Contrafacção na Social-Democracia

Não gostaria de continuar contrafeito a participar numas eleições europeias em que sei que o nome da Social-Democracia vai voltar a ser utilizado em Portugal exactamente para combater a família Social-Democrata na Europa…

A Social-Democracia é uma marca bem estabelecida e reconhecida na Europa. A ideia do socialismo democrático ganhava terreno no último quartel do século XIX e a designação de Social-Democracia por partidos políticos ficou definitivamente registada com a criação, em 1875, do Partido Social-Democrata alemão, o SPD, resultante da fusão de duas visões do socialismo, as de Marx e de Lassalle.

Eram duas tendências diferenciadas, mas ambas inseridas na luta internacional dos trabalhadores pelo reconhecimento dos seus direitos e pela procura de uma sociedade socialista democrática baseada no trabalho contra a dominação do capital.

Portugal foi pioneiro deste grande movimento internacional, com a criação, ainda em 1875 antes do SPD alemão, do nosso primeiro Partido Socialista em que se destacaram as figuras de Antero de Quental e de José Fontana. O movimento continuaria na Europa com a criação de numerosos outros partidos socialistas e social-semocratas, que se foram enquadrando no Partido Socialista Europeu e na Internacional Socialista. A marca da social-democracia ou do socialismo democrático parecia estar bem definida apesar de ter sido este sempre um espaço plural, com diversas tendências e facções.

Mas Portugal tinha de ser diferente. Depois do 25 de Abril criava-se um Partido com a designação de Social-Democrata, mas pouco tempo depois saíam diversos fundadores verdadeiramente social-democratas e a natureza política do partido ficou definitivamente esclarecida quando, depois de rejeitada a integração na Internacional Socialista, o PSD se colocava no centro-direita e se integrava naturalmente no Partido Popular Europeu, o grande rival do Partido Socialista Europeu. Mas apesar dessa integração, talvez por preguiça, manteve a designação de Social-Democrata.

“Orgulhosamente só” no espectro político europeu, ficou assim um Partido com a designação de Social-Democrata a utilizar a marca da social-democracia e a praticar, nas palavras e nos actos, o liberalismo seu contrário. E, impunemente, se foram elegendo liberais de centro-direita com rótulo social-democrata para Presidente da República, para Primeiro-ministro, indo até à Presidência da Comissão Europeia. De facto, desaparecida a facção social-democrata do PSD tinha ficado apenas a contrafacção!

Era a maior operação organizada de contrafacção política em Portugal e na Europa. Em condições normais essa contrafacção deveria ser facilmente evitada por uma actuação da ASAE impedindo que se vendesse gato (ou Coelho) por lebre, ou por uma iniciativa da DECO para evitar que o consumidor político português pudesse continuar a ser vítima de publicidade enganosa, talvez obrigando a que o rótulo pudesse voltar a ser o da honesta designação de Partido Popular Democrático, PPD.

Mas nada disto aconteceu e continua a contrafacção. Mas eu não gostaria de continuar contrafeito a participar numas eleições europeias em que sei que o nome da social-democracia vai voltar a ser utilizado em Portugal exactamente para combater a família social-democrata na Europa.

Engenheiro Silvicultor e Professor

 
 
 

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