O que é feito do Carlos Fino?

Quem, nos anos 90, cresceu e aprendeu a ver televisão compreender-me-á e lembrar-se-á imediatamente daqueles vivos terminados com um afamado e já distante “Carlos Fino, RTP, Moscovo”

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Vicissitudes da profissão e vantagens de se viver no século XXI, encontrei há dias por essa internet um dos ícones televisivos dos anos 90. Pese embora o facto de termos um oceano entre nós, acabei a conversar com Carlos Fino, o homem que eu olhava com o encanto de quem possui uma presença imponente e intocável no ecrã da sala. Quem, nos anos 90, cresceu e aprendeu a ver televisão compreender-me-á e lembrar-se-á imediatamente daqueles vivos terminados com um afamado e já distante “Carlos Fino, RTP, Moscovo”.

Antes de mais, é preciso responder à pergunta: o que é feito do Carlos Fino? O trajecto é simples. “Por mais estranho que pareça, vim parar ao Brasil via Iraque”, conta, “a cobertura que fiz da última Guerra do Golfo para a RTP teve aqui bastante repercussão, a ponto de a TV Cultura, de São Paulo, me ter convidado para ser o seu correspondente em Bagdad”. O ano de 2004 foi de mudança profunda: a convite do canal paulista, Carlos Fino visita o Brasil e acaba por dar várias palestras sobre jornalismo em diversas universidades, como São Paulo, Rio de Janeiro, Natal, Fortaleza ou Brasília. António Franco, então embaixador de Portugal no Brasil, acabou por abrir a porta a Carlos Fino. “Fui conselheiro de imprensa da Embaixada durante oito anos”, revela.

Então e depois? Bem, depois foi a hora do retorno. Era para ser definitivo mas acabou por ser fortuito. “Quando regressei, em 2012, constatei que o interesse [da RTP] era mais que eu saísse do que ficasse”, desabafa. Ao fim de trinta anos na estação pública e até idas a programas famossíssimos no Brasil, como “O Programa do Jô” ou o “Roda Viva”, por cá ninguém pareceu querer mais saber de Carlos Fino. Às tantas, até o público já se esqueceu dele. Ainda assim, o jornalista não traz amargo de boca. “Lamento a saída, claro, mas não posso queixar-me muito da RTP. Foi ali que me realizei profissionalmente e foi a RTP que me proporcionou os melhores momentos da minha carreira”, reconhece. Entre eles, os trabalhos em Moscovo, Bruxelas, Washington, Tchetchénia, Geórgia, Afeganistão e Iraque são os que trazem as melhores lembranças.

Carlos Fino culpa, de certa forma, a crise. “Lamento que as circunstâncias que o país e a empresa atravessam tenham acabado por impor a minha saída. Essa atitude não é, aliás, exclusiva da RTP. Antes de voltar para o Brasil, contactei outros órgãos de imprensa portuguesa, públicos e privados, e nenhum deles manifestou interesse em ter um correspondente em Brasília.”

A verdade é que, em oito anos brasileiros, nenhum ressentimento toca à porta da alma. Entre contactos profissionais e amizades, Carlos Fino alargou o seu conhecimento com a comunidade portuguesa no Brasil. Reconhece que os mais novos, os que para lá emigraram agora, estão a dar conta de que “a partilha de uma língua comum não chega e que o Brasil não é fácil, não é para amadores” e que, por isso, há muitas “saudades da terrinha”. Ele que o diga.

“Obrigado que fui, ao longo da vida, por razões profissionais e particulares, a viver anos a fio fora do País”, constata, “habituei-me a controlar a saudade. Mas não há português que não a tenha e, nisso, eu não fujo à regra. Mesmo que me custe muito ver certas coisas em Portugal”. Restará saber se muitos portugueses ainda recordam Carlos Fino. Ele, pelo menos, recorda-se de nós, prometendo um regresso em breve. “Sempre que posso vou a Portugal e é aí que quero acabar os meus dias”.

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