Mãe, pai, vou estudar para o interior!

Claro que há um preço a pagar por estudar no interior. É mesmo na grande cidade que tudo acontece

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r2hox/Flickr

Boa parte da minha família mais próxima é de Idanha a Nova, no coração da Beira Baixa. Já os meus pais assentaram arraiais junto ao mar, às portas de Lisboa. Mas desde que me lembro que todos os anos, seja no Carnaval, na Páscoa, ou no Verão, lá vamos nós a caminho da santa terrinha — haverá expressão mais provinciana para definir uma aldeia afastada das cidades? — para, por uns dias, desligarmo-nos do rebuliço e da confusão que é a capital. Esta vivência permitiu-me conhecer de forma privilegiada uma região massacrada pela interioridade que teima em reinar num país que é, todo ele, uma assimetria.

Numa altura em que cada vez mais pessoas abandonam o interior para procurarem uma vida melhor junto ao litoral ou, mais recentemente, no estrangeiro, sinto que tenho vindo a remar contra a maré, ao ter optado por continuar os estudos no interior do país. É certo que uma decisão destas não é tomada da noite para o dia. Se a média dos exames nacionais tivesse sido mais alta, se a vontade de sair da chamada zona de conforto não fosse tão expressiva, se a curiosidade de conhecer realidades diferentes das que estamos desde sempre habituados fosse nula, este texto não existiria. Em vez de estar a pensar se amanhã o tempo estaria bom para fazer um piquenique no campo a seguir às aulas, estaria a pensar como chegar à faculdade com mais uma greve de transportes agendada.

Se ontem morava junto a Lisboa e hoje moro na Covilhã, a isso se deve também o tal conhecimento privilegiado da região. Com o tempo ganhei ainda uma paixão pelo interior do país. Pela calma e pelo sossego que transmite, pela beleza que muitas vezes não existe no litoral, pelas gentes bem mais hospitaleiras. É tudo mais genuíno. Simples, belo e... genuíno.

Claro que há um preço a pagar por estudar no interior, e aqui entra novamente o problema da interioridade. É mesmo na grande cidade que tudo acontece. É possível fazer um roteiro diferente todos os dias. Um dia uma exposição, outro dia um concerto. Numa noite uma ida a um bar, noutra noite uma ida a uma discoteca. Aqui a música é outra. Apesar de ser um meio universitário, contam-se pelos dedos os dias em que há eventos especiais e, à noite, as saídas resumem-se àquele bar ou àquela discoteca. É difícil compreender como é que num meio com tanto potencial exista tanto medo de arriscar, de abrir algo novo, de investir em mais divertimento, em mais cultura, em mais ócio.

Ainda assim, e fazendo uso do conhecido provérbio “quem não tem cão caça com gato”, até a falta do que fazer pode ser algo positivo. Aqui, todos moramos perto uns dos outros. Sucedem-se as jantaradas, os cafés, ou as sessões de cinema em casa deste ou daquela. É certo que não é fácil atrair pessoas que, chegadas à universidade, morram de amores por este estilo de vida. A Covilhã já demoveu muitos futuros licenciados e continuará a demover, pelo menos enquanto não se assumir como verdadeira cidade académica.

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