Michael Sam deu um passo para o desporto sair do armário mas o caminho será longo

A decisão daquele que pode ser o primeiro atleta gay de uma liga profissional norte-americana foi aplaudida dentro e fora do desporto. A homofobia está, contudo, ainda muito presente no mundo dos balneários.

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Michael Sam pode vir a ser o primeiro jogador da NFL assumidamente homossexual Denny Medley/USA Today

“Quero dizer abertamente ao mundo que sou homossexual.” As palavras de Michael Sam abalaram o mundo do desporto. O jovem de 24 anos pode ser o primeiro atleta profissional norte-americano a assumir a sua homossexualidade durante a carreira. Mas o exemplo de Sam representa também o ainda difícil caminho dos desportistas que “saem do armário”.

Em Maio, Michael Sam pode iniciar a primeira época na National Football League (NFL, a liga profissional de futebol americano), depois de ter concluído a sua carreira nas ligas universitárias, pela Universidade do Missouri.

O anúncio foi bem recebido pela comunidade desportiva norte-americana. A NFL aplaudiu “a honestidade e a coragem” de Sam, garantindo que “qualquer jogador com talento e determinação pode ter sucesso” no mundo profissional.

O ex-jogador que chegou a alcançar o Hall of Fame da NFL, Deion Sanders, afirmou que “Michael Sam não é o primeiro jogador gay na NFL, embora seja o primeiro a assumir-se”. “Vamos mostrar-lhe o amor como a um membro da família”, publicou Sanders através do Twitter.

E até o presidente dos EUA, Barack Obama, deu os parabéns a Michael Sam. “Isto é verdadeiro desportivismo”, escreveu Obama também pelo Twitter.

Até chegar à NFL, Sam ainda tem de ser escolhido através do processo de draft – durante o qual as equipas da liga escolhem os melhores jogadores das equipas universitárias.

“Se eu trabalhar arduamente, se eu fizer jogadas, é tudo o que deve contar”, afirmou Sam, durante uma entrevista à ESPN. No entanto, a realidade pode não ser assim tão simples.

Antes de dar a conhecer a sua orientação sexual, no domingo à noite, Sam estava na 90ª posição no ranking dos jogadores perfilados para o draft, segundo a CBS Sports, mas na manhã seguinte tinha descido para a posição 160. As escolhas das equipas profissionais são feitas ao longo de várias rondas e a queda de Michael Sam atirou-o para sétima ronda, dificultando a sua colocação.

A justificação foi dada por Rob Rang, um analista desportivo da CBS, que afirmou que o anúncio de Sam pode ser uma distracção passiva de receber grande atenção mediática. Mas o analista referiu ao site Yahoo! Sports ainda a baixa estatura do jogador.

A não colocação de Sam numa das equipas da NFL seria algo estranha, segundo os especialistas. O jogador venceu o Prémio de Defesa do Ano na Conferência Sudeste e nas últimas sete edições todos os anteriores vencedores foram colocados na primeira ronda.

Clube procura-se
Uma história semelhante ocorreu com Jason Collins, jogador da National Basketball Association (NBA, liga profissional de basquetebol), que assumiu a sua homossexualidade em Abril do ano passado e não conseguiu ser contratado por nenhuma equipa nesta época. O New York Times falou com Collins em Outubro, quando o início da temporada se aproximava e as expectativas já eram poucas.

Aos 34 anos, Collins já não era um dos jogadores mais apetecidos pela exigente NBA para além de que o seu salário base anual de 1,4 milhões de dólares (cerca de um milhão de euros) – valor mínimo presente na escala de pagamentos da liga para um jogador veterano – também era um entrave à sua contratação.

Mas a coincidência com a altura do anúncio deixa a porta aberta a outras conclusões. “Nunca se quer especular, não quero ir por aí”, disse na altura o atleta. “Acho que há jogadores na liga neste momento em relação aos quais, muito francamente, eu sou melhor”, afirmou ao NYT.

O comissário da NBA, David Stern, recusou que as decisões tomadas pelos clubes tenham origem em questões fora do desporto, mas um dirigente ouvido pelo NYT afirmou que “algumas equipas podem não querer lidar com as implicações mediáticas” da contratação de Collins.

Depois de 12 anos na liga de basquetebol mais competitiva do mundo, o atleta mantém o seu desejo: “Eu sou um jogador da NBA. Quero jogar na NBA. Tenho apenas de conseguir lidar com este teste, de ter paciência. Já lidei com coisas piores na vida.”

O trágico tabu
No mundo do desporto, o mais comum têm sido os atletas que assumem a sua orientação sexual após o fim da carreira. Foi o que aconteceu com o futebolista alemão Thomas Hitzlsperger no início de Janeiro. Internacional pela Alemanha por 52 vezes, o ex-jogador do Aston Villa e do West Ham foi um dos mais relevantes futebolistas a assumir a homossexualidade.

Hitzlsperger justificou a decisão de anunciar apenas depois do fim da carreira por se ter apercebido apenas “nos últimos anos” que “preferia viver com outro homem”. Para além disso, o futebolista reconheceu que a homossexualidade ainda é um assunto tabu no futebol.

“Imaginem 20 homens sentados a uma mesa a beber. Tem de se deixar a maioria ser como é, enquanto as anedotas ainda têm piada e as conversas sobre homossexualidade não se tornam demasiado insultuosas”, afirmou o jogador na altura.

Outro exemplo no futebol inglês foi o de Justin Fashanu que em 1990 anunciou publicamente que era gay, ainda durante a sua carreira. Oito anos mais tarde acabaria por se suicidar.

Actualmente, a Justin Campaign é uma organização que surgiu dez anos depois da morte de Fashanu e que pretende chamar a atenção para a homofobia que ainda é “altamente prevalente tanto no futebol profissional como no de base”, segundo o site da instituição.

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