Oposição contra “cheque-ensino”

Liberdade de escolha entre colégios e escolas públicas mal acolhida por PS, PCP e BE.

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Nelson Garrido

A expressão cheque-ensino não chegou a ser utilizada quando o ministro da Educação, Nuno Crato, aludiu na quinta-feira à aprovação, em Conselho de Ministros, do novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo que consagra a “liberdade de escolha das famílias” relativamente à escola dos filhos. Mas porque é isso que está em causa, os partidos da oposição já anunciaram que vão manifestar-se contra, quando a proposta chegar à Assembleia da República.

“O que o senhor ministro pretende é criar uma escola pobre para pobres com resultados pobres”, reagiu ao PÚBLICO Rui Jorge Santos, coordenador do grupo parlamentar do PS na comissão de Educação, Ciência e Cultura. Sublinhando que o PS “não está contra a liberdade de escolha”, o socialista sustenta que, porque as escolas privadas têm um número de vagas finito”, os resultados práticos não são difíceis de adivinhar: “No final, as escolas escolherão os alunos que melhor entendem e, portanto, os alunos com necessidades educativas especiais ou com agregados familiares em condições económicas e sociais mais difíceis terão mais dificuldades em entrar para as escolas que pretendem”.

O deputado do PS acusa assim o Governo de estar a “transformar a oferta educativa em negócio, como se os alunos fossem clientes de qualquer cadeia de distribuição de produtos alimentares”.

Do lado do PCP, Jorge Pires, também vincou a “discordância total” dos comunistas à possibilidade aberta pelo novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior. “O texto da Constituição não coloca em pé de igualdade o ensino público e privado. O que está consagrado constitucionalmente é que o Estado deve garantir a todos os portugueses uma escola pública onde eles possam ter acesso a todos os níveis de ensino e que combata as desigualdades sociais, económicas e culturais”, sustenta.

Membro da comissão política do PCP com a pasta da Educação, Jorge Pires considera, por outro lado, que “esta questão da liberdade de escolha das famílias é uma falsa questão”. Porquê? “As famílias que têm mais posses vão poder continuar a optar pelos colégios privados, agora com uma ajuda do Estado, e as que têm menos posses ficam com escolas públicas desarticuladas e desorganizadas, porque o cheque que o Estado vai passar não vai cobrir toda a despesa dos privados”.

Contra “esta consolidação do processo de mercantilização do ensino e da Educação”, Jorge Pires considera que o que está em questão “é a obsessão que a Direita há muito persegue em Portugal que é o financiamento do ensino privado”. Um negócio onde, segundo diz, “estão envolvidas muitas pessoas que passaram pelos quadros do Ministério da Educação”.

O PCP promete assim fazer uma forte oposição a esta decisão do Conselho de Ministros terá ainda que passar pela Assembleia da República. E o Bloco de Esquerda promete também fazer frente a uma proposta que a coordenadora nacional do BE, Catarina Martins, já classificou como “completamente inaceitável”. O cheque-ensino não passa, criticou num jantar-comício em Viseu, “de uma forma de tirar dinheiro à escola pública para o entregar direitinho no negócio privado das escolas privadas”.

“Nos últimos dois anos, o desinvestimento na escola pública em Portugal foi de tal maneira que passámos de uma média de investimento de percentagem do PIB que rondava os 7%, para 3,8%, apenas comparável a países subdesenvolvidos”, lamentou ainda Catarina Martins, citada pela agência Lusa, para lembrar que, na Suécia, fez-se uma experiência semelhante, tendo-se concluído que os cheques-ensino não fizeram mais do que “baixar os resultados muito bons dos estudantes nas disciplinas nucleares” e “promover a desigualdade”.

Já na quinta-feira, a Fenprof tinha revelado estar contra o novo modelo, considerando-o ilegítimo e ilegal.

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