De onde saíram estas ondas destruidoras?

Nível do mar acima do habitual, persistência da tempestade e ondas que, além de altas, são de longa duração resultam na conjugação de factores que explica o potencial destrutivo das ondas que têm assolado a costa portuguesa.

Imagens do mau tempo e dos estragos na zona Norte, em Matosinhos, Porto e Gaia
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Imagens do mau tempo e dos estragos na zona Norte, em Matosinhos, Porto e Gaia Paulo Pimenta
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Mais de uma dezena de quilómetros de passadiços ficaram destruídos na zona Norte Paulo Pimenta
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As imagens de ondas "gigantes" a galgarem areais rumo às ruas em várias cidades impressionam. Mas os estragos provocados pela tempestade que nos últimos dias assolou a costa portuguesa não podem ser justificados apenas pela altura das vagas, que até tem sido idêntica aos máximos que costumam ser registados nesta altura do ano, em vários pontos do país.

Segundo o especialista em Hidráulica Costeira Fernando Veloso Gomes, o problema é que, para além de altas, estas ondas têm um período (duração) bem mais longo do que noutros temporais de Inverno, e cavalgam sobre um mar com um nível de água um metro, metro e meio, acima do previsto.

O azar de muitos proprietários de bares de apoio e restaurantes – como o famoso Shis, na praia do Ourigo, no Porto, cuja estrutura ficou espalhada por mais de uma centena de metros na areia – é que esta ondulação de características anormais tinha uma orientação noroeste–sudeste rondando para este, ainda antes de chegar à praia, apanhando estas estruturas de frente. Em todo o caso, nota o docente da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, dada a orientação predominante das estruturas de defesa da costa, se esta tempestade viesse acompanhada de ondas de sudoeste, o efeito deste fluxo de água no interior dos portos poderia ter sido pior para as embarcações atracadas e outras estruturas.

Na segunda-feira, os ondógrafos de Leixões e Sines mediram a passagem de ondas de 13,5  e 15 metros, respectivamente. Nada que não tenha acontecido noutros anos, nota Veloso Gomes, valorizando outros dados. Segundo o investigador, num temporal “normal” de Inverno, a duração de uma onda, medida pelo seu período, ronda os 10 a 12 segundos. Anteontem, algumas tinham períodos superiores a 25 segundos. “Vimos pessoas nos vídeos online a falar em tsnunami e, embora não seja comparável, há aqui um paralelo com as ondas de longos períodos que caracterizam esses fenómenos”, explica o académico, lembrando que estas avançam costa adentro, não em altura, mas em extensão, como se viu no Porto ou na Póvoa de Varzim, onde o mar venceu o extenso areal para dar outro significado ao nome da Avenida dos Banhos.

A perspectiva de Veloso Gomes é corroborada pelo tenente Quaresma dos Santos, da Divisão de Oceanografia do Instituto Hidrográfico. E ambos acrescentam ao menu deste cocktail explosivo a chamada "maré meteorológica" (condicionada por outros factores, como as baixas pressões e o vento), que pôs o nível do mar um metro, metro e meio, acima do expectável. O que ajuda a estender as ondas praia acima e, com a força que traziam, a torná-las capazes de galgarem quebra-mares e outras estruturas, como os muros nas marginais, com os efeitos visíveis um pouco por todo o país. O efeito foi potenciado também pelo “empilhamento da massa de água junto à costa”, por força dos ventos de sudoeste dos últimos dias.

Esta terça-feira chegou a ser aventada a hipótese, citando informações do Instituto Hidrográfico, de que o país poderia vir a ser fustigado já na próxima semana por uma tempestade marítima semelhante à dos últimos dias. Mas Quaresma dos Santos garante que as previsões que este organismo tem em mãos, para os próximos 13 dias, não só não apontam para este cenário como, pelo contrário, deixam antever uma diminuição da altura das ondas para metade.

Em todo o caso, estes especialistas alertam que tempestades como esta sempre existiram – com uma periodicidade média larga, é certo – e que o que acontece é que, mais do que a sua intensidade, são os estragos que causam que nos impressionam cada vez mais. Mas isso, notam ambos, decorre da ocupação de cada vez mais espaço junto ao mar com estruturas – quase todas elas de lazer e restauração – que acabam por ser muito danificadas ou destruídas por estes temporais. No caso dos bares e restaurantes, Veloso Gomes tem uma opinião: “Se os queremos lá, que as vistas são bonitas, que estejam – desde que não seja o contribuinte a pagar a sua reposição”.

“As pessoas têm de ter a noção e que estamos numa costa atlântica, que pode ser muito energética”, vinca o especialista do Instituto Hidrográfico, num alerta à população. Veloso Gomes diz que não se podem pôr fitas a impedir o acesso das pessoas a todo o lado onde haja risco, mas acentua a necessidade de as educar para o risco que o mar representa. “Felizmente, não tivemos mortos”, afirma, assinalando o contraste com o que aconteceu na Galiza (três vítimas) e em França (uma). Mas, por outro lado, vinca que só por sorte, e intervenção das autoridades e meios de socorro, isso não aconteceu no Algarve, com os 12 jovens búlgaros, vindos de um país onde não existem estes fenómenos, que se lembraram de ir ao banho no mar.

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