Paulo Mendes não aceitou proposta da câmara de manter bandeira só uma semana

A Porto Lazer recusa acusação de censura no caso da bandeira portuguesa a preto e branco que integrava o projecto do artista plástico, e que este retirou do Edifício Axa, na Avenida dos Aliados

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Paulo Mendes açega que o hasteamento exterior da bandeira é parte da integridade do seu projecto DR

O artista plástico Paulo Mendes (n. Lisboa, 1966) abandonou o projecto 1ª Avenida em reacção à exigência da Porto Lazer – empresa da Câmara Municipal responsável pelo evento – de que retirasse do espaço exterior do Edifício Axa, na principal avenida da Baixa portuense, uma bandeira portuguesa gigante e a preto e branco que fazia parte da sua instalação Portuguesa Monochrome e que integrava o programa colectivo Portugal geográfico.

Paulo Mendes não utiliza a palavra “censura” para comentar o episódio. “Não quero fazer qualquer qualificação. Cada um tirará as suas conclusões”, disse esta segunda-feira ao PÚBLICO, a quem expôs a sua versão do que aconteceu na semana passada, nos dias 25 e 26 de Abril.

Ao princípio da tarde do primeiro daqueles dias, Paulo Mendes – fazendo notar que o facto de ser o aniversário da Revolução dos Cravos “foi meramente circunstancial” – hasteou a sua bandeira numa janela do 3º piso do Edifício Axa, primeira componente da sua instalação, que incluiria mais seis vídeos, já numa sala no interior.

A inauguração de Portugal geográfico, com os trabalhos dos vários artistas convidados a preencher aquele piso do edifício, estava marcada para a noite de 26 de Abril.

Mas pouco tempo após a colocação da bandeira, a Porto Lazer, através do seu responsável Hugo Neto, invocou “ordens superiores” para exigir a retirada da bandeira da fachada. “Queriam que eu a colocasse no interior, ou então não haveria inauguração na sexta-feira, nem do meu nem dos outros projectos”, diz Paulo Mendes, acusando os responsáveis autárquicos de “chantagem”. Decidiu abandonar o 1ª Avenida logo no dia 26, e sem sequer montar o resto da sua instalação. E a bandeira foi removida.

A Porto Lazer tem uma versão diferente dos factos. Recusando qualquer “acusação de censura, pois a exposição da peça em si nunca foi questionada”, a empresa municipal, através de um comunicado enviado por e-mail, assegura que sugeriu a Paulo Mendes a utilização do mastro exterior do Edifício Axa durante apenas uma semana (até 3 de Maio), colocando depois a bandeira na sala interior do 3º piso, associada à sua instalação.

“O artista Paulo Mendes manifestou-se irredutível na posição de manter a peça hasteada no exterior do edifício durante toda a exposição (até 9 de Junho)”, diz a nota da Porto Lazer, acrescentando que “não poderia permitir que o Edifício Axa tivesse, durante um mês e meio, apenas um ícone externamente visível de um dos seus muitos conteúdos e, portanto, contaminante da identidade diversa que se pretende construir para o programa imaterial” do 1ª Avenida.

Paulo Mendes contrapõe dizendo que o hasteamento exterior da bandeira é parte da integridade do seu projecto, que caracteriza como “um trabalho de crítica social e política”, e que é uma reacção “à situação do país”. De resto, a mesma bandeira já tinha sido instalada em Guimarães, em Fevereiro-Março últimos, tendo mesmo sido “roubada durante a noite, quase no final de um mês de exposição”, mas depois devolvida anonimanente numa loja vizinha do Laboratório das Artes, naquela cidade.

A Porto Lazer nota, ainda, que “as intervenções artísticas que afectam o espaço exterior e/ou a fachada” têm de ser “coordenadas com a entidade que gere o projecto, o que não foi totalmente acautelado”.

Paulo Mendes vê neste episódio mais uma expressão da “insensibilidade do poder político da autarquia dirigida por Rui Rio, que sempre foi preconceituoso em relação à criação artística e aos criadores”.
 

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