Facebook 1974: procurar o amor e encontrar a revolução

E se o Facebook existisse há 40 anos? Pedro Xavier dá-nos o ponto de vista de um herói fictício e anónimo que chega do passado para contar a sua história de amor, em que a revolução e a mudança são plano de fundo. O autor será revelado no dia 25 de Abril. O P3 falou com ele

É um livro sem autor, construído exclusivamente no Facebook — que não existia em 1974 — com a ajuda dos “fãs” da página, que podem partilhar as suas experiências e fotografias. A celebração do quadragésimo aniversário do 25 de Abril é aqui feita por analogia com o percurso pessoal de Pedro Xavier, uma vida indefinida que o leitor é convidado a moldar através de memórias.

“Ao existir no formato online, a história e o destino de Pedro Xavier estão ainda em aberto, dependendo em grande parte do relacionamento que vier a estabelecer-se entre ele e os seguidores da página”, explicou ao P3 o escritor escolhido pelo Teatro Municipal Maria Matos e cuja identidade é ainda desconhecida — vai ser revelada apenas no dia 25 de Abril.

Esta interacção entre personagem e público, possibilitada pela rede social, assume-se como uma "voz do futuro" que Pedro ouve, algo obscurecida pela sua realidade e pelo seu drama pessoal: “Quando não nos sentimos bem com o que nos rodeia ou connosco próprios precisamos de mudar ou que os outros mudem. Mudar é pôr o presente conforme com o futuro, é moldar o presente ao futuro. Mas a mudança tem de começar sempre dentro de nós”.

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Pedro Xavier não é ninguém, mas podia ser qualquer um de nós. Tem 18 anos na altura em que a Revolução floresce. Filho de uma família da classe média, cresceu em Benfica e quando atingiu a maioridade, recusou-se a ir para o Ultramar. Antes de partir para França com o intuito de fugir ao regime, conhece Luiza, por quem se apaixona. Mesmo assim, Pedro é obrigado a emigrar e continua a escrever à amada, até ao momento em que, subitamente, esta deixa de lhe dar notícias. Pedro vê-se obrigado a voltar.

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Quando a história se transforma em presente

“A relação entre Pedro Xavier e Luiza materializa de algum modo o drama do país à procura da revolução. Tal como, ao regressar, Pedro Xavier deseja e pressente que Luiza está viva e algures perto dele, também o país nos tempos que antecedem o 25 de Abril deseja e pressente a revolução. Deste ponto de vista a Luiza personifica o ideal revolucionário e Pedro Xavier a vontade de mudança de um Portugal cansado”, explica o autor.

O plano de fundo da revolução de Abril não implica que a intriga se encerre no espaço e no tempo: “Pedro Xavier vê-se obrigado a sair do país tal como vários jovens de então. Uns, como o caso dele, para fugirem à guerra, outros, muitos mais até, para fugirem à fome. Infelizmente, também hoje muitos jovens se vêem obrigados a sair do país por não existirem condições em Portugal”.

Esta analogia de dois momentos separados por quarenta anos é construída num contexto “particularmente dramático” da vida de Pedro. O personagem está constantemente confrontado com dilemas sobre a liberdade, a responsabilidade, lealdade, e tantas outras questões intemporais e que conferem importância a esta representação. Como afirma o escritor, “um personagem só existe verdadeiramente quando consegue ser transversal ao tempo e às circunstâncias”.

Sem intenções historiográficas ou documentais, o autor diz servir-se desta "estrutura dramática sólida" que os testemunhos vão disponibilizando ao longo do próximo mês. Antes de ser um local de partilha da história, é uma plataforma que permite a reflexão. "Todos podemos ser, todos devemos tentar ser heróis anónimos da revolução. As revoluções, tal como os amores, precisam de ser reafirmadas dia após dia, sob risco de — assim não sendo — definharem e acabarem por morrer".

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