Amianto mata 39 pessoas por ano em Portugal

Números colocam o país entre os que têm menor taxa de mortalidade por mesotelioma, o cancro causado pelo amianto.

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Enric Vives-Rubio /Arquivo

As doenças relacionadas com o amianto – utilizado em larga escala na construção civil e noutras aplicações até aos anos 1990 – mataram pelo menos 231 pessoas em Portugal entre 2007 e 2012, segundo dados da Direcção-Geral de Saúde.

Em média, houve 36 mortes por ano por mesotelioma, um cancro raro que está associado à inalação de fibras de amianto. Mais raras nas estatísticas oficiais são as mortes por asbestose, uma inflamação crónica dos pulmões também causada pelo amianto: cerca de três casos por ano, em média, no mesmo período.

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Portugal está longe dos países com maior taxa de mortalidade por amianto. No topo da lista está o Reino Unido, onde morreram em média 2286 pessoas vítimas de mesotelioma entre 2007 e 2011, segundo dados das autoridades britânicas de saúde. A taxa de mortalidade entre os homens em 2010 foi, no Reino Unido, de 6,2 mortes por 100.000 pessoas, segundo a Agência Internacional para Investigação sobre o Cancro, da Organização Mundial de Saúde. Na Alemanha foi de 2,7, no Japão de 1,6 e nos Estados Unidos de 1,3. Em Portugal, a taxa foi de 0,7 mortes em cada 100.000 homens. O mesotelioma representa cerca de 1% dos cancros do sistema respiratóprio no país.

As mortes de agora reflectem sobretudo casos de pessoas que foram expostas ao amianto na sua actividade profissional: operários de fábricas que processavam ou utilizavam amianto, construtores civis, electricistas, encanadores e outros. A doença normalmente surge 20 a 40 anos depois da exposição, daí que seja mais frequente em idosos.

Em Portugal, a idade média das pessoas que morreram de mesotelioma desde 2007 é de 68 anos. Mas há mortes em idades bem inferiores. O caso mais precoce refere-se a uma pessoa com 23 anos, segundo as estatísticas da Direcção-Geral de Saúde.

De acordo com a pneumologista Paula Alves Figueiredo, o mesotelioma pode-se manifestar mais cedo, quando se inalam quantidades muito grandes de fibras de amianto num espaço de tempo relativamente curto. Uma situação típica é a das demolições de edifícios que contenham materiais com amianto. A substância pode estar imobilizada em divisórias ou coberturas, por exemplo, mas é facilmente libertada para o ar à medida em que as paredes e tectos são destruídos. Um trabalhador sujeito várias vezes a esta contaminação tem um risco elevado de desenvolver a doença. “A exposição é tão intensa que o mesotelioma pode surgir mais rapidamente”, diz Paula Figueiredo, que integra a comissão de trabalho de oncologia da Sociedade Portuguesa de Pneumologia.

“No ano passado, tive três pacientes com menos de 30 anos”, conta a enfermeira Karen Selby, de uma organização norte-americana que presta apoio aos doentes com mesotelioma, a Asbestos.com. “É raro, mas infelizmente acontece”.

A doença é por vezes referida como uma bomba-relógio: como o período para que se manifeste é longo, é agora que os casos aparecem em maior quantidade. No Reino Unido, o número de mortes aumentou de 500 em 1980 para os cerca de 2300 actuais. A curva continuará a subir, mas espera-se que os números comecem a decrescer a partir de 2020, segundo a agência britânica de segurança no trabalho (Health and Safety Executive).

Um estudo do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) identificou 427 novos internamentos por mesotelioma nos hospitais portugueses entre 2000 e 2011. O número de novos casos por ano varia entre 26 e 52, mostrando um ligeira tendência de aumento. Há quatro casos em pessoas com 20 anos ou menos, duas das quais com até quatro anos.

A autora do estudo – a investigadora Mariana Neto, do Departamento de Epidemiologia do INSA – diz que os resultados confirmam a tendência de surgirem agora casos relacionados com pessoas que estiveram expostas ao amianto há 30 ou 40 anos. Mas chama a atenção para a possibilidade de haver outras fontes de exposição que não as mais óbvias, como a construção ou a indústria naval.

“O facto de 50% dos casos malignos terem ocorrido em pessoas com idades inferiores ou iguais a 65 anos e 3% em pessoas com idades inferiores ou iguais a 30 anos justifica a realização de um estudo mais profundo e detalhado, por poderem estar em casa fontes de exposição menos óbvias e mais actuais”, escreve a autora, no estudo publicado na revista Obervações-Boletim Epidemiológico, do INSA.

A pneumologista Paula Figueiredo diz que muitos pacientes que surgem com mesotelioma não se lembram de ter estado expostos ao amianto. E chama a atenção para o facto de os números estarem possivelmente sub-valorizados, porque a doença ou a causa de morte podem ser erroneamente associadas a outro tipo de cancro do pulmão. “É importante como se faz o diagnóstico”, avisa.

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