Mais um ensaio para os burros: da destruição do valor do trabalho

A destruição do fator trabalho é uma negação da democracia.

E repete-se. O Governo anuncia medidas violentas – desta vez, como noutras, contra o mundo do trabalho – com um único objetivo: fingir que está de boa-fé. Uma espécie de ensaio para um povo que tem por burro.

Avisa que vai explodir com mais 10 (exemplo) direitos laborais, porque flexibilizar é auxiliar a competitividade, para depois diminuir a dose. Sim, essa lógica ignorante que deveria levar o Governo a defender a escravatura. Sem custos de trabalho, a China seria uma miragem ultrapassada.

Depois de anunciadas as vexatórias reduções salariais quando as convenções caducam, depois, sim, depois, ocorre ao Governo reunir em concertação social.

Sempre, sempre, mas sempre de boa-fé, vem a notícia de sempre, de sempre, mas de sempre: “o Governo cede”.

Mota Soares elogia a UGT e, sensibilizadíssimo, muda de ideias: as reduções atingirão menos elementos da retribuição.

Isto é política de manipulação e de mentira.

Resume-se a esta metáfora: aviso que vou aprovar a pena de morte e, depois, reúno-me com quem de direito e surjo pronta para o recuo que nos traz alegadamente conforto: afinal, fiquei-me pela defesa da prisão perpétua. Cedi.

Ao mesmo tempo, depois do acórdão do TC que chumbou as últimas alterações às normas relativas à extinção do posto de trabalho, toca a ceder: a extinção do posto de trabalho vai ter novas regras a partir de 1 de Junho, passando a avaliação de desempenho a ser o primeiro critério, entre cinco, para justificar o despedimento. Por ordem, os cinco critérios da lei são: pior avaliação de desempenho, com parâmetros previamente conhecidos pelo trabalhador; menores habilitações académicas, e profissionais; maior onerosidade pela manutenção do vínculo laboral do trabalhador para a empresa; menor experiência na função; e menor antiguidade na empresa.

A antiguidade no posto de trabalho, esse critério primeiro e normal até há 5 minutos, é coisa para sovietistas.

Ao mesmo tempo, quanto ao ataque à contratação coletiva como forma de redução de salários (nunca esquecer que empobrecer é meio para aumentar as exportações), o Governo propõe agora que as convenções coletivas possam ser temporariamente suspensas em empresas em crise, para salvaguardar empregos, desde que haja acordo entre empregador e comissão sindical ou intersindical da empresa. O Governo cedeu.

Mais uma medida de muito duvidosa constitucionalidade. A coisa, a par da que permitia cortes salariais, é mais do mesmo: quero o fim do mundo, fico-me por queimar metade.

O Governo está focado no corte das horas extra e na caducidade das convenções. O Governo mantém a proposta de reduzir de cinco para dois anos o prazo de caducidade das cláusulas que permitem que a convenção se mantenha em vigor até ser substituída. Também quer reduzir de 18 para seis meses o prazo mínimo durante o qual qualquer convenção vigora após denúncia.

O Governo dá cabo do fator mais importante para a sustentabilidade de uma sociedade: o fator trabalho. Essa será uma das marcas mais impressivas da sua governação. A destruição do fator trabalho, do seu valor, com a semântica da cedência, é, também, uma negação da democracia.

Deputada pelo PS

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