Nuno Santos processa RTP depois de despedido por justa causa

Ex-director de Informação vai recorrer da decisão aplicada após o processo disciplinar instaurado pela administração da empresa. RTP diz que despedimento se deveu a razões de natureza jurídica.

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O caso motivou a demissão de Nuno Santos da direcção de informação do canal Rui Gaudêncio

Nuno Santos foi despedido por justa causa pela administração da RTP e sai sem direito a indemnização ou compensação financeira. O ex-director de Informação é acusado de violar os deveres de obediência e lealdade.

Alvo de um processo disciplinar, instaurado pela administração após o polémico caso em que a PSP visionou as imagens, nunca transmitidas pela RTP, da manifestação e dos confrontos à porta do Parlamento, Nuno Santos foi agora notificado da decisão, da qual vai recorrer na Justiça.

"Fui despedido da RTP. A decisão acaba de me ser comunicada pelo conselho de administração da empresa à qual dei o melhor de mim próprio durante 15 anos. Travarei a partir de hoje uma luta sem quartel, nos tribunais e em outros fóruns, contra este saneamento anunciado e agora oficializado. A honra dos homens não se atira impunemente aos cães", diz Nuno Santos, num comunicado a que o PÚBLICO teve acesso.

O ex-director lembra que esta acção foi “desencadeada exclusivamente por alegado delito de opinião [pelas declarações no Parlamento], algo que está banido da ordem jurídica portuguesa desde a entrada em vigor da Constituição da República em 1976”.

Por isso, Santos volta a defender que o seu despedimento é uma “decisão meramente política, concertada minuciosamente pelo descredibilizado conselho de administração da RTP com outras entidades, como se provará em sede própria”.

Plano estava traçado
“Na vaidade do seu isolamento, a equipa do dr. Alberto da Ponte executou até ao fim o plano previamente traçado, fazendo-o, aliás, em simultâneo com outras acções lesivas dos interesses da RTP e dos seus trabalhadores para as quais chamei a atenção no Parlamento, as quais estão hoje, infelizmente, à vista de todos”, aponta Nuno Santos.

“Não confundo a RTP com uma gestão temporária e esquecível”, afirma o jornalista, para considerar depois que a empresa tem “condições para sobreviver ao plano de desmantelamento material e moral em curso”, nesta fase difícil que o grupo público “jamais” viveu.

A carta com a decisão final, que o acusa de violar os deveres de obediência, chegou-lhe na terça-feira. O documento, assinado pelos três membros do conselho de administração, diz que foi decidido aplicar-lhe a sanção de despedimento imediato com justa causa, sem qualquer indemnização ou compensação.

O ex-director de Informação diz ter recebido a “decisão do dr. Alberto da Ponte sem surpresa”, algo de que estava à espera desde que foi “ilegalmente suspenso” a 7 de Dezembro, acusado de delito de opinião” depois da sua audição no Parlamento. Na altura, perante os deputados afirmou ter sido alvo de um caso de “saneamento político travestido de uma decisão de gestão”.

"O que temos em cima da mesa é um golpe de mão”, considerou o ex-director. E acrescentou: “A partir de um certo momento, tornou-se evidente que eu era uma pessoa non grata para o Governo. Porque deixava fazer informação contra o Governo? Não, apenas uma informação correcta e isenta.”

Despedimento por razões de natureza jurídica
Em comunicado divulgado na tarde desta quarta-feira, a RTP afirma que as razões invocadas por Nuno Santos para explicar o seu despedimento “não são as que de facto subjazem à decisão em causa”. A estação de televisão pública defende que as razões que levaram ao despedimento “são de natureza estritamente jurídica e decorrem dos vários comportamentos que o trabalhador assumiu” e que o ex-director de Informação “não foi despedido por delito de opinião”.

A RTP sublinha ainda que no contrato feito com Nuno Santos este deveria exercer “exclusivamente” funções directivas e “que tal se tornou impossível, ao declarar publicamente que não trabalhava com o presidente do conselho de administração da empresa que o contratou como director”. “A ocorrência desses comportamentos foi demonstrada no decurso do procedimento próprio”, conclui a nota.

"Comportamento ilícito e culposo", diz a administração
No texto da decisão do processo disciplinar, a que o PÚBLICO teve acesso, a administração afirma que a actuação do ex-director de Informação no Parlamento “consubstancia a prática de diversas infracções disciplinares, traduzidas na violação grave e deliberadamente assumida do dever de obediência e do inerente cumprimento das ordens e instruções relativas à execução do trabalho”.

Mas é uma violação também, continua o documento, “do dever de respeitar e tratar com probidade os seus companheiros de trabalho e superiores hierárquicos e do dever de lealdade”.

A equipa de Alberto da Ponte considera que Nuno Santos teve um “comportamento ilícito e culposo” de tal forma grave que torna “imediata e praticamente impossível a manutenção da relação de trabalho”. Em especial por se tratar de um profissional contratado para “funções directivas” que envolvem uma “delegação de poderes do empregador e, como tal, uma especial relação de confiança”, argumenta ainda a administração.

Num primeiro inquérito interno da RTP sobre o que aconteceu para que a PSP conseguisse entrar na empresa pública de rádio e televisão e visionar as imagens em bruto, Nuno Santos foi dado como único responsável pelo sucedido.

Já a ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social ilibou-o de responsabilidades no sucedido, exigindo que a RTP clarifique os procedimentos internos neste tipo de casos de acesso a conteúdos, e a Comissão da Carteira Porfissional de Jornalista decidiu abrir-lhe um processo disciplinar por violação do dever de protecção da confidencialidade das fontes de informação.

O conselho de redacção e a comissão de trabalhadores da RTP emitiram pareceres em que também o ilibam.

Notícia actualizada às 15h45: acrescenta comunicado da RTP.
 

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