Algumas freguesias de Lisboa rejeitam competências e criticam falta de verbas e de informação

A Assembleia Municipal de Lisboa discute esta terça-feira a transferência de competências e de trabalhadores da câmara para as 24 freguesias da capital.

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Há autarcas, incluindo do PS, que constam a forma como o processo tem sido conduzido na câmara Rui Gaudêncio

Ao contrário do que afirmam António Costa e a vereadora da Inovação e Modernização Administrativa, há presidentes de junta de freguesia que não querem receber alguns dos equipamentos, vias e espaços verdes que a Câmara de Lisboa lhes pretende entregar.

Há também autarcas, incluindo do PS, que se queixam de falta de informação ou que consideram insuficientes as verbas que lhes foram destinadas no âmbito do processo de reorganização administrativa em curso.

As posições desses autarcas constam de pareceres que foram enviados por alguns dos presidentes de junta de freguesia da capital, no início de Janeiro, à Comissão Permanente de Descentralização e Obras Municipais da Assembleia Municipal de Lisboa (designada por 5.ª comissão). Dos 24 autarcas eleitos no final de Setembro houve nove (das freguesias de Ajuda, Alcântara, Areeiro, Belém, Olivais, Parque das Nações, Santa Clara, Santo António e São Vicente) que não se pronunciaram sobre nenhuma das duas propostas da Câmara de Lisboa, relativas à descentralização de competências e à transferência de recursos humanos. 

Estas propostas vão ser discutidas esta terça-feira, a partir das 15h, na assembleia municipal, já depois de terem sido alteradas “na sequência das recomendações vertidas em relatório da 5.ª Comissão [...] e das negociações mantidas com os sindicatos representativos dos trabalhadores do município de Lisboa”. As alterações em causa não satisfazem o Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, que agendaram para as 14h um plenário “contra a transferência coerciva de funcionários para as Juntas de Freguesia”.

Reuniões pouco esclarecedoras
Em Dezembro de 2013, tanto o presidente da Câmara de Lisboa como a vereadora Graça Fonseca afirmaram em reuniões camarárias que nenhum presidente de junta tinha rejeitado receber competências ou equipamentos, acrescentando que tinha até havido autarcas a manifestar interesse em assumir responsabilidades além daquelas que estavam previstas. Mas nos pareceres enviados à Assembleia Municipal, há exemplos de ambas as situações.

Pedro Cegonho (PS), por exemplo, entende que a gestão e a manutenção do Mercado de Campo de Ourique devem passar da câmara para a junta de freguesia a que preside, ao contrário do que está previsto. Já Hugo Xambre Pereira (PS), presidente da junta do Beato, afirma que devem ser considerados estruturantes (e portanto permanecer sob a alçada do município) a Rua Gualdim Pais, a Estrada de Chelas e o Mercado da Picheleira, este último “pelas obras profundas e estruturais de que necessita”.

Por sua vez, o presidente da junta de Carnide diz que os encontros promovidos pela câmara para discutir esta matéria “foram pouco esclarecedores e manifestamente insuficientes” e garante que sempre exprimiu “total discordância com algumas áreas ou equipamentos a transferir”. Como exemplos de competências que não quer assumir, Fábio Sousa (CDU) aponta o Complexo Desportivo do Bairro Padre Cruz, os pavimentos da zona antiga do mesmo bairro, a Biblioteca Municipal Natália Correia e os espaços verdes de dois bairros municipais da freguesia. 

Já o presidente da junta de São Domingos de Benfica quer que o município continue responsável pela Rua Conde de Almoster, pela Avenida Carolina Michaelis e pelo Parque Bensaúde. Por outro lado, José Cardoso (PS) pretende que a câmara lhe entregue o Palácio Beau Séjour, para lá instalar a sede da freguesia.

Em vários dos pareceres entregues à assembleia municipal há presidentes de junta a defender que são insuficientes os montantes que lhes foram destinados. “As verbas previstas pela Lei n.º 56/2012 não prevêem algumas das competências que a Câmara de Lisboa quer transferir para as juntas de freguesia”, alerta Hugo Xambre, do Beato.

Por sua vez, Fábio Sousa, de Carnide, nota que “nunca foram apresentados os mapas que justificam as verbas a transferir” e pergunta “porque é que há juntas de freguesia a receber quase cinco milhões e outras pouco mais de um milhão”. Também Luís Newton (PSD), presidente da Junta de Freguesia da Estrela, critica a “falta de informação sobre os valores que serão transferidos”.

No caso de Campolide,o autarca diz não dispor de “dados e informação suficientes” para elaborar um parecer. “Falta-nos quase toda a informação financeira e de recursos humanos”, afirma André Couto (PS), acrescentando que “um parecer nesse campo seria mera astrologia feita por leigos desconhecedores dessa ciência”.

Trabalhadores das juntas
Na proposta referente à transição de recursos humanos da Câmara de Lisboa para as juntas de freguesia que foi aprovada pelo município em Dezembro de 2013, dizia-se que os trabalhadores que fossem transferidos manteriam um conjunto de direitos de que hoje usufruem, como o acesso aos refeitórios, unidades de educação e medicina do trabalho, bem como aos serviços sociais. Na versão que vai ser discutida pela assembleia municipal esta terça-feira foi introduzida uma modificação, para que também os actuais funcionários das juntas possam vir a usufruir desses direitos, ao contrário do que agora acontece.

A possibilidade de virem a ser criadas desigualdades entre os antigos e os novos funcionários das freguesias tinha sido levantada por vários deputados municipais e por representantes dos sindicatos, no decurso dos trabalhos da 5.ª Comissão da assembleia. “A coexistência de trabalhadores com diferentes regimes de prestação de trabalho e diversos direitos e regalias pode vir a constituir um grande entrave à boa gestão de recursos humanos”, alertou Maria Elisa Carvalho (PS), presidente da Junta de Freguesia da Penha de França. Também Inês Drummond (PS), de Benfica, salientou a importância da “manutenção do equilíbrio”.

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