Oposição questiona continuidade de secretário de Estado do Tesouro

PCP e Bloco exigem demissão de Pais Jorge. PS sugere que governante avalie se tem condições para continuar.

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Pais Jorge (à direita) propôs contratos swaps ao Governo de Sócrates Rui Gaudêncio

O PCP e o BE vieram nesta quinta-feira exigir a saída do actual secretário de Estado do Tesouro, Joaquim Pais Jorge, na sequência de uma notícia da Visão em que a revista dá conta de que, em 2005, enquanto responsável do Citigroup, o actual governante tentou vender ao Governo de José Sócrates contratos swaps que permitiriam fazer descer o rácio da dívida pública sobre o PIB, colocando os valores “fora do balanço”, sem que fossem contabilizados pelo Eurostat, o gabinete europeu de estatísticas.

"Se a ministra das Finanças não tem condições para continuar, naturalmente um seu secretário de Estado também não tem", assume o líder parlamentar do PCP, Bernardino Soares. "Alguém com este currículo não tem condições para ficar [no Governo]", conclui também a deputada do Bloco de Esquerda, Ana Drago.

Para o deputado comunista, as revelações sobre Pais Jorge confirmam a “porta giratória” que existe entre o Governo e os grandes interesses económico-financeiros. Ana Drago assinala, por seu turno, que o passado de Pais Jorge entra em conflito com as suas actuais funções, lembrando que enquanto secretário de Estado terá sob sua responsabilidade a “contratação de swaps no futuro”. Daí que, diz, a sua demissão seja imperativa em nome da “higiene e decência democrática”.

Por seu lado, Eurico Dias, do PS, aconselha Pais Jorge a ponderar seriamente “se considera que continua a ter condições para exercer funções”. O membro do secretariado do PS afirma que a notícia deixa o secretário de Estado numa “situação muito fragilizada”, tendo agora a obrigação de “explicar se acha que este tipo de instrumentos deve ser utilizado para ocultar dívida pública”.

De acordo com o artigo da Visão, publicado nesta quinta-feira, em 2005, Joaquim Pais Jorge, então director do Citibank Coverage Portugal, e Paulo Gray, que era o director executivo do Citi em Portugal, apresentaram ao Governo liderado por José Sócrates “uma solução para melhorar o rácio da dívida [pública]/PIB em cerca de 370 milhões de euros em 2005 e 450 milhões de euros em 2006”. Para isso, o Estado teria de adquirir, diz a revista, três contratos swaps fornecidos pelo Citigroup, baseados em produtos “derivados”.

A Visão cita um documento que diz ter sido entregue pelo banco ao IGCP (que gere a dívida pública), ao Ministério das Finanças e ao gabinete de José Sócrates, em que a instituição financeira afirmava que “os Estados geralmente não providenciam [ao gabinete de estatísticas europeu, o Eurostat] informação sobre o uso de derivados. (…) Os swaps serão, efectivamente, mantidos fora do balanço. A ideia será proporcionar “ganhos” nas contas públicas do Estado, que, caso assinasse os contratos, ficaria, como escreve a Visão, citando um consultor financeiro, António Palhinha Machado, exposto ao risco da taxa de juro e de preço, “ao garantir as perdas decorrentes de uma evolução desfavorável”. 

O PÚBLICO tentou obter uma reacção de Joaquim Pais Jorge, através do Ministério das Finanças, mas ainda não obteve resposta.

Joaquim Pais Jorge, licenciado em Gestão de Empresas pela Católica, esteve 19 anos no Citibank em Portugal, instituição em que ocupou várias funções até à sua saída, em 2009. Nesse ano, ingressou na Estradas de Portugal como director do departamento económico e financeiro na área das concessões, assumindo depois, em 2012, a presidência da holding estatal Parpública.

Com a nomeação de Maria Luís Albuquerque para ministra das Finanças, foi indigitado secretário de Estado do Tesouro. A sua passagem pela Estradas de Portugal já foi questionada pelo PS, após ter sido escolhido para fazer parte do Governo, uma vez que o seu nome é mencionado no relatório preliminar da comissão parlamentar de inquérito como responsável pela negociação de concessões rodoviárias.


Joaquim Pais Jorge aparece, de facto, mencionado no relatório preliminar das PPP. Nesse relatório, o nome do novo secretário de Estado do Tesouro é identificado como tendo feito parte da comissão de renegociação da concessão Douro Litoral, que nunca chegou a funcionar. Surge igualmente referido como membro da comissão, criada em Agosto de 2010, para renegociar com as concessionárias Scutvias, Ascendi, Norscut e Euroscut, cujos contratos foram ou estão a ser revistos (no caso da Euroscut) pelo actual Governo, com o objectivo de alcançar as poupanças prometidas para 2013: 300 milhões de euros.

Ao Diário Económico o antigo presidente da Estradas de Portugal Almerindo Marques afirmou que o novo responsável pela pasta do Tesouro não assinou qualquer contrato de renegociação das PPP e que Joaquim Pais Jorge é "um excelente técnico e conhecedor da realidade financeira e bancária".

Quanto a Paulo Gray, o gestor está hoje na Stormharbour, a consultora escolhida pelo Governo para assessorar o IGCP no processo dos swaps ligados a empresas públicas. Além de Gray, director-geral do Citigroup entre 2003 e 2011, está também na Stormharbour um outro ex-quadro do Citi, António Caçorino. Conforme já escreveu o PÚBLICO, o Citigroup foi um dos bancos que comercializaram swaps junto de empresas do Estado, mas que não foram considerados tóxicos pelo IGCP.
 
 

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