Pior a emenda do que o soneto

Recomendo que o PÚBLICO dê maior destaque aos esclarecimentos ou rectificações de assuntos de interesse público.

Sob este título um leitor mandou-me uma mensagem de discordância sobre o último texto que assinei neste espaço. Até agora tenho seguido o modelo de não identificar o nome do leitor, mas privilegiar o assunto levantado pelos leitores. Não será, portanto por hoje que vou fazê-lo. Tanto mais que, desta feita, a personagem em foco é o próprio provedor.

No texto da discordância, este intitulado, Títulos: "Da exactidão ao atraiçoamento", procurava eu discorrer sobre as condições exigidas para a construção de um título correcto que subordina um determinado conteúdo jornalístico. Um tema, aliás, clássico nas normas da escrita jornalística. Admitia que face a esta dificuldade era relativamente fácil resvalar entre a exactidão e a traição na correspondência que um título deveria ter face ao conteúdo.

Lembrado o tema do artigo que pode ser relido no blogue do provedor, a discordância manifestada pelo leitor não era sobre a matéria tratada referente à construção de títulos, mas sobre o motivo que provocara essa breve minha dissertação a propósito da feitura de títulos. A directora do PÚBLICO, com cópia enviada ao provedor, recebera do ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro, com a tutela da comunicação social, uma carta a anotar que o título que o jornal trazia na primeira página (edição de 02/02/2014) facilmente poderia ser confundido com declarações do próprio ministro, nunca feitas, na entrevista concedida ao PÚBLICO e publicada nesse mesmo número. O título rezava assim: “Governo manterá poder sobre conselho geral e administração da RTP.”

Ora, efectivamente, da análise que fiz sobre o eventual temor do ministro Poiares Maduro da atribuição de declarações que, na verdade, não fizera, na minha interpretação admiti e defendi que o referido título resumia tão-só uma posição clara do PÚBLICO, declarada particularmente no seu editorial desse dia: Não obstante a boa vontade e firme intenção do ministro, os novos dispositivos legais e contratuais não asseguravam a desejada desgovernamentalização da RTP. E se o PÚBLICO assumia, eu deduzia como clara, líquida e transparente essa posição.

Afinal era sobre esta minha posição que o leitor discordava. Com este reparo: “A sua posição no texto publicado hoje [domingo, 09/0/.2014] é tremendamente equívoca. (…) Olhe, devia começar o seu texto pela N.B. [esta N.B. era uma nota minha a discordar do pouco relevo dado pelo PÚBLICO no esclarecimento prestado], sob pena de também alinhar pelo bota-abaixo e tomar, sistematicamente, a posição da oposição (o que de resto confirma o que o PÚBLICO faz). Não me obrigue a deixar de comprar o jornal. Quando o provedor do Leitor é provedor do jornal está tudo estragado.”

Em correspondência particular já aferi com o respectivo leitor os nossos pontos de vista, obviamente diferenciados. Mas se trago este assunto a estas colunas é para aproveitar a oportunidade de declarar junto de todos os leitores do PÚBLICO: Efectivamente, sou provedor do Leitor e não do PÚBLICO, empresa jornalística e de informação. Mas nunca hesitarei em dar razão ao jornal, à sua direcção ou aos jornalistas quando ajuizar que a razão lhes assiste. E queria deixar bem claro que entendo que um jornal tem todo o direito de tomar as suas opções editoriais e de declará-las publicamente. Faz parte integrante do seu Estatuto. Da sua identidade. Da verdade com que deve lidar com os seus leitores. Da sua responsabilidade social.

Na defesa dos leitores e particularmente dos reclamantes sobre determinados conteúdos discordei e discordo de que cartas como esta do ministro Miguel Poiares Maduro sejam remetidas com breves esclarecimentos para a rubrica Cartas à Directora, ou até simplesmente para O PÚBLICO Errou, quando pela projecção do seu assunto deveriam ser tratadas com destaque proporcional ao texto, notícia ou reportagem que motivaram a reclamação. Eu sei que, no caso vertente, como em outros que já tenho constatado, as cartas enviadas à direcção, regra geral, não evocam o procedimento cometido ao “direito de resposta” que determina a publicação da resposta na “mesma secção, com o mesmo relevo e apresentação”. Portanto, não há nos casos de que me recordo e cujas cópias recebi, qualquer infracção por parte do PÚBLICO. Ora, exactamente, pelo sentimento que tenho verificado por parte desses reclamantes a pedir esclarecimentos sem apelar às disposições do direito de resposta, mas apenas uma manifestação de confiança no PÚBLICO com a certeza de que o jornal acolherá esses reparos ou pedidos de rectificação, é que defendo que o PÚBLICO não deve alienar essa confiança dos seus leitores. E por isso recomendo que o PÚBLICO dê maior destaque aos esclarecimentos ou rectificações de assuntos de interesse público.

 

JORNALISMO E POLÍTICAS PÚBLICAS

“A opinião pública é um ajuizamento formado e elaborado entre os que constituem o público e é sobre os assuntos públicos.”

John Dewey, 1927

“A ética não é apenas um meio directo de obter media de qualidade, mas, indirectamente, um meio para os profissionais conquistarem a confiança, isto é, o apoio do público.”

Claude-Jean Bertrand, 1997

“Os media não podem abdicar da sua responsabilidade nas políticas públicas.”

Rémy Rieffel,  2005

 

DO CORREIO DO LEITOR

Artigos sobre crianças

Um leitor, devidamente identificado, apresentou esta dúvida: "O PÚBLICO do dia 6 de Fevereiro traz dois artigos sobre crianças (…) que me deixaram baralhado. Não pela informação contida, mas pela falta de articulação entre ambos, aliás, assinados por jornalistas diferentes, Ana Dias Cordeiro e Rita Siza, respectivamente (…). Pela confusão que criam, fico sem saber se a comissão da ONU a que se referem é a mesma ou se são comissões diferentes."

ESCLARECIMENTO DAS EDITORAS DAS SECÇÕES PORTUGAL e MUNDO,respectivamente, Andreia Cunha Freitas e Joana Amado:

"A 65.ª sessão do Comité da ONU para os Direitos das Crianças divulgou, no dia 5 de Fevereiro, em Genebra, a sua avaliação a vários Estados, incluindo Portugal e o Vaticano. A situação concreta de cada um dos Estados foi objecto de um relatório separado relativo à realidade própria de cada um dos países: as análises e conclusões oferecidas em cada relatório não se referem às mesmas questões. São, portanto, dois relatórios distintos e não comparáveis entre si.

A opção editorial tomada foi a de separar em duas notícias, publicadas nas secções Portugal e Mundo, as avaliações, conclusões e recomendações do Comité da ONU, relativamente à situação (em termos de direitos das crianças) no nosso país e também no Vaticano, dado o manifesto interesse do assunto. Infelizmente, no trabalho final de edição faltou a remissão de uma página para a outra que teria deixado claro aos leitores que ambos os relatórios tinham sido divulgados no âmbito da mesma sessão de trabalho do Comité da ONU para os Direitos das Crianças."

ATENÇÃO: para o caso de Portugal o assunto era a preocupação da ONU com elevados níveis de privação das crianças. Para o caso do Vaticano era a questão da censura ao "código de silêncio" da Santa Sé sobre pedófilos e abusos sobre crianças.

 

 

 
 

   

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