Martifer admite transferir trabalho de Viana do Castelo para Aveiro se houver problemas

Gestor da concessionária admitiu que foi contactado pelo Governo antes do concurso. "Nunca imaginámos que ficássemos sózinhos", disse.

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O presidente da Empordef (à esquerda) assinou o contrato com o gestor da Martifer, Carlos Martins (ao centro) Rui Gaudêncio

A West Sea, empresa do grupo Martifer que ontem assinou com o Estado o contrato de subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENCV), admite transferir trabalho destas instalações para Aveiro caso se lhe deparem dificuldades.

Quem o afirmou foi Carlos Martins, presidente da Martifer, no final da cerimónia que decorreu ao fim da manhã no Forte de São Julião da Barra, em Oeiras.

“Vamos entrar nos estaleiros de forma pacífica, vamos para lá de boa vontade”, disse o responsável da West Sea. “Temos o direito de entrar no que é nosso, não vamos desistir. Se isto caísse tudo, com algum investimento íamos para Aveiro”, anunciou. Aliás, Carlos Martins revelou a existência de complementaridade das instalações da Navalria de Aveiro, com a ENVC.

As dificuldades a que se referia o novo homem forte dos estaleiros de Viana do Castelo são a não resolução dos vínculos contratuais, ou seja, a aceitação pelos 609 trabalhadores do estaleiro minhoto das indemnizações por despedimento a que o Estado se comprometeu e para as quais reservou 31 milhões de euros. Recorde-se que 230 dos operários passam directamente à reforma com direito a indemnização. “Se o Estado não cumprir o contrato, é um problema do Estado”, disse, para de seguida se mostrar confiante: “O Estado é uma pessoa de bem.”

Nos planos da empresa está o recrutamento ao longo deste ano de 400 trabalhadores, a maioria oriundos dos ENVC. “A partir de hoje já estamos a recrutar”, anunciou, revelando terem sido feitas duas contratações. Quanto às condições contratuais, admitiu que os salários propostos são idênticos aos até agora auferidos, que classificou como “um pouco abaixo do mercado”. Já diferentes serão as regalias. Disse, sem especificar, “que serão iguais às praticadas no universo da Martifer”.

Quanto à carga de trabalho que procura para os ENVC, Carlos Martins centrou o foco nas plataformas de off-shore para a exploração petrolífera e de gás. “A partir de agora só depende de nós”, insistiu. Admitiu, também, o interesse por navios de protecção de costa para aproveitar o know how e, “com o apoio da Armada portuguesa vender navios de patrulha oceânica a outros países”. Recorda-se que por decisão do actual ministro da Defesa Nacional, José Pedro Aguiar-Branco, foram retiradas aos ENVC as encomendas de oito patrulhas oceânicos e de oito lanchas de fiscalização costeira. Um cancelamento justificado por necessidades orçamentais. Ou seja, medidas de austeridade.

“Nós fomos a esta concessão porque quisemos”, afirmou o gestor. “É evidente que nós fomos contactados por este Governo a perguntar se queríamos ir, mas nunca imaginámos que ficássemos sozinhos”, admitiu. E reiterou: “Este activo (Estaleiros Navais de Viana do Castelo) é importante para a nova estratégia da Martifer.” Sobre a actividade da sua empresa nos últimos anos, o responsável reconheceu dificuldades: “A Martifer teve quatro anos muito difíceis na Península Ibérica, tivemos de ir à procura de novos mercados. Esperamos que nos próximos anos as coisas voltem ao que foram”.

Ao concluir a sua intervenção, antes do acto de assinatura do acordo de subconcessão, Carlos Martins mostrou-se surpreendido pelas reacções à entrada da sua empresa nos ENVC: “Nunca imaginei que tanta coisa se escrevesse e se dissesse”. E fez uma profecia: “Que não sejam precisos cinco anos para concluir que valeu a pena.”

O ministro da Defesa Nacional também manifestou mal-estar pelas reacções provocadas pelo negócio: “Nas últimas semanas foram ditas as coisas mais absurdas sobre este processo.” Sobre as críticas da oposição ripostou que “há quem esteja sempre à procura de problemas; nós, o governo, de soluções”.

E, segundo Aguiar-Branco, o contrato ontem assinado foi a solução.

Fez um vasto elenco: “O Estado não tem de saber construir navios. Tal como não tem de produzir cervejas e, por isso, privatizou a UNICER na década de 80. Não tem de saber prestar serviços de telecomunicações  e, por isso, privatizou a Portugal Telecom nos anos 90. Não tem de saber reparar aviões e, por isso, privatizou as OGMA (Oficinas Gerais de Material Aeronáutico) em 2004”. Sobre os estaleiros de Viana do Castelo admitiu uma nuance – “a reprivatização não foi possível por condições alheias à vontade do Governo” -, mas concluiu no mesmo tom: “O Estado foi o problema.”

E, com estas premissas, definiu a nova situação: “É por isso que esta subconcessão é, também, uma opção ideológica.” Porque, afirmou, os ENVC “são um exemplo do Estado como gestor, do falhanço de um modelo ideológico”.

No seu discurso, o ministro referiu o custo dos estaleiros para os contribuintes e destacou que lá “estavam 600 trabalhadores sem trabalho para realizar.” Mostrou-se nada preocupado com a providência cautelar anunciada por uma acção popular a que se admite associar a Camara de Viana do Castelo: “Estamos 100% confiantes de que não há ilegalidade, irregularidade e, muito menos, de incidência criminal, pois cumprimos todas as regras”. Fez votos de sucesso para a West Sea: “Que saiba explorar o potencial daquela infra-estrutura física e dos recursos humanos que vier a contratar.”

 
 
 
 
 

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