O celibato não é um dogma e “a porta está sempre aberta”, diz Francisco

Papa terá dentro de dias o seu primeiro encontro com vítimas de abusos sexuais dentro da Igreja.

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O Papa falou aos jornalistas no avião, de regresso ao Vaticano Andrew Medichini/Reuters

Não foi a primeira vez que o disse, nem foi o primeiro Papa a dizê-lo, o que não retira importância às palavras de Francisco. “Ao não ser um dogma de fé, a porta está sempre aberta…”, afirmou o Papa no avião que o levava de regresso ao Vaticano depois da peregrinação no Médio Oriente. Bergoglio já afirmara que o celibato não é um dogma, era ainda arcebispo de Buenos Aires, e repete-o agora, que é chefe da Igreja Católica.

“É uma regra da vida que eu aprecio muito e que penso ser uma dádiva à Igreja”, disse ainda, em resposta às perguntas colocadas a bordo pelos jornalistas. Os repórteres insistiram e quiseram saber se o Papa está disposto a colocar o tema à discussão, que será sempre incómoda. “A Igreja Católica tem padres casados. Católicos gregos, católicos coptas, há o rito oriental. Porque não se trata de um dogma mas de uma regra da vida.”

A Igreja ensina que um padre deve dedicar-se completamente à vocação para assim cumprir de forma adequada a sua missão. O celibato não é um dogma, não é uma peça imutável como a fé na ressurreição de Cristo, mas não deixa de ser uma tradição com mil anos. E se é verdade que a pressão para abolir esta regra tem crescido, também se mantém uma enorme oposição a esta mudança por parte das chefias católicas.

Bento XVI já tinha dito que não se trata de um dogma. Mas o que costuma ser sugerido – mais do que a possível ordenação de homens que poderão vir a escolher casar-se e ter uma família – é a ordenação de homens casados, mais velhos e especialmente dedicados ao serviço da Igreja.

Uma das novidades de Francisco, sublinha o jornal El País a propósito destas afirmações, “é precisamente a sua disposição para discutir o discutível, sem que deixe de dar a sua opinião”. O diário espanhol recorda a carta enviada na semana passada ao Papa por 26 mulheres que se dizem apaixonadas por padres e lhe pedem que deixe de proibir “um vínculo tão forte e bonito”.

Para além da questão do celibato, a possibilidade de a Igreja abrir a porta aos divorciados que voltem a casar-se deverá certamente ser debatida no próximo sínodo da família – marcado para Outubro com o tema “Os desafios pastorais sobre a família no contexto da evangelização”. Mas este sínodo, avisou Francisco, não foi “convocado para dar a comunhão aos divorciados que voltam a casar-se”, mas para discutir a família, que está “em crise mundial”.

Parte dos defensores do fim do celibato argumenta que a frustração sexual pode estar por trás de alguns dos muitos casos de pedofilia que têm abalado a Igreja, um argumento recusado pela hierarquia, que insiste que um pedófilo, dentro ou fora da Igreja, é sempre alguém com problemas mentais.

Pedofilia e privilégios

Francisco prepara-se entretanto para ter o seu primeiro encontro com vítimas de abusos sexuais por membros da Igreja. “São seis ou oito pessoas, da Alemanha, de Inglaterra ou Irlanda”, disse o Papa. Está previsto para daqui a dias: vai celebrar-se uma missa na residência de Santa Marta e depois as vítimas vão encontrar-se com o cardeal Sean O’Malley, o arcebispo de Boston que preside à comissão contra os abusos nomeada pelo Papa argentino.

“Mas sobre isto temos de seguir em frente. Tolerância zero”, disse o Papa, depois de comparar os abusos sexuais com a realização de “uma missa satânica”.

“Neste momento há três bispos sob investigação: um foi condenado e está a ser estudada a pena. Não há privilégios”, garantiu. “O sacerdote que faz isto atraiçoa o corpo do Senhor, porque em vez de o levar à santidade, abusa; tu tens de levar alguém à santidade e em vez disso levas essa pessoa a um problema que vai durar toda a vida.”
 

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