Relação dos artistas com as tecnologias em destaque no Festival de Edimburgo

Richard Burton, Leonardo, Allen Ginsberg e Frank Zappa são alguns dos “visionários” em destaque na programação, revelada na terça-feira.

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O director do festival, Jonathan Mills, durante a apresentação Reuters

Em 2013, o Festival de Edimburgo, que decorre de 9 de Agosto a 1 de Setembro, convida a “embarcar numa viagem inspirada pela forma como a tecnologia modela a percepção do mundo”, nas palavras do director Jonathan Mills. Mills definiu como meta para a edição deste ano a investigação da "relação dos artistas com as suas inovações, materiais e tecnologias contemporâneas, pegando em exemplos de há 500 anos até aos dias modernos, em todas as formas de arte clássica e contemporânea, de câmara e em grande escala" diz no programa.

O festival inaugura com um concerto de Prokofiev, pela Royal Scottish National Orchestra, com direcção do maestro russo Valery Gergiev. Será tocado para além do Concerto de piano nº 3, a partitura que o músico russo compôs para o filme de Eisenstein, Alexander Nevsky (1938).

Patti Smith e Philip Glass vão homenagear o poeta Allen Ginsberg, da geração Beat. A poeta vai declamar poesia de Ginsberg e da sua autoria, sendo acompanhada ao piano por peças de Philip Glass.  O compositor minimalista apresentará ainda a obra que fez para o filme de Jean Cocteau, La Belle et la Bête (1946). Parte da exibição do clássico a preto e branco, substituindo a banda-sonora original (de Georges Auric) pela sua música, tocada pela Philip Glass Ensemble, e os diálogos iniciais por partes cantadas ao vivo. 

Este ano, o festival combina as gravações de Richard Burton (1925-1984) no papel de Hamlet, nunca antes vistas no Reino Unido, com uma performance do grupo de teatro nova-iorquino The Wooster Group. Em 1964, o actor participou na produção que John Gielgud fez de Hamlet, gravada por 17 câmaras diferentes, da qual resultou um filme exibido em 2000 salas de cinemas, nos EUA. A ideia de transformar um teatro numa experiência acessível a milhares de espectadores, espalhados por diversas cidades, naquilo que foi chamado de Teatro-filme, inverte-se agora. Desta forma, o espírito de Richard Burton ressurgirá no ecrã fundindo-se com a peça que se desenrola no palco. Teremos dois Hamlets em palco, Burton – no erã – e Scott Shepherd, de carne e osso.

Mills anunciou ao jornal The Guardian que Frank Zappa será homenageado, num tributo nocturno do conjunto musikFabrik, de Cologne, pelo seu estatuto de “compositor sofisticado e vanguardista, influenciado por Varèse e Cage”. Samuel Beckett é outro dos homenageados nesta edição. Beckett at the Festival procura celebrar a vida do escritor irlandês que conquistou o Prémio Nobel da Literatura, em 1969. Eh Joe, a produção para o Gate Theatre, de Dublin, será representada juntamente com I’ll Go On, o monólogo, de Barry McGovern, baseado na trilogia de romances de Beckett, Molloy, Malone Está a Morrer e o Inominável

A companhia de teatro escocesa Grid Iron apresentará Leaving Planet Earth, escrita e encenada por Catrin Evans e Lewis Hetherington, um trabalho site-specific para um lugar invulgar: a arena de escalada de Edimburgo, a maior na Europa. O festival recebe, pela primeira vez, a visita do LA Dance Project, a companhia de dança fundada por Benjamin Millepied, notabilizado pelo seu trabalho no filme Cisne Negro, em que coreografou e dançou ao lado da sua mulher Natalie Portman, e que, a partir de 2014, estará à frente do Ballet da Ópera de Paris.

Será tocada a única ópera de Bethoven, Fidelio, uma produção do artista multimédia norte-americano Gary Hill, interpretada pela Ópera de Lyon e dirigida pelo maestro japonês Kazushi Ono. Com um foco na “liberdade, no bem e no mal”, é o trabalho perfeito para o nosso tempo, disse Jonathan Mills, ao jornal britânico. 

A compositora austríaca Olga Neuwirth apresenta a ópera American Lulu a 31 de Agosto, no King’s Theatre. Em American Lulu, Neuwirth recriou a ópera inacabada de Alban Berg, Lulu (1934), deslocando o seu cenário para os EUA, dos anos 1950-60, e transportando os espectadores para as lutas dos direitos civis e clubes de jazz. Nesta reinterpretação, Gerry Cornelius dirige a Orquestra da Ópera Escocesa numa encenação do britânico John Fulljames. 

Leonardo: 240 desenhos anatómicos em exposição.

Paralelamente, The Leonardo da Vinci: The Mechanics of Man inaugura na Galeria da Rainha, no Palácio de Holyroodhouse, em Agosto. Esta colecção, nunca exibida na sua totalidade no Reino Unido, baseia-se no Manuscrito Anatómico A, para o qual Leonardo criou mais de 240 desenhos e notas individuais. As imagens, produzidas em 1510-1511, quando Leonardo completou cerca de 20 dissecações, mostram representações detalhadas da mão, ombro e funcionamento do coração. 

O curador Martin Clayton disse que o projecto procurava analisar, pela primeira vez, a “relevância médica” dos desenhos de Leonardo. Na apresentação do festival, admitiu que esta tinha sido uma “viagem ao desconhecido”, que poderia ter conduzido à conclusão de que o trabalho de Leonardo tinha sido apenas uma “curiosidade histórica, irrelevante para os anatomistas de hoje”. Pelo contrário, os médicos consideram que o detalhe dos desenhos era “surpreendente” pela sua exactidão. “Pela primeira vez vamos exibir os trabalhos do artista ao lado de exemplos espantosos de imagens médicas, mostrando como os métodos e preocupações dos principais anatomistas mundiais mudaram pouco nos últimos 500 anos e quão revolucionárias essas investigações foram”, disse. “Num ano em que o festival se foca na miríade de formas como a tecnologia molda e muda a imaginação dos artistas, não há melhor exemplo do que o do génio de Leonardo da Vinci e o seu entendimento poético e sofisticado da condição humana” disse Mills, ao The Telegraph.
 
 

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