Aos homens e mulheres introvertidos

Estima-se sermos apenas 1/3 da população e numa sociedade de culto da personalidade, onde extroversão, "risk-taking" e socialização em massa são impingidas, características como ter meia-dúzia de amigos, levar tempo a pensar nas cenas e preferir ficar em casa sexta à noite são já sinais de depressão.

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DaveAustria/Flickr

Os grandes contextos sociais deixam-me passado! Não é que não goste de estar com a Humanidade, mas não me queiram enfiar no mesmo sítio com toda ao mesmo tempo (exclui-se, obviamente, o planeta Terra). Arrojando-me no discurso, trocaria a grande maioria dos contextos sociais deste género pelo meu quarto. Acalme-se, por favor, a vontade de me diagnosticar com depressão que já explico de que é que sofro.

Sinto-me capaz de dar uma palestra a uma centena de pessoas, não fugir de turistas confusos no Porto, até de mandar uma piada em jantares; mas estar mais de 30 minutos em agregados sociais grandes ou (normalmente, e) barulhentos deixa-me passado. Isto, consequência de ser, não deprimido, muito menos tímido, mas sim, introvertido.

Diz-se que somos incompreendidos, até há quem comente que a sensação é similar à de ser uma mulher num mundo de homens. Estima-se sermos apenas 1/3 da população e numa sociedade de culto da personalidade, onde extroversão, "risk-taking" e socialização em massa são impingidas, características como ter meia-dúzia de amigos, levar tempo a pensar nas cenas e preferir ficar em casa sexta à noite são já sinais de depressão. Essa pressão para sermos mais sociáveis pode facilmente levar a que deixemos de responder a mensagens, ou de responder simplesmente. Brincadeiras à parte, julgo que essa insistência pode, de facto, magoar bastante.

A literatura sobre o assunto é variada, mas consistentemente apresenta-se como principal diferença entre um extrovertido e introvertido a seguinte: uma pessoa extrovertida vê no contacto social uma forma de recarregar baterias, já que necessita de uma grande quantidade de estímulo para se sentir bem. Já na introvertida a quantidade de estímulo necessária é variavelmente menor, daí que se torne insuportável ficar mais do que o comparativamente pouco, mas suficiente, tempo em locais de grande estímulo, tome-se uma discoteca como exemplo. Inclusive, há estudos que apontam para diferenças no processamento dos estímulos, sugerindo diferentes vias de sinalização.

O espectro que se constrói entre estes dois pólos basilares do temperamento é isso mesmo, um espectro. Daí que nem sempre prefira a calmaria do meu quarto. Por isso acrescento: sou maioritariamente introvertido, ou como diria a minha avó, caseirinho.

Apesar de parecer uma má noticia, a verdade é que somos, homens e mulheres introvertidos, uma grande parte do motor intelectual da sociedade. Podemos não ser quem normalmente faz, antes quem normalmente pensa, e a obra necessita das duas dimensões.

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