As mulheres de "Bué Sabi" sem papas na língua

A cineasta Patrícia Vidal Delgado pegou em três mulheres e transformou-as em personagens “fortes e interessantes” na premiada curta-metragem “Bué Sabi”

Os “muitos filmes” que retratam os bairros sociais têm “pouco foco nas mulheres”. A cineasta Patrícia Vidal Delgado pegou nelas e transformou-as em personagens “fortes e interessantes” na premiada curta-metragem “Bué Sabi”.

Em entrevista à Lusa, a realizadora portuguesa, formada em Londres, explicou que “Bué Sabi” fez “a apresentação” de três personagens (uma cabo-verdiana, uma cigana e uma branca), todas jovens mulheres, cujas histórias vão ser desenvolvidas em três curtas-metragens distintas.

As personagens de “Bué Sabi” não têm “papas na língua”, recorrendo a palavrões e a uma linguagem agressiva, exprimindo-se “por vezes de maneiras que não são assim tão femininas, mas que são verdadeiras e sentidas”, descreve a realizadora.

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Depois de ter sido premiada como melhor curta-metragem no Festival de Avanca, no mês passado, “Bué Sabi” vai ser exibida no Festival de Curtas-Metragens de Faro (Farcume), que começa na quarta-feira, e também está selecionada para o Shortcutz.

Financiamento complicado

A curta-metragem sobre a cabo-verdiana Isa, a primeira da trilogia que será produzida pela Vende-se Filmes, deverá estar pronta em Novembro, para ser lançada em 2014. No final, Patrícia Vidal Delgado gostava de poder transformar a trilogia numa longa-metragem, mas “está complicado” obter financiamento em Portugal. A personagem de Isa será interpretada por Sofia Furtado, que faz parte do Teatro do Oprimido e “tem um papel activo na comunidade” a que pertence.

O objectivo é “questionar os problemas do dia-a-dia, do racismo, do sexismo, infelizmente algo que ainda existe muito na comunidade cabo-verdiana e também na guineense, em que a mulher é um pouco subvalorizada”, realça a realizadora.

A geração mais nova demonstra “frustração” face a essas atitudes, enquanto as mulheres mais velhas sofrem de “aceitação e apatia”, compara. Mulheres como Sofia Furtado são “fortes, sabem o que querem e o que não querem e não têm medo de o dizer, mas, apesar disso, estão numa comunidade onde os rapazes da mesma idade delas têm atitudes que não são muito saudáveis”, avalia.

Os cineastas da Vende-se Filmes têm trabalhado a temática dos bairros sociais. Patrícia Vidal Delgado diz que o actual clima nesses contextos é de “muito conflito” e “revolta” para com as autoridades, na sequência de episódios entre jovens e polícias, que por vezes culminam em mortes. Recordando ter ouvido uma menina de quatro anos dizer “polícia é mau”, à passagem de um carro com agentes, a cineasta não duvida de que seja “uma desconfiança que tem um porquê”.

Temendo que as coisas estejam “a mudar para pior”, prefere salientar o lado bom dos bairros, que têm um sentido “de comunidade”, onde as pessoas se ajudam. “Não temos isso aqui, no centro de Lisboa. Eu não conheço o meu vizinho, não sei quem é”.

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