Ana Gomes coloca comissário europeu contra Aguiar-Branco

Eurodeputada apresentou queixa-crime contra incertos na Procuradoria-Geral da República e solicitou à Comissão Europeia que suspenda subconcessão dos Estaleiros de Viana à Martifer.

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Almunia confirmou que o empréstimo será supervisionado pela troika Foto: Sebastien Pirlet/ Reuters

Para lá da queixa-crime entregue na Procuradoria-Geral da República e o pedido à Comissão Europeia para que suspenda o processo de subconcessão dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo (ENVC), o que resultou da iniciativa desta sexta-feira da eurodeputada socialista Ana Gomes foi o desafio feito ao ministro da Defesa, Aguiar-Branco, através da figura do comissário europeu para a Concorrência, Joaquín Almunia.

Numa conferência organizada em Lisboa, a eurodeputada deu conta de uma reunião com o responsável europeu, a 11 de Dezembro, em Estrasburgo, onde este se mostrou “surpreendido” por o “Governo nunca ter invocado junto da Comissão Europeia o facto de os ENVC construírem navios para a Marinha Portuguesa”. Facto relevante, acrescentou, uma vez que tal “poderia justificar transferências financeiras do Estado para os ENVC”.

Em causa estão as alegadas ajudas estatais ilegais aos estaleiros, detectadas pela CE, e que segundo o ministro fizeram travar a reprivatização e avançar para a solução de subconcessão para a Martifer. Para Ana Gomes, esta é um indício de que os interesses portugueses não estavam a ser devidamente defendidos pelo Governo. Lembrou que fora esse o argumento que “permitira a continuação da laboração dos Estaleiros Navantia, na Galiza, Espanha, também alvo de investigação [europeia] por ajudas do Estado”.

A acusação a Aguiar-Branco de falta de empenho para encontrar uma solução para os ENVC foi ainda sustentada com outros argumentos – nomeadamente, por não ter sido apresentado um plano de reestruturação da empresa, ou classificado a mesma como uma empresa em dificuldades. Isso levou Ana Gomes a concluir que Aguiar-Branco se decidiu pela extinção dos Estaleiros “porque quer e porque nunca quis reestruturar”.

A ex-diplomata acusou ainda o ministro da Defesa de se “desculpar com Bruxelas artificiosamente”, acrescentando  que a Comissão “não queria abrir um processo a Portugal”. Apresentou mesmo “avenidas de saída” para Portugal justificar as ajudas estatais nos documentos que produziu sobre o assunto. Essas pistas eram declarar a empresa em dificuldades ou então avançar com um processo de reestruturação.

Esta foi uma das razões que a levaram a agir contra o ministro: “Fui hoje recebida pela procuradora-geral da República [Joana Marques Vidal], às 15h00, a quem deixei a queixa-crime contra incertos, e entreguei uma participação também junto da Comissão Europeia.”

Justificou a acção judicial com a suspeita de que teria “havido violação de normas que, no Código Penal, punem a corrupção, tráfico de influência, abuso de poder e favorecimento de interesses privados”.

E a participação à Comissão Europeia foi feita com o argumento de ter detectado uma “clara ligação entre as contrapartidas no processo dos submarinos [para a Marinha Portuguesa] com o processo de subconcessão”.

Na conferência de imprensa, Ana Gomes enumerou os dados que considerou indiciarem condutas menos próprias no processo. A saber, o papel do banco BES na escolha da Martifer para ficar com a actividade, que esteve também ligado ao processo de aquisição dos submarinos, e ainda a ligação do escritório de advogados do actual ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, com o Grupo Espírito Santo. A eurodeputada salientou que "a sociedade de advogados JPAB & Associados tem intensas, extensas e históricas relações com o GES – Grupo Espírito Santo", que, por seu turno, "tem um amplo historial de relações e apoios às empresas do universo Martifer".

Recuperou o caderno de encargos e o processo de concurso para a subconcessão dos ENVC para destacar "que a quem é pedido os esclarecimentos e quem é suposto fornecer esses esclarecimentos são dois funcionários do [grupo] BES, do BESI [BES Investimento]": "O BESI foi contratado para a assessoria financeira do concurso. Ora, eu noto que essa é uma semelhança com o concurso dos submarinos e das contrapartidas, em que o BES assessorava o Governo e assessorava o consórcio [alemão] vendedor e naturalmente que me interrogo sobre as ligações, conhecidas e históricas, do escritório de advogados de que o ministro [Aguiar-Branco] é sócio e do BES."

Para Ana Gomes, "só esse facto, já seria mais do que suficiente para [a] inquietar sobre a lisura deste processo". E finalizou: "Como é que o Governo português contrata para uma assessoria financeira um banco que está a ser investigado pela PGR, justamente no caso dos submarinos? E que está envolvido no processo, no mínimo, nebuloso, relativamente aos submarinos e às contrapartidas?"

Para a eurodeputada, a subconcessão é "altamente lesiva para os interesses nacionais e porque estão em causa os empregos de 608 trabalhadores que o ministro ameaça, no fim do ano, condenar ao despedimento colectivo".
 
 
 
 

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