi mais de amigo do que de tour manager".

O trabalho como tour manager leva-o de uma ponta à outra do planeta, sem grandes interrupções. Mas quando questionado sobre se está a ponderar abrandar, a resposta é categórica: "Não tenho planos nenhuns de parar. Esforcei-me muito para chegar onde estou". "Talvez mude de ideias quando sentir que quero uma namorada, um cão e uma casa", acrescenta. "Mas de momento adoro o que faço".

Texto editado por Luís Octávio Costa

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