ONU pede alteração da lei do aborto em El Salvador

Beatriz está a salvo, embora ainda nos cuidados intensivo. Mãe diz: "Fizeram-na sofrer tempo de mais."

Foto
Um casal à porta do hospital onde continua internada Beatriz. O seu caso reacendeu o debate sobre o aborto em El Salvador Jose CABEZAS/AFP

A ONU considera que é chegada a hora de considerar “as graves consequências para os direitos das mulheres” da legislação do aborto em El Salvador e pediu ao Governo salvadorenho para alterar a lei, de acordo com a edição desta quarta-feira do jornal espanhol El Mundo.

Em El Salvador, a proibição da interrupção da gravidez mesmo nos casos em que a vida da mãe está em perigo, “contraria claramente os compromissos assumidos por El Salvador em matéria de Direitos Humanos”, considerou um grupo de peritos em comunicado no qual exorta as autoridades salvadorenhas a mudar a lei para “garantir a devida protecção a todas as mulheres”.

Os especialistas baseiam-se no caso de Beatriz, nome fictício da mulher que viu recusado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) o seu pedido para abortar, apesar de ter uma gravidez que punha em perigo a sua vida. Os juízes lembraram que em El Salvador o aborto terapêutico está proibido por lei e que esta protege a pessoa humana “a partir do instante da concepção”.

A Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, órgão judicial com competência consultiva, posicionou-se e exigiu ao Governo de Salvador que "adoptasse e garantisse, urgentemente, todas as medidas necessárias para impedir danos irreparáveis” aos direitos e à saúde de Beatriz. E pouco depois a ministra da Saúde María Isabel Rodríguez determinou que uma necessária interrupção de gravidez, neste caso, “não seria um aborto mas sim um parto induzido”.

Nesta semana, os médicos procederam a uma cesariana e o bebé apenas sobreviveu cinco horas. Este era o desfecho previsível – o feto, com um grave problema no sistema nervoso, não tinha parte do cérebro e não iria sobreviver mesmo se concluído todo o tempo de gestação. Além disso, Beatriz é portadora de uma doença auto-imune, lúpus, que traz graves problemas para a gravidez e podia pôr em perigo a sua vida.

Beatriz continua nos cuidados intensivos a recuperar da cesariana. Ao jornal El Pais, a mãe diz que a mulher de 40 anos está mais animada e a recuperar. “Fizeram-na sofrer demasiado tempo." Estava internada há quase dois meses quando iniciou a batalha judicial que terminou nesta semana.

“Beatriz tornou-se símbolo mundial”, disse também a ministra da Saúde ao mesmo jornal. Um símbolo que leva os peritos da ONU a pressionar a uma mudança da lei pelo Governo de El Salvador, um dos países da América Latina – a par da Nicarágua, Honduras, República Dominicana e Chile – onde é proibido o aborto em qualquer situação. Nesses casos, reconhece o Governo, quem tem possibilidades financeiras, viaja para proceder a uma interrupção da gravidez num outro país.

A equipa de peritos da ONU espera agora que não sejam impostas sanções à equipa de médicos que procedeu à cesariana de Beatriz em El Salvador. E conclui: “Uma absoluta proibição do aborto, quando o resultado representa um grave perigo para a vida e a saúde das mulheres, constitui uma violação das obrigações do Estado de prevenir a tortura e o tratamento desumano, degradante e cruel.”

Sugerir correcção
Comentar