A moda da marmita deu frutos para a pequena empresa de Carlos Caneiras

A Marmita aproveitou uma oportunidade trazida pela crise. Nasceu em 2012 e já tem 20 trabalhadores.

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Carlos Caneiras saiu a tempo do negócio imobiliário Rui Gaudêncio

Pouco mais de dois anos. O tempo necessário para passar de cinco para 20 trabalhadores. E mudar por completo a estratégia de negócio. Nada de planos, linhas predefinidas, visões ou missões. Tudo simples. Carlos Caneiras, 33 anos, sobe as escadas de uma renovada empresa, instalada no Parque Industrial do Arneiro, em São Julião do Tojal, bem perto do Mercado Abastecedor de Lisboa. Na parede branca sobressai o logótipo de A Marmita. Foram os primeiros no mercado, em Abril de 2012, a lançar uma ideia que ganhou adeptos num curto espaço de tempo: entregas de refeições no local de trabalho.

Na sala de reuniões, com caderias de veludo castanho, chão e paredes brancas, há um painel de madeira corrido onde uma frase domina o ambiente: “A diferença entre o possível e o impossível é que o impossível dá mais trabalho.” E Carlos Caneiras nunca imaginou estar, hoje, a dar entrevistas e a empregar duas dezenas de pessoas. “Fizemos muita coisa por instinto, a ver no que dava, e felizmente as coisas correram bem”, conta um dos fundadores da empresa, que facturou, em 2013, 600 mil euros.

Por dia são entregues mil refeições, entre almoços e jantares, para empresas e casas particulares. A intenção é aumentar para as seis mil refeições diárias este ano. E em 2015 chegar às 15 mil. Planos ambiciosos, que passam pela expansão nacional do conceito – agora apenas disponível na zona da Grande Lisboa – e, quem sabe, pelo mercado internacional. Carlos Caneiras acredita que as novas instalações – num investimento de cem mil euros – e a campanha publicitária que estreou em Março, com nova imagem e comunicação, irão ajudar a dar o salto.

A Marmita profissionalizou-se e cresceu em pouco tempo. E sobreviveu às reviravoltas do poder de compra dos portugueses e a mudanças de hábito profundas, quase impensáveis antes da crise de 2008. Levar comida para o trabalho era mal visto. Comer no restaurante é que era. Agora, nas empresas há filas nos microondas para aquecer o tupperware.

Mas Carlos Caneiras e os seus dois sócios não arrancaram com o negócio a pensar na marmita. Tudo começou com o pão. “Em 2009 criámos a Rotina Perfeita, o nome que demos à empresa que vende pão e bolos ao domicílio e que ainda mantemos. Eu trabalhava como mediador imobiliário, mas tive de fechar a empresa [que tinha com outros sócios]”, começa por contar. Durante cinco anos, o sector da habitação deu frutos. Contudo, a partir de 2007 as receitas começaram a cair. “Nesse ano conseguimos cem mil euros cada um. Em 2008 chegámos ao final do ano com 70 mil. Se continuássemos assim, íamos ter cada vez menos e decidimos fechar”, recorda o empresário, que se antecipou à forte crise que assolou este mercado.

Com o dinheiro que conseguiu na mediação imobiliária, juntou-se a dois novos parceiros e, com recurso apenas a capitais próprios – cerca de 70 mil euros –, avançaram juntos para as entregas diárias de pão. “Era um projecto inovador e diferente e recuperava um hábito que se perdeu. Havia procura e tínhamos 500 clientes por dia nas zonas da Portela, Expo, Odivelas e Lisboa”, continua.

As vendas corriam “mais ou menos” e para aproveitar a base de clientes era preciso avançar em frente. Os três sócios começaram, então, a servir refeições ao domicílio a um preço atractivo. Para mostrar o serviço, ofereceram 200 jantares aos clientes. E as encomendas começaram a chegar. “Percebemos que as pessoas encomendavam a dobrar para levarem para o almoço do dia seguinte e passámos a oferecer este serviço”, diz. Em 2012 foi fundado oficialmente o novo negócio, um ano “muito positivo”, tal como o de 2013. “A Marmita cresceu por si só. Foi o boca-a-boca, as pessoas gostam da comida”, conta.

A ementa inicial tinha cinco pratos, agora tem 30. A comida ia ainda morna, agora vai fria para cumprir todos os requisitos de segurança alimentar. “Os jantares são muito procurados por clientes com mais idade que já não conseguem cozinhar. Mas também fornecemos para infantários, Instituições Particulares de Solidariedade Social, vamos a empresas e fábricas”, descreve.

Carlos Caneiras garante que a moda da marmita não é a razão do crescimento do negócio. Diz que a crise “é uma palavra que vai passar”. “Nós vamos ter de viver assim. Este não é um negócio de crise, nós tivemos de nos moldar e viver com menos”, sustenta. Ir ao restaurante já não é um hábito entre a população mais jovem, que prefere comer bem, rápido e com o menor custo possível. Carlos Caneiras diz ainda que muitas empresas deixaram de ter refeitório para ter apenas copa. “As pessoas preferem mandar vir a marmita e aproveitar os 45 minutos que lhes restam da hora de almoço e ir ao ginásio, por exemplo”, conta, sublinhando que, por isso, a questão não é só poupar nos gastos com refeições fora de casa.

A distribuição de pão ainda pesa 10% no negócio mas, se não fosse a entrega de comida, provavelmente Carlos Caneiras já teria dado por encerrada a empresa.

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