Pescanova envergonha Espanha e prejudica indústria

Escândalo acaba por prejudicar a reputação do país e das suas empresas.

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Empresa galega abriu unidade de produção de pregado na Praia de Mira em 2009. Adriano Miranda

O seu slogan fala "dos benefícios do alto mar", tem mais de 100 navios e 10.000 funcionários em todo o mundo, mas agora o gigante de peixe congelado Pescanova, suspeito de falsificação de contas, perturba Espanha na sua tentativa de recuperação dos mercados.

Depois de anos a apresentar aumentos de vendas (1700 milhões de euros em 2011), o grupo, um dos mais importantes do mundo e a flor na lapela da Galiza, confessou, em Fevereiro, não poder publicar os seus resultados de 2012. Dois meses depois, a 25 de Abril, pediu falência.

"Foi uma surpresa", disse Francisco Vilar, secretário regional da federação agro-alimentar do sindicato CCOO, a maioria na Pescanova.

"Os trabalhadores estão aqui há 30, 40 anos, e atestam a boa gestão que tem sido seguida, de forma que a surpresa foi enorme", disse.

Suspeitas de facturas falsas, uma dívida de 3300 milhões de euros, mais do dobro da que tinha sido divulgada, dirigentes que venderam acções pouco antes de o caso ser conhecido: "É uma Enron à espanhola”, diz uma fonte do sector bancário, referindo-se à gigante corretora americana do sector da energia que foi um dos maiores escândalos financeiros da primeira década deste século.

"Houve um emaranhado de filiais montadas única e exclusivamente para esconder as dívidas", disse a mesma fonte. Mais de uma centena de filiais, de que o grupo de pesca não tinha mais de 50%, serviram para esconder a dívida nas suas contas.

"Subsidiárias fantasmas!", salientou Joaquin Yvancos, advogado de centenas de pequenos accionistas que estão a processar a administração.

Para investir em tudo, desde as aquaculturas de salmão no Chile ou em centros de preparação de marisco no Equador, o grupo "contactava diferentes bancos do mundo para pedir empréstimos usando a imagem e a reputação da Pescanova e todos lhes davam, o que faz sentido, uma vez que eram líderes no seu segmento", disse uma fonte próxima da empresa.

Banco Sabadell, Banco Popular, Deutsche Bank, Commerzbank, mas também os bancos na Namíbia, na Bolívia ou nas Maurícias: mais de cem bancos, a maioria estrangeiros, emprestaram ao gigante do peixe congelado, que diz ter inventado a carga refrigerada nos anos 60 do século passado.

Agora, o presidente da Pescanova, Manuel Fernandez de Sousa, é acusado de falsificação de contas e de informação privilegiada. a contabilidade. As empresas Deloitte e KPMG são as empresas responsáveis por auditar as contas.

O relatório divulgado na quarta-feira pela KPMG é esmagador: "Nos últimos anos, as práticas contabilísticas foram postas em prática e executadas com o objectivo de mostrar uma dívida inferior à real e, portanto, apresentar resultados mais elevados dos que os efectivamente gerados" .

"Esta é uma dura lição, não duvidámos de nada", admite uma fonte do sector bancário, mas é difícil suspeitar de um grupo cujo relatório de resultados e contas era auditado todos os anos: "Estamos a falar de uma empresa cotada e não de uma empresa familiar que tem menos obrigações legais ".

Manuel Fernandez de Sousa, que nega qualquer irregularidade e admite apenas "decisões erradas", reconheceu num comunicado que "a Pescanova criou e cresceu quase sem capital através de empréstimos bancários, como a grande maioria das empresas espanholas": "Este sempre foi o nosso ponto fraco e continua a sê-lo."

No final de Junho, um empréstimo de emergência de 56 milhões de euros foi concedido ao grupo. Nenhum banco estrangeiro se mostrou disposto a participar.

"Este não é um bom sinal", preocupou-se uma fonte do sector bancário, já que Espanha, cujos bancos recebem ajuda europeia, pena para recuperar a plena confiança dos mercados.

Este caso "causa um grande dano à credibilidade do país", disse Joaquin Yvancos. "Não estamos a falar apenas da Pescanova, mas da marca Espanha", adverte, "no pior momento" já que o país "tenta convencer os investidores a voltar."

"A Pescanova é uma multinacional com uma marca bem conhecida, e quando este género de coisas acontece, nunca é bom", disse recentemente a responsável da bolsa espanhola, Elvira Rodriguez.

"Este é um dos principais grupos de pesca do mundo", disse Alberto Roldán, analista do Lloyds Bank, e "este caso, muito desagradável, mancha o trabalho de internacionalização de empresas": "Não se consegue avaliar bem o enorme dano que a Pescanova provocou ao tecido industrial espanhol".
 

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