Mãe há só uma

Com Mãe e Filho, o cinema romeno continua a provar ser um viveiro de talentos e de histórias bem contadas sobre o nosso mundo.

Não sabemos bem o que eles põem na água na Roménia, mas alguma coisa deve ser, para justificar o altíssimo nível médio da produção cinematográfica local ao longo da última década. Mãe e Filho, Urso de Ouro em Berlim 2013 e segunda longa de Calin Peter Netzer, não serve de excepção. O argumento de Razvan Radulescu (já responsável pelos guiões dos dois filmes que deram o tiro de partida para a repercussão internacional dos romenos, A Morte do Sr. Lazarescu e a Palma de Ouro de Cannes 4 Semanas, 3 Meses e 2 Dias) parte do seu caso local para uma história universal sobre a família, à volta da relação disfuncional entre uma mãe-galinha dos infernos e o seu filho único adulto. Cornelia é uma burguesa nova-rica de Bucareste, que não descansa enquanto não controlar a vida de Barbu, e sai-lhe a “sorte grande” quando, num acidente de automóvel, o seu menino mata um miúdo que atravessava a rua, começando a trabalhar a sua agenda de contactos bem colocados para safar o filho de ir para a prisão. Cornelia, interpretada com garra pela grande Luminita Gheorghiu (que já conhecemos dos tempos da Morte do Sr. Lazarescu), é no papel uma das personagens mais odiosas do cinema recente: uma mulher manipuladora, mesquinha, arrivista, pedante, insegura, intrometida. Mas nem a actriz nem o realizador Calin Peter Netzer nos fazem nunca esquecer que Cornelia é também uma “mãe coragem”, como todas as outras capaz de tudo pelo filho (mesmo que esse tudo nos pareça claramente disfuncional). A inteligência de Mãe e Filho está no modo como a aparente certeza inicial da premissa vai sendo modulada progressivamente para revelar os cambiantes escondidos por trás da superfície, pacientemente desmontando os aparentes arquétipos iniciais. Se se cumprir a “maldição” do desinteresse que tem perseguido o cinema romeno nas nossas salas, Mãe e Filho não vai ter a recepção que merece - mas é pena, porque poucos outros cinemas modernos falam do nosso quotidiano como este, e os outros todos, têm falado.

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