As fotografias checas de Gérard Castello-Lopes vão ter uma exposição

Portefólio de fotografias inéditas de um dos mais consagrados fotógrafos portugueses vai ser mostrado em Lisboa. Imagens foram captadas durante uma curta viagem a Praga, em Dezembro de 1957.

Durante a curta viagem a Praga, Gérard gastou três rolos de fotografia
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Durante a curta viagem a Praga, Gérard gastou três rolos de fotografia Gérard Castello-Lopes
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Nas fotografias checas de Gérard é difícil encontrar sinais de liberdade e de alegria, refere o curador da exposição Jorge Calado Gérard Castello-Lopes

A loja da FNAC no Chiado, em Lisboa, vai expor a partir de 4 de Junho uma série de fotografias inéditas que Gérard Castello-Lopes captou em Praga, em Dezembro de 1957, quando a então Checoslováquia ainda estava sob domínio soviético. São mais de duas dezenas de imagens escolhidas por Jorge Calado que mostram uma cidade pardacenta, de quotidiano sombrio e que até agora não fazia parte do roteiro fotográfico conhecido de um dos mais consagrados fotógrafos portugueses.

A primeira amostra deste trabalho de Castello-Lopes (1925, Vichy - 2011, Paris) foi divulgada na revista XXI – Ter Opinião, editada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, onde um portefólio com 19 imagens se faz acompanhar de um ensaio de Jorge Calado, comissário da exposição retrospectiva Aparições – A Fotografia de Gérard Castello-Lopes, 1956-2006, apresentada em Lisboa no espaço BES Arte & Finança (2011) e em Paris na Fundação Calouste Gulbenkian (2012).

Nesta selecção de fotografias começam a revelar-se os traços característicos da imagética fotográfica de Gérard Castello-Lopes, com muitas cenas de rua (evitando a monumentalidade), pessoas captadas de costas (o fotógrafo não gostava do confronto com o olhar nem de se sentir intrusivo), as montras de lojas (uma das suas obsessões) e a dinâmica urbana (transportes públicos, carros, polícias sinaleiros…). Curiosamente, apesar das suas reticências em “importunar” transeuntes com a sua actividade fotográfica, entre as dezenas de fotografias que mandou imprimir (das quase 100 que captou), a única imagem que escolheu para representar a sua viagem a Praga é o retrato de um asiático, de olhar directo, apelidado na família de Gérard como “o vietnamita”.

Para Jorge Calado, a revelação deste portefólio inédito é “mais do que uma nota de rodapé” constituindo “um pequeno capítulo autónomo” na obra do fotógrafo que assim junta Praga a outras quatro capitais europeias onde a sua Leica trabalhou – Lisboa, Paris, Bruxelas e Roma.

Segundo o texto de Jorge Calado na XXI – Ter Opinião, Gérard Castello-Lopes terá começado a fotografar “a sério” em 1956, um ano antes da sua viagem à ex-Checoslováquia, para onde viajou com o intuito de comprar fitas para a Filmes Castello-Lopes, a empresa de família que se dedicava à distribuição e produção cinematográfica. Os três rolos que gastou nessa deslocação (cujo objectivo inicial era a compra de séries de desenhos animados) revelam já todo o génio criativo ligado à fotografia humanista que viria a caracterizar toda a sua obra, que só em 1982 teve uma expressão pública em Portugal com a exposição organizada por António Sena na Galeria Ether, em Lisboa (o primeiro livro com fotografias de Gérard, Perto da Vista, surgiria dois anos depois).

Nas imagens publicadas na revista da Fundação Francisco Manuel dos Santos (copiadas a partir das provas vintage tiradas por Gérard), a tónica é a de um país toldado, encoberto, não só pelo nevoeiro, mas também por um espartilho social e político que só no início de 1968 se começaria a desatar. “É difícil encontrar sinais de liberdade e de joie-de-vivre nas fotografias checas de Castello-Lopes. Será uma visão parcial (…) mas vejo estas fotos como o retrato duma sociedade amordaçada e eficazmente controlada. Fora de portas os cidadãos sentiam-se mais livres”, escreve Calado para quem Gérard conseguiu captar com mestria a atmosfera fechada que se vivia nas ruas de Praga.

Entre as fotografias do portefólio que agora se revela, o curador e crítico do Expresso destaca uma imagem ao alto do momento em que um magote de pessoas atravessa uma rua de paralelos, que ora desenham semicircunferências, ora se orientam horizontalmente seguindo os carris do eléctrico. O grupo encasacado de pastas e malas na mão divide a fotografia em dois, um exercício de que Gérard era particularmente devoto criando imagens dentro das imagens através da composição e/ou enquadramentos. Para além desta, Jorge Calado isola aquela que para si é “a mais cinéfila das fotografias de Castello-Lopes”, que mostra um vulto corcunda e um cartaz do filme de Robert Bresson, Un condamné à mort s´est échappé (1956).

No dia da inauguração da mostra, a 4 de Junho, o curador e José Manuel Fernandes, director da XXI – Ter Opinião, conversam com o público sobre as fotografias checas de Gérard Castello-Lopes.

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