Nova investigação indica que James Joyce sofreria de sífilis

Historiador de Harvard diz ter seguido as pistas médicas até chegar à conclusão de que a doença explica os problemas de saúde do escritor de Ulisses e Gente de Dublin.

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Reprodução de uma fotografia não datada de James Joyce FRAN CAFFREY/AFP

Um novo livro sobre a história de Ulisses, de James Joyce, revela que o escritor irlandês começou a perder a visão devido ao facto de sofrer de sífilis, noticia esta terça-feira o diário britânico The Guardian. Não sendo a primeira referência à doença nas várias biografias do romancista e noutras obras, um investigador da Universidade de Harvard seguiu pistas médicas até chegar à conclusão de que, defende, dá “uma visão muito diferente” do escritor e do seu trabalho.

A doença está presente na obra de Joyce, tanto em Gente de Dublin quanto em Ulisses, e segundo disse ao Guardian Kevin Birmingham, professor de  História e Literatura em Harvard, estes novos dados “dão-nos uma visão muito diferente” do escritor irlandês, pois complementam as suas cartas e queixas com a realidade do seu “sofrimento profundo e privado”, dando nova perspectiva ao “abismo entre a sua doença privada e a sua vida pública que ajudou a moldar o que escreveu”.

De acordo com a investigação do professor de Harvard, a publicar esta semana com o título Joyce’s Ulysses, The Most Dangerous Book, a falta de vista de Joyce dever-se-ia ao facto de ter contraído sífilis. Pelo menos duas biografias de Joyce, uma de 1975 e outra de 1995, defendiam já a tese de que este sofria de sífilis como explicação para os problemas de saúde que o acometiam. Uma delas dizia que o irlandês sofria de sífilis congénita, contraída in utero, e a segunda estabelecia paralelos entre a obra e personagens de Joyce e a sua biografia, tendo sido “ridicularizada”, segundo Kevin Birmingham, por um médico ainda vivo que conhecera o romancista.

O que o historiador de Harvard descreve como “ataques dos olhos” de James Joyce “eram recorrentes porque a sífilis avança em ondas de crescimento bacteriano e latência”, considera. Joyce descrevia em várias cartas “abcessos que devastavam a sua boca e um grande furúnculo no ombro”, escreve o investigador no seu livro, que conclui que em 1907 o romancista deixara já de conseguir usar o seu braço direito devido à doença. A nova investigação atribui também à doença os seus “desmaios periódicos, a sua insónia e os colapsos nervosos”, apesar de, como escreve o Guardian, existirem já rumores durante o seu tempo de vida (1882-1941) de que sofreria da doença.

Birmingham recolheu dados, escritos e correspondência de Joyce em que este falava dos seus sintomas, e estima que estes se deveriam à doença sexualmente transmissível que afecta a vista mas também a pele e que até à descoberta da penicilina, em 1928, não tinha cura. Esta doença só a partir de 1910 passou a ter um tratamento mais eficaz, através da arsfenamina ou Salvarsan (o seu nome comercial).

O investigador seguiu as pistas da descrição dos sintomas por parte de Joyce, que o afectaram durante décadas, o que foi em si mesmo um indício, mas também dos tratamentos a que estava a submeter-se, nomeadamente injecções de arsénico e fósforo. “Não demorei muito a encontrar um medicamento que encaixasse [com as substâncias que Joyce tomava]: Galyl, um composto de arsénico e fósforo que os médicos injectavam várias vezes. Galyl só era usado para tratar a sífilis”, garante Kevin Birmingham, sendo menos comum que o Salvarsan, mas com menores efeitos secundários para a vista, que o escritor queria preservar ao máximo.

O investigador de Harvard diz não ter encontrado nas farmacopeias de vários países qualquer outro composto injectável que combinava arsénico e fósforo. 

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