O instinto materno está fora de moda?

Os homens não existem apenas para ensinarem o filho a jogar à bola e a filha a andar de bicicleta. O mais importante para os filhos não é a presença de uma figura masculina (ou feminina), mas uma (co)parentalidade sensível

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Luke MacGregor/Reuters

Dados de 2009 mostram-nos que semanalmente as mulheres prestam, em média, mais seis horas de cuidados aos filhos e dedicam-se mais dez horas às tarefas domésticas do que os homens. Porque motivo os homens não se envolvem mais nos cuidados aos filhos? As mulheres não os deixam? Falta de informação? Algo parece não bater certo se atentarmos ao número crescente de licenças facultativas exclusivas que são atribuídas ao pai. O argumento das horas de trabalho remunerado que os homens têm que enfrentar não é mais válido. O número de famílias com configurações de duplo emprego tem aumentado para, de certa forma, contornar a escassez de dinheiro ao fim do mês que nos bateu à porta em 2008 e se tem feito de convidada até aos dias de hoje.

O modelo do (não) envolvimento paterno nos cuidados aos filhos (sobretudo nos cuidados emocionais), que os catapultam para uma posição de “primeiro estranho” na família, parece ainda ter por base a ordem de género e não ser alheio à noção de “instinto materno”. Mas o que eles e elas certamente não sabem é que esse conceito está fora de moda. Os homens mimetizam a produção hormonal das suas parceiras, mesmo durante a gravidez. Por exemplo, a testosterona diminui quando contactam com os seus filhos; produzem mais prolactina quando são pais; a oxitocina iguala os valores das mulheres após o parto; e outras hormonas, como a progestorena ou o estrogéneo, parecem ser sensíveis à vida familiar e potenciar comportamento paternais.

As bases biológicas da paternidade não se ficam por aqui. Estudos demonstram ainda que as áreas cerebrais activadas a pistas de bébés (choro, vídeos) são as mesmas que se activam nas mulheres. Esta activação, à semelhança do que acontece com as mulheres, varia ao longo do tempo, à medida que a criança se desenvolve e dá pistas mais complexas ao pai. Portanto, os homens têm o mesmo arsenal biológico que as mulheres para prestarem cuidados às crianças (com excepção para a amamentação ao peito, claro).

Este “background” biológico serve quer aos cuidados instrumentais quer aos emocionais. Os homens não existem apenas para ensinarem o filho a jogar à bola e a filha a andar de bicicleta. De facto, o mais importante para um desenvolvimento óptimo dos filhos (e bem-estar familiar) não é a presença de uma figura masculina (ou feminina), mas uma (co)parentalidade sensível, em que o envolvimento emocional seja a ordem do dia.

É urgente que se perceba que os homens não são, "a priori", melhores em Y e as mulheres em X no que toca aos cuidados aos filhos. O ideal seria partirem, homens e mulheres, de uma mesma base de comportamentos a prestar à criança, não significando que ao longo do tempo alguns papéis se estabeleçam (se ela é melhor a dar o banho ao bebé e ele um óptimo cozinheiro, então que se chegue a um acordo que potencie o bem-estar de todos).

Parece estar nos antípodas da nossa concepção de realidade familiar, mas porque não deixarmos de falar em maternidade e paternidade para passarmos a falar em parentalidade?

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