Colecção Miró ainda está em Londres e Parvalorem espera contacto da leiloeira

Governo espera pelo regresso das obras para poder iniciar um novo processo de alienação. Procuradora-geral da República defende que as obras devem ficar em Portugal.

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No momento em que a venda foi anulada, as obras foram retiradas de vista e guardadas, mantendo-se até hoje à guarda da Christie’s. REUTERS/Suzanne Plunkett

Depois de ter anulado a venda das 85 obras de Joan Miró, herdadas pelo Estado aquando da nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN), a Christie’s continua com a colecção na sua posse, sem ter feito ainda um contacto formal com a Parvolorem ou o com o Governo Português.

Ainda é prematuro falar sobre a realização de um novo leilão desta colecção quando a Christie’s e a Parvalorem (sociedade criada no âmbito do Ministério das Finanças para recuperar créditos do BPN e assim proprietária das obras) ainda não falaram formalmente sobre o que realmente aconteceu esta semana. Ao PÚBLICO, Francisco Nogueira Leite, presidente do conselho de administração da Parvalorem, explicou que o contacto por parte da Christie’s “é indispensável para as partes acordarem a evolução e a solução” para este “problema”.

Apesar destas obras não terem chegado a ser vendidas, a Chrisitie’s manteve o leilão The Art of Surreal agendado, levando à praça outras peças – motivo que ocupou a leiloeira nestes últimos dois dias. Espera-se agora que a leiloeira internacional, que já mostrou vontade em marcar um novo leilão, entre em contacto com a Parvalorem. Até agora, existiu apenas um “contacto verbal” entre os advogados de ambas as partes terça-feira, dia em que a Christie’s cancelou a venda por falta de segurança, depois de conhecidas as ilegalidades no processo de expedição das obras.

No momento em que a venda foi anulada, as obras foram retiradas de vista e guardadas, mantendo-se até hoje à guarda da Christie’s. Estarão embaladas em segurança nas instalações da leiloeira. Esta é uma questão que, para o presidente da Parvalorem, tem de ser “imediatamente resolvida”. O objectivo é que as obras regressem a Portugal para que depois se inicie então um novo processo de alienação – desta vez seguindo todos os procedimentos legais.

Ainda anteontem, o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho garantiu que a decisão está tomada e que a venda desta colecção que percorre a vida artística do catalão é a única possibilidade para este Governo. A manutenção destas obras em Portugal não é nem será uma hipótese. A menos que o Tribunal impeça a sua venda, uma vez que correm ainda duas providências cautelares no Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa (TACL).

Esta foi aliás a vontade demonstrada pela procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, em entrevista à RTP1, onde defendeu que esta colecção é “um acervo que não deve sair do património cultural do país”. E justificou as duas acções até agora interpostas pelo Ministério Público (MP) como uma “obrigação” deste organismo.

As duas acções foram apresentadas no início desta semana, segunda e terça-feira, na sequência da iniciativa lançada por cinco deputados do PS, entre eles a ex-ministra da Cultura do governo socialista, Gabriela Canavilhas. A primeira pretendia impedir a venda dos quadros no leilão – tendo dado luz verde à venda mas detectado ilegalidades no processo – e a segunda visa directamente a ministra das Finanças, o secretário de Estado da Cultura e a própria Christie’s, alegadamente responsáveis pelas ilegalidades no processo que permitiu a saída das obras do nosso país.

O facto de a juíza do TACL, Guida Jorge, não ter deferido a primeira providência cautelar – decisão que, no entanto, não viabilizou na prática a venda das obras, já que a Christie’s decidiu retirá-las do leilão –, não significa que o processo tenha ficado concluído.

Joana Marques Vidal explicou, na RTP, que “as providências cautelares são procedimentos jurídicos que antecedem uma acção principal”. E admitiu mesmo como “natural” que o MP venha a interpor novas acções, "tanto num caso como no outro”.

Em última análise, o objectivo do MP, notou a procuradora-geral da República, é que o tribunal, pelos seus meios próprios, evite a saída do país de um património cultural que foi avaliado pela Christie’s em 35 milhões de euros.

Apesar destes dois processos, Francisco Nogueira Leite garante que “em matéria de responsabilidades a Parvalorem está confortável”, defendendo-se novamente com o contrato celebrado com a leiloeira, no qual terá ficado acordado que seria esta a tratar de todas as diligências para a realização do leilão. O responsável da Parvalorem não põe no entanto em causa do trabalho da Christie’s, lembrando que se trata de uma leiloeira prestigiada e cumpridora.

Sobre o possível pagamento de uma indemnização à Christie’s pelo cancelamento da venda, Nogueira Leite garantiu que o pagamento desta não está previsto, uma vez que foi a própria leiloeira a cancelar o processo.

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