Quartett: uma ópera dos tempos modernos na Gulbenkian

Espectáculo de Luca Francesconi, com encenação dos catalães La Fura dels Baus, estreia-se nesta terça-feira na Gulbenkian, com a mesma produção de quando se estreou no Teatro alla Scala, em Milão, em 2011.

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Quartett Rudy Amisano © Teatro alla Scala
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Depois de no ano passado se ter estreado na Casa da Música, no Porto, com encenação de Nuno Carinhas, a ópera Quartett, do compositor italiano Luca Francesconi, estreia-se nesta terça-feira em Lisboa praticamente como foi apresentada em 2011 no Teatro alla Scala. Tal como aconteceu em Milão, no Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian o espectáculo conta com a proposta cénica dos catalães La Fura dels Baus, e a direcção musical está entregue à finlandesa Susanna Mälkki. A música fica a cargo da Orquestra Gulbenkian.

É provavelmente a maior produção que a Gulbenkian recebeu até agora. Quem o diz é Miguel Sobral Cid, director adjunto do serviço de música da Gulbenkian, explicando que Quartett “é um grande teste à sala”, que foi recentemente restaurada para que pudesse exactamente receber produções como esta que acontece nesta terça-feira (às 21h) e na quarta (às 19h). “Ao longo da história da Fundação Calouste Gulbenkian, não fizemos um espectáculo tão complexo como este”, diz ao PÚBLICO Miguel Sobral Cid, acrescentando que “só com a renovação feita é que se conseguiria aqui apresentar esta superprodução do Teatro alla Scala”.

Quem é apreciador de ópera e ainda não conhece o trabalho do compositor italiano Luca Francesconi não espere daqui um espectáculo convencional. “É ópera em todo o seu sentido, mas é diferente do que já vimos”, diz a maestrina Susanna Mälkki. Da mesma forma que quem há muito segue os catalães La Fura dels Baus se poderá surpreender com o trabalho aqui apresentado. “Quem os conhece talvez esteja à espera de uns Fura dels Baus sempre muito polémicos na sua performance, mas aqui eles estão como que no backstage”, explica Miguel Sobral Cid, destacando que foi a equipa dos catalães que encenou e tratou de todos os aspectos cénicos desta ópera “mas não são eles próprios intervenientes no palco”. Isto é, “não são eles os performers”.

Na verdade, nesta ópera os performers são apenas dois: a Marquesa de Merteuil, interpretada por Allison Cook, e o Visconde de Valmont, interpretado por Robin Adams. Os dois protagonistas que também no ano passado estiveram no Porto, naquela que era uma adaptação deste espectáculo, a partir de um texto do dramaturgo alemão Heiner Müller, que na origem teve um romance epistolar do escritor francês Choderlos de Laclos, cuja notoriedade foi sendo ampliada por sucessivas adaptações ao cinema, a mais conhecida das quais foi a que o inglês Stephen Frears realizou em 1988 com os actores americanos John Malkovich e Glenn Close como protagonistas de Les Liaisons dangereuses/As Ligações Perigosas.

Em traços simples, diz-nos o barítono Robin Adams, “Quartett é sobre um casal que está com problemas na sua relação”. “Este homem e esta mulher já não sentem nada e estão à procura de novas formas de poderem sentir”, continua o protagonista, para quem este casal está numa luta constante de poder e sedução. “Há também um jogo sexual em que ela se chega a tornar homem e ele mulher,  tornando tudo um bocado perverso”, explica Adams. “Mas isto é o básico, porque na verdade aqui não há apenas uma linha na história, há muitos temas em abstracto, como a solidão, a paixão ou o envelhecimento", continua o protagonista, destacando a “grande experiência multimédia” que dá intensidade à história. “Acho que esta é a forma como a ópera deve avançar, usando diferentes elementos multimédia.”

Para a finlandesa Susanna Mälkki, colaboradora frequente de Luca Francesconi e que é também a maestrina principal convidada da temporada 2013/2014 da Fundação Calouste Gulbenkian, esta não é uma ópera convencional, “porque a peça não é convencional”. “É um texto muito ousado que conta uma história que é muito forte do ponto de vista humano e em palco tudo está bem relacionado”, diz Mälkki, para quem nesta ópera “não se canta como numa ópera de Verdi mas mesmo assim tem muitas melodias e algumas delas surpreendentes para uma peça contemporânea”. “Acho que do ponto de vista da ópera, isto é perfeito, é o que a ópera deve ser.”

Susanna Mälkki destaca o lugar da música nesta ópera. “Podemos ver como a música representa os diferentes estados de espírito daquelas duas personagens em palco e acho que isso torna tudo muito mais compreensível para o público.” Da mesma forma, diz, que as projecções em vídeo também ajudam a criar esta relação. “Francesconi não é só um compositor contemporâneo como é um compositor que conhece toda a história que há para trás e, especialmente neste trabalho, percebemos que ele tem um conhecimento extraordinário dos vários estilos”, explica a maestrina, para quem o resultado “é fabuloso”.

Para Miguel Sobral Cid, depois deste teste, o palco da Gulbenkian “está preparado para as mais complexas produções”.

Notícia corrigida no dia 02/04 às 15h: Referia-se erradamente que o espectáculo apresentado na Casa da Música em Setembro passado foi uma verdão reduzida desta ópera de Luca Francesconi, quando na verdade a versão foi a mesma com a diferença de ser uma encenação de Nuno Carinhas. Além disso, Quartett não é apresentado na Gulbenkian tal e qual como no Teatro alla Scala, uma vez que a ópera foi estreada em Milão com coro e orquestra ao vivo. Na Gulbenkian, tal como na Casa da Música, é apresentada uma versão com gravação do coro e parcialmente da orquestra do alla Scala tratada electronicamente pelo IRCAM.

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