Governo quer manter farmácias nos hospitais, mas instituições têm outras ideias

Das seis farmácias privadas concessionadas nos hospitais públicos só quatro funcionam e ao todo as dívidas são de 16 milhões. Instituições não acreditam no modelo, Ministério da Saúde quer manter serviço, mas diz que o formato do anterior executivo está errado.

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A farmácia de Santa Maria abriu em 2009 e nunca pagou rendas ao hospital, tendo uma dívida 8 milhões Nuno Ferreira Santos

A ideia era facilitar a vida aos utentes, proporcionando uma farmácia comunitária dentro dos hospitais onde se pudesse aviar logo as receitas. Chegaram a existir seis abertas, agora são só quatro, e o Ministério da Saúde gostaria de manter este serviço, mas os conselhos de administração dos hospitais não estão certos de que este seja o futuro dos espaços (que nada têm que ver com as farmácias internas onde os doentes poderão continuar a levantar os seus medicamentos).

A Associação Nacional de Farmácias (ANF) já tinha, neste mês, vindo a público pedir o fim desta iniciativa que classificou como “falhada”. No Congresso Nacional das Farmácias, o presidente da ANF, Paulo Duarte, voltou a classificar o processo de instalação de farmácias nos hospitais como uma iniciativa com “elevados custos para todos”, pedindo que o ministro da Saúde, Paulo Macedo, revogasse o diploma sobre o tema.

Mas, ao PÚBLICO, o Ministério da Saúde garantiu que defende que estas farmácias são “uma boa ideia que aproxima a saúde dos cidadãos, particularmente dos que recorrem às urgências durante o período nocturno” e atribui o falhanço a um projecto “mal executado pelo anterior Governo, pois verificou-se que nenhum plano de negócio poderia suportar rendas e cobranças tão altas, tão irrealistas. A concessão mostrou-se inviável e já na altura isso era perceptível”.

16 milhões de dívidas
De acordo com informações divulgadas pela Inspecção-Geral das Finanças, no total, as seis farmácias hospitalares devem 16 milhões de euros de rendas em atraso, fora os acordos que fizeram com os hospitais para lhes entregarem ainda uma percentagem das vendas.

As farmácias hospitalares foram criadas durante o Governo de José Sócrates pelo então ministro da Saúde, Correia de Campos, e concretizadas pela sua sucessora, Ana Jorge. Na altura os concursos tiveram várias impugnações que atrasaram o processo e foram vistos sobretudo como uma guerra no sector, já que acabaram por ser ganhos quase na maioria pela Sociedade Central Farmacêutica Hospitalar – oponente da Associação Nacional de Farmácias.

A TSF contactou os hospitais onde ainda funcionam as quatro farmácias que restam. No Hospital de Faro, assim que a unidade conseguir receber as dívidas em atraso, vai fechar o espaço e vai utilizar o local para a própria farmácia interna do hospital – que distribui aos doentes medicamentos como os oncológicos ou para o VIH/sida, entre outros, e que funciona agora num espaço apertado. A farmácia abriu em Julho de 2009 e a dívida só em rendas é de mais de meio milhão de euros.

A farmácia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, que abriu em Março de 2009, já foi notificada para fechar portas por dívidas de três milhões em atraso e o contrato foi anulado em tribunal. O Centro Hospitalar de São João tem o caso em tribunal, mas disse à também à TSF que os termos do contrato não poderão ser alterados porque foram assinados após concurso público. A farmácia abriu em Junho de 2010 e a dívida é de quase três milhões.

Em Penafiel, o caso também está no tribunal, mas ainda não se sabe o que se vai fazer depois com o espaço da farmácia que abriu em Agosto de 2009 e que tem 110 mil euros de dívidas apenas em 2011.

A farmácia do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, já viu o contrato extinto e portas encerradas, estando a administração da instituição a estudar uma solução para o espaço: abrir um novo concurso ou aproveitar o local para a farmácia interna como no Algarve, diz a mesma rádio. Desde que abriu, em Abril de 2009, o espaço acumulou uma dívida de quase 8 milhões de euros. A de Leiria abriu em Setembro de 2008 e já tinha sido declarada insolvente neste ano, com uma dívida de quase 2,5 milhões de euros.

Confrontado com estas ideias, o Ministério da Saúde diz que independentemente da vontade política da tutela “esta matéria depende dos hospitais, que, enquanto empresas que são, têm autonomia financeira e administrativa": "Cabe a cada hospital concluir pela necessidade de uma concessão no seu campus a uma farmácia de venda ao público, ou não. Alguns casos mostraram muito claramente que as condições previstas nos contratos de concessão eram pura e simplesmente inexequíveis. Naturalmente que um processo de nova concessão obrigará a uma revisão daquelas condições”.
 

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