Governo desistiu de abrir loja do cidadão no Terreiro do Paço para substituir a dos Restauradores

O espaço previsto para a estação fluvial do Terreiro do Paço já não vai abrir e os utentes da loja dos Restauradores, que fechará a 31 de Dezembro, terão de engrossar as filas das lojas das Laranjeiras e Marvila.

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Árvore de Natal da Câmara vai voltar a ser montada no Terreiro do Paço Helena Colaço Salazar/Arquivo

Que a Loja do Cidadão dos Restauradores, em Lisboa, tinha os dias contados já se sabia há muito, mas o anúncio de que o seu encerramento vai acontecer no dia 31 de Dezembro trouxe uma novidade: a de que o Governo desistiu de abrir uma nova loja do cidadão no Terreiro do Paço.

Maria Manuela Leitão Marques, ex-secretária de Estado da Modernização Administrativa do PS, critica o fecho daquele equipamento sem a criação de uma alternativa e diz que "os portugueses não podem dormir descansados se querem continuar a ter lojas do cidadão".

Foi o Sindicato dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais do Sul e Regiões Autónomas quem fez chegar à comunicação social a informação de que a Loja do Cidadão dos Restauradores vai fechar as portas no último dia deste ano. Em comunicado, o sindicato insurgiu-se contra essa medida do Governo, comentando que é assim que este faz a reforma do Estado, "lesando os utentes e os trabalhadores".

Mas aquilo que o sindicato não sabia é que o Governo desistiu de abrir uma loja do cidadão no terminal fluvial do Terreiro do Paço, intenção que tinha sido anunciada em meados de 2012. Segundo foi dito na altura, o novo equipamento teria 150 metros quadrados (área que contrasta com os 1400 metros quadrados dos Restauradores) e seria uma loja de segunda geração, com um balcão multiusos no qual seria possível tratar de vários assuntos.

A notícia da desistência foi transmitida nesta quinta-feira ao PÚBLICO, através da assessoria de imprensa do secretário de Estado para a Modernização Administrativa, João Pedro Cardoso da Costa. "Não irá abrir uma nova loja do cidadão no terminal fluvial no Terreiro do Paço, ou no Cais do Sodré, em Lisboa, para substituir a Loja do Cidadão dos Restauradores", diz-se numa resposta escrita a perguntas formuladas na véspera.

"No curtíssimo prazo, as alternativas consistem, desde logo, na utilização das valências da Loja do Cidadão das Laranjeiras e da nova Loja do Cidadão de Marvila, que abriu em 2012", diz a secretaria de Estado. Segundo a sua assessora de imprensa, o equipamento nos Restauradores, que ainda no ano passado se dizia ser utilizado diariamente por cinco mil pessoas, tinha "mais de 3000 solicitações diárias", às quais era "incapaz de prestar um serviço público de qualidade".

O PÚBLICO perguntou quantos utilizadores tem a loja das Laranjeiras e quais os serviços disponíveis em Marvila, ambas apontadas pelo Governo como alternativas à dos Restauradores, mas não teve resposta.

Maria Manuela Leitão Marques, que tutelou as lojas do cidadão nos governos de José Sócrates, não dispõe de números actualizados, mas lembra-se de a loja das Laranjeiras ser uma das que mais procura tinham em todo o país. Aumentar o número de pessoas que ali se dirigem, avisa, "será tornar as Laranjeiras num inferno".

Quanto ao equipamento de Marvila, diz que tanto quanto sabe essa é uma loja "coxa", que não dispõe de alguns dos serviços mais procurados pelos cidadãos. Em sua opinião, essa só poderá ser uma alternativa se o Governo investir na melhoria do espaço, transferindo para lá alguns dos serviços que estão actualmente nos Restauradores.

Seja como for, defende que o melhor seria abrir, como estava previsto nos executivos que integrou e como chegou a ser anunciado pelo actual Governo, uma nova loja "na mesma área" daquela que vai fechar a 31 de Dezembro. Com o objectivo, sustenta, de fazer com que seja acessível a quem está em Lisboa, mas também a quem se desloca à cidade vindo da Margem Sul ou da Linha de Sintra.

Nesse sentido, a ex-secretária de Estado considera que o Terreiro do Paço "era uma boa localização". Quanto à exiguidade do espaço diz que "já era muito bom" se a nova loja albergasse "as âncoras, os serviços que os cidadãos mais procuram e de que precisam mais vezes", como a Segurança Social, os Serviços de Finanças e a emissão de documentos como o Cartão de Cidadão.

Também Luís Esteves, dirigente do sindicato que revelou o fecho dos Restauradores, condena a não criação de uma nova loja em Lisboa. "As pessoas qualquer dia não têm serviços aos quais recorrer. É a loucura total", diz, frisando que o espaço das Laranjeiras "não tem capacidade" para receber mais pessoas.

O dirigente sindical não era favorável à escolha do terminal fluvial do Terreiro do Paço, por considerar que se tratava de "um espaço muito exíguo e sem condições para os utentes". Ainda assim, Luís Esteves afirma que isso era melhor do que nada: "Ainda daria alguma resposta a alguma coisa."

O sindicato também está preocupado com o futuro dos funcionários da loja dos Restauradores e diz que, a quase um mês do fecho anunciado, estes ainda não dispõem de respostas cabais sobre o seu futuro. Segundo números não oficiais obtidos pelo sindicato, trabalham ali cerca de 80 pessoas, distribuídas por perto de dez serviços.

A secretaria de Estado para a Modernização Administrativa transmitiu ao PÚBLICO que "os sete trabalhadores da Agência para a Modernização Administrativa serão recolocados noutros serviços" dessa entidade. "Todos os outros trabalhadores dos serviços públicos presentes na loja regressarão aos seus serviços de origem", acrescenta a mesma fonte.

Espaços do Cidadão "não são alternativa"

Maria Manuela Leitão Marques sublinha que as lojas do cidadão são "um modelo ganhador", considerando "espantoso que se vá desinvestir nos serviços que os cidadãos mais procuram". O  actual Governo já anunciou a intenção de criar uma rede de "Espaços do Cidadão", nos quais as pessoas terão acesso a postos de "atendimento digital assistido". Frisando que não conhece esse modelo em pormenor, a ex-secretária de Estado deixa um aviso: "Se é pura mediação, com um mediador para as pessoas que não conseguem usar os serviços online, então não é suficiente para ser uma alternativa" às lojas do cidadão como a dos Restauradores.

"Não podemos pensar que nos próximos dez ou 15 anos vamos poder oferecer todos os serviços públicos de grande procura de forma desmaterializada", salienta. A antiga governante conclui que os "Espaços do Cidadão" tal como têm vindo a ser anunciados podem, na melhor das hipóteses, ser "um outro canal, interessante", mas incapaz de substituir serviços que "exigem presença física" como a emissão de cartões de cidadão e passaportes.

O actual secretário de Estado para a Modernização Administrativa transmitiu ao PÚBLICO que o novo modelo já foi apresentado aos presidentes de câmara da Área Metropolitana de Lisboa. A assessora de João Cardoso da Costa acrescenta que esse modelo foi "genericamente muito bem acolhido".

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