Os cegos e os angustiados

Primeiro balanço do concurso de Berlim: Blind Massage, do chinês Lou Ye, e Historia del Miedo, do argentino Benjamín Naishtat, partem à cabeça do pelotão.

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Blind Message é um filme-mosaico de vidas que se cruzam numa clínica de massagens de Nanqing cujo staff é inteiramente cego DR

Do que se viu até agora, à frente do pelotão vai o realizador chinês Lou Ye com o seu Blind Massage (ao qual voltaremos em mais detalhe), atento filme-mosaico de vidas que se cruzam numa clínica de massagens de Nanqing cujo staff é inteiramente cego. É uma espécie de mini-Magnolia de amores e decepções na China moderna, ancorada na câmara nervosa de Zeng Jian e na partitura evocativa de Jóhann Jóhannsson.

Logo a seguir classificaríamos Historia del Miedo, estreia na longa do argentino Benjamín Naishtat, e formalmente o título mais fascinante até agora mostrado a concurso. Naishtat tem trabalhado nas curtas e no cinema experimental e o seu filme, mais do que uma narrativa articulada, é um ambiente de angústia surda impecavelmente construído sobre um andaime de luta de classes sociais, contrapondo os habitantes de um condomínio fechado de luxo de Buenos Aires e os seus empregados. É o tipo de filme que Berlim costuma cantonar no prémio artístico Alfred Bauer (como fez antes com Miguel Gomes ou Denis Côté).

Já tivemos oportunidade de falar do solidíssimo filme britânico '71 de Yann Demange, e da sua abordagem desencantada e eficaz ao conflito da Irlanda da Norte ambientada em 1971. Escrito por Gregory Burke, o dramaturgo responsável pela aclamada peça teatral ambientada no Afeganistão Black Watch, '71 é propulsionado por uma formidável primeira meia-hora mas não sustenta o embalo até ao final.

Para esquecer: Die geliebten Schwestern, do veterano alemão Dominik Graf, interminável telefilme de prestígio a fingir-se cinema sobre a relação entre as irmãs Langefeld e o poeta Schiller em finais do século XVIII; e Two Men in Town, onde o franco-argelino Rachid Bouchareb transpõe um velho filme de José Giovanni com Alain Delon para a fronteira americana com o Novo México. Apesar de Forest Whitaker, Harvey Keitel e de uma Brenda Blethyn que faz o que pode com um papel ingrato, é mais uma prova de que a vontade francesa de filmar "à americana" raramente sobrevive à travessia do Atlântico.

Finalmente, Jack, de Edward Berger, tem o seu interesse, mas já vimos esta crónica da infância desvalida (sobre um miúdo de dez anos que toma conta de si próprio e do irmão ainda menino enquanto a mãe desaparece para se ir divertir) em Hirokazu Kore-eda ou Ursula Meier, melhor contada e mais convincente. Berger é muito bom a dirigir os miúdos, mas Jack nunca se distancia dos modelos e nunca descola verdadeiramente.

Nos próximos episódios: Alain Resnais, Richard Linklater, Celina Murga e Claudia Llosa.

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