Os protagonistas da batalha de Kiev

A violência conheceu um novo extremo na capital ucraniana nos últimos dias. Desde Novembro que os protestos se modificaram e a Praça da Independência vive momentos de elevada radicalização.

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Presidente e líderes dos partidos da oposição têm sido os rostos da negociação. Mas nas ruas são os grupos informais que lideram as acções mais violentas.

Viktor Ianukovich

No poder desde 2010, Viktor Ianukovich, de 63 anos, viu a sua reputação afectada depois de suspeitas de fraude eleitoral nas eleições de 2004, na origem da Revolução Laranja. Com a queda crescente da popularidade de Iulia Timoschenko, Ianukovich conseguiu vencer as eleições de 2010 por uma pequena margem de 3% dos votos, num sufrágio considerado limpo pelos observadores internacionais.

A base de apoio ao Partido das Regiões encontra-se sobretudo no Leste do país, nas regiões mais próximas da Rússia, tanto ao nível cultural como económico. Cidades como Donetsk, Kharkov e Luhansk têm uma população considerável de falantes de russo e de russos étnicos. O primeiro idioma de Ianukovich é russo, apesar de ter aprendido ucraniano desde que tomou posse.

Num país onde o poder económico se confunde frequentemente com o poder político, os oligarcas exercem uma influência assinalável. No Parlamento, por exemplo, apesar de os deputados estarem divididos em grupos parlamentares partidários é a lealdade a um empresário poderoso que muitas vezes se torna determinante.

Ianukovich conta com o apoio de Rinat Akhmetov, o homem mais rico da Ucrânia, com uma fortuna avaliada pela Forbes em 15,4 mil milhões de dólares (11,2 mil milhões de euros). Akhmetov fez fortuna na exploração mineira na região de Donetsk, que já foi governada por Ianukovich – onde também é proprietário do clube Shakhtar Donetsk.

Apesar de aparecer hoje como um aliado de Moscovo, publicamente Ianukovich sempre alinhou por uma política de aproximação à União Europeia. Numa entrevista à BBC, chegou a afirmar que “a integração da Ucrânia na UE continua a ser o objectivo estratégico”. A primeira viagem oficial que fez foi precisamente a Bruxelas.

Uma das principais críticas sobre Ianukovich é a suspeita que recai sobre a chamada “família”, um círculo próximo do Presidente que terá enriquecido à custa de favorecimentos ilícitos.

Vitali Klitschko

É provavelmente o rosto mais conhecido da oposição ucraniana, muito devido à sua carreira no boxe profissional. Vitali Klitschko, de 42 anos, iniciou a sua carreira política com uma candidatura à câmara municipal de Kiev, em 2006, tendo ficado atrás do vencedor. Nas eleições locais de 2008, Klitschko conseguiu 15 lugares no Conselho de Kiev, depois de ter contratado como consultor o ex-mayor de Nova Iorque Rudolph Giuliani.

Mas foi a partir de 2012 que o ex-campeão mundial de pesos-pesados alcançou maior notoriedade. Foi nesse ano que fundou o seu partido, o UDAR (a Aliança para a Reforma Democrática Ucraniana, cuja sigla significa “murro”), tendo alcançado 14% dos votos nas legislativas, apostando num programa anticorrupção.

Durante os protestos dos últimos meses, Klitschko apresentou o discurso mais pró-europeu e tem aproveitado a sua forte popularidade na Alemanha, onde fez grande parte da carreira, para construir ligações ao Ocidente. No entanto, a proximidade forte à Alemanha também lhe valeu críticas, obrigando-o a renunciar à nacionalidade alemã recentemente.

As principais fraquezas que lhe são apontadas são a inexperiência política – nunca exerceu qualquer cargo público – e as fracas capacidades oratórias. Mas o próprio Ianukovich vê em Klitschko o principal adversário nas eleições presidenciais de 2015, segundo vários analistas.

Arseni Iatseniuk

Lidera o partido Batkivshchina (Pátria), tendo sucedido a Iulia Timochenko, após a sua detenção, apesar de a “musa” da Revolução Laranja continuar como líder formal. Aos 39 anos, Iatseniuk já passou por vários cargos políticos de relevo, tendo assumido as pastas dos Negócios Estrangeiros e das Finanças em governos anteriores e tendo liderado o Parlamento.

Foi a Iatseniuk que Ianukovich ofereceu a liderança do governo, a 25 de Janeiro, na tentativa de fazer cessar os protestos. Num primeiro momento, Iatseniuk afirmou estar pronto para “assumir as responsabilidades”, mas logo recuou e esclareceu que não iria aceitar o “presente envenenado” do Presidente.

Iatseniuk está longe de ser o líder mais popular junto dos manifestantes, faltando-lhe o carisma reconhecido a Timochenko. Mas é o reconhecimento da sua experiência política que o apresenta como uma aposta segura num futuro executivo. Pelo menos foi essa a indicação dada pela vice-secretária do Departamento de Estado norte-americana, Victoria Nuland, durante uma conversa telefónica que chegou a público nas últimas semanas.

Oleg Tiahnibok

O líder do partido nacionalista Svoboda (Liberdade), de 45 anos, tem sido gradualmente afastado das conversações com a presidência. Oleg Tiahnibok foi o único líder da oposição a quem Ianukovich não ofereceu qualquer cargo de governo, numa demonstração clara de que este partido não deverá entrar nas contas do poder no futuro.

O Svoboda alcançou cerca de 10% dos votos nas eleições de 2012 e tem sido uma das forças mais mobilizadoras nas ruas. A presença de Tiahnibok, que chegou a referir-se à “máfia judaico-russa que domina a Ucrânia", ao lado de uma oposição pró-europeia causa estranheza e preocupa os analistas.

A base de apoio do Svoboda é também o Ocidente do país, tal como acontece com os outros partidos da oposição. No entanto, o confronto com Ianukovich é feito por razões bastante diferentes. Defensor da língua e da pátria ucraniana, o Svoboda critica a subserviência do poder em relação a Moscovo e o domínio dos oligarcas pró-russos. A cooperação com os outros partidos parece ser apenas circunstancial, o que será certamente fonte de vários problemas no futuro.

Sector Direito
Trata-se de um grupo sem qualquer filiação partidária, nascido no seio dos protestos, e que tem estado à frente dos confrontos mais violentos dos últimos meses, segundo vários correspondentes em Kiev. A entrada em cena do Praviy Sektor nos protestos coincidiu com a “transferência” do palco dos confrontos da Praça da Independência para a área perto do estádio do Dínamo de Kiev, na altura em que a violência subiu de tom.

Apesar da página do grupo na rede social de língua russa Vkontakte ter 100 mil apoiantes, no terreno o Sector Direito deverá contar com 300 membros, segundo a Reuters. O grupo tem uma ideologia pouco coerente, sendo a acção directa aquilo que define o Sector Direito.

Formado em grande parte por adeptos violentos de clubes de futebol – o nome “Sector Direito” está relacionado com uma zona dos estádios –, o grupo organiza-se através de milícias de autodefesa e são vistos em sessões de treino paramilitar em plena Praça da Independência.

O seu quartel-general era a Casa dos Sindicatos, entretanto incendiada durante os confrontos dos últimos dias. Ocupam, desde quarta-feira, o edifício central dos correios.

Causa Comum
Outro dos grupos formados durante os protestos. É menos violento do que o Sector Direito e os seus membros partilham uma ideologia nacionalista. Apresentam-se mais como um movimento social e foram notados pela permanente ocupação de edifícios.

Esse acto é visto pelos seus membros como “um acto de resistência”, que tentam sempre levar a cabo sem violência. Foram membros do Spilna Sprava que ocuparam o edifício do Ministério da Justiça, levando à primeira ameaça de declaração do estado de emergência no país.

Mais recentemente protagonizaram algumas cenas de violência contra outros manifestantes que os tentavam retirar do edifício do Ministério da Agricultura.

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