O ensino superior e os "drs." do inferior

O ensino superior está a promover a queda sucessiva de valores. O que é grave, já que os “drs.” começam a não passar de meros vassalos do pensamento repetido e sem noções da função da ciência e da tecnologia para a evolução social e humana

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Tiago A. Pereira/Flickr

É profundamente curioso assistir aos massivos apelos para que o ensino superior seja capaz de formar profissionais aptos e integrados na realidade social.

As instituições de ensino superior (em Portugal) estão a cometer um atroz crime: estão a criar mentes e modos de estar completamente estandardizados, ao invés de promover o espírito crítico, reflexivo e de dotar de capacidades e competências para, como se diria mais recorrentemente, transformar “diamantes brutos” em peças refinadas e especiais pela sua “perfeição” exímia e particular. Estes sim fariam a diferença numa sociedade pautada pela liquidez, complexidade e exigências em constante mutação, como aquela em que vivemos.

O ensino superior tem discrepâncias e paradoxos enormes. Tenta constantemente adaptar currículos e níveis de exigência à universalidade do espaço europeu (Bolonha), quando dentro das fronteiras do nosso pequeno país se aplica a explícita regra de “cada cabeça, sua sentença”, já que cada unidade orgânica faz o que entende (seja por má ou boa fé, consoante o trabalho e responsabilidade dos envolvidos), usando a desculpa da “autonomia orgânica”. Veja-se que existem ainda, por vezes, intoleráveis dissipações entre ensino público/privado; universitário/politécnico em que, mais uma vez, a autonomia orgânica é a desculpa maior e que ainda promove a falsa noção de que as instituições são vítimas de preconceitos socialmente veiculados. As vítimas, na verdade, são as famílias e estudantes que investem em instituições incapazes e impotentes para dar a resposta que é precisa no agora e no amanhã da vida destes futuros profissionais. Todas estas instituições do ensino superior são necessárias e profundamente valiosas para os vários eixos do desenvolvimento desde que, naturalmente, cada uma delas compreenda o seu lugar e as competências que devem transmitir aos seus discentes.

  

Não esquecendo, claro, as actuais bolsas de investigação/doutoramento que, das duas uma: ou não existem; ou são atribuídas com base em obrigatoriedades de temas que, mais uma vez “dão jeito” a alguém/alguma instituição. No fundo, “estamos” a transformar a investigação numa espécie de empresa de estudos de mercado. O que não acaba, ironicamente, por estar totalmente errado, já que vivemos na era da economia do conhecimento, em que só o conhecimento que gera valor económico é valorizado e impulsionado. O que muito lamento.

Que nunca se esqueça que, sem todos os domínios do saber unidos em interdisciplinaridade, a ciência não serve de nada senão para criar formações disformes e para continuar a propagar esta ditadura camuflada.

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