Considerações de procurador que arquivou caso de vice de Angola dão origem a inquérito disciplinar

Procuradora-geral determinou instauração de inquérito por magistrado ter escrito no despacho que esperava que arquivamento contribuisse para “o desanuviar do clima de tensão diplomática” entre Portugal e Angola.

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Decisão foi anunciada esta sexta-feira pela Procuradora-Geral da República. NUNO FERREIRA SANTOS

As considerações do procurador Paulo Gonçalves no despacho de arquivamento do caso que visava o vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, onde o magistrado diz esperar contribuir para “o desanuviar do clima de tensão diplomática” entre Portugal e Angola, vão dar origem a um inquérito disciplinar.

Isso mesmo foi anunciado esta sexta-feira pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que adianta que a instauração do inquérito foi determinada pela procuradora-geral Joana Marques Vidal e já foi comunicada ao Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), o órgão que decide o desfecho dos processos disciplinares.

No despacho de arquivamento, sublinha a nota da PGR, “constam considerações de natureza subjectiva que em nada se relacionam com a apreciação e a ponderação técnico-jurídica da matéria objecto dos autos, as quais devem obedecer a rigorosos critérios de objectividade e legalidade, com integral respeito pelos princípios constitucionais da separação de poderes”.

E acrescenta-se: “Tais considerações são susceptíveis de integrar eventuais infracções de natureza disciplinar. Pelo que a Procuradora-Geral da República decidiu determinar a instauração de inquérito”.

No comunicado, a PGR tem o cuidado de sublinhar que a instauração deste inquérito “não coloca em causa o sentido da decisão do despacho de arquivamento”.

O documento com 11 páginas a que o PÚBLICO teve acesso, inclui, no final, o comentário do procurador. O magistrado escreve que espera que a sua decisão “venha contribuir para o desanuviar do clima de tensão diplomática que tem ensombrado com mal entendidos a amizade entre os dois povos irmão, permitindo, conforme decorre de requerimentos apresentados, a realização de encontros e cimeiras sem estigmas infundados, numa reciprocidade de «bom senso»”.  

Antes, no mesmo documento, cita-se uma exposição feita pela defesa de Manuel Vicente, onde se agradece a “simpática referência” do procurador Paulo Gonçalves, que num outro despacho registou o “…respeito e admiração de que é merecedor o vice-presidente de um país amigo como Angola”.  

Contactado pelo PÚBLICO antes de se saber da instauração do inquérito disciplinar, um membro do CSMP referia não achar "apropriados" os comentários de Paulo Gonçalves, mas adiantava que os mesmos não violariam qualquer dever do magistrado. Um outro membro do conselho também considerou excessiva a eventual instauração de um inquérito disciplinar, defendendo que os mesmos poderiam ser valorados no âmbito da avaliação de desempenho do procurador.  

O procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) arquivou na segunda-feira parte do inquérito que envolve altos dirigentes angolanos, tendo concluído as investigações que visavam Manuel Vicente, o governador da província de Kuando Kubango, Francisco Carneiro, e a empresa de telecomunicações Portmil.

Em pouco mais de duas semanas, esta foi a terceira vez que o Ministério Público confirmou que terminou sem acusação processos que envolviam altas individualidades angolanas. Primeiro foi a investigação que visava um depósito suspeito feito pelo procurador-geral de Angola, José Maria de Sousa, e a semana passado soube-se que a empresa que tem como accionista único um dos enteados do vice-presidente de Angola recebeu e aceitou uma proposta do DCIAP para pagar uma indemnização e desta forma ver suspenso o processo-crime que corre contra si por fraude fiscal, falsificação e branqueamento de capitais.

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