Paulo Portas em defesa das relações com Angola que jornal de Luanda diz estarem condenadas

Editorial do Jornal de Angola defende fim dos investimentos angolanos em Portugal. MNE português diz que fará "aquilo que for preciso dentro da lei" para proteger o bom entendimento diplomático.

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Jornal de Angola deposita esperanças num entendimento com Paulo Portas Adriano Miranda

Depois de, no domingo, ter criticado as instituições portuguesas, como a Procuradoria-Geral da República (PGR), ter duvidado da boa vontade de Portugal nas relações bilaterais com Angola, e ter denunciado uma “perseguição aos interesses angolanos”, o Jornal de Angola defendeu nesta quarta-feira o fim dos investimentos angolanos em Portugal por considerar que o investidor angolano, ao contrário de outros, não é bem-vindo em Portugal.

Ambas as mensagens foram enviadas pela mesma via: um editorial do único diário angolano e órgão oficial do regime de José Eduardo dos Santos sob o título Alvos Selectivos, mas desta vez não assinado (pelo menos na versão disponível na Internet), no qual se considera que Portugal “não é de confiança” e não tem condições “para receber um euro sequer de investimento” e se acusa “as elites portuguesas” de nada quererem “com os investidores angolanos”.

Os dois editoriais foram intercalados com uma nota da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola, em resposta à manchete do semanário Expresso do último sábado dando conta de uma investigação por suspeitas de fraude e branqueamento de capitais, a correr no Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), contra João Maria Sousa, procurador-geral da República de Angola.

O semanário português esclarecia que a investigação, aberta depois de o Banco de Portugal ter sido alertado pelo Santander Totta, na sequência de um depósito feito por uma empresa offshore, estava na fase inicial e ainda não tinha sido convertida em processo-crime. Referia ainda a “especial atenção” dada pelo ministro Paulo Portas às investigações sobre Angola, “para evitar o reacender de conflitos diplomáticos”. Já o comunicado da PGR angolana, enviado à Lusa, repudiava a forma “despudorada” e “desavergonhada” como o segredo de justiça estava a ser “sistematicamente” violado em Portugal em casos relativos a “honrados” cidadãos angolanos.

Proteger as relações, de qualquer forma "legal"
Na terça-feira à noite, Paulo Portas realçou a importância das relações entre os dois países e manifestou disponibilidade para fazer aquilo que fosse preciso “dentro das regras e da lei” para as proteger. Em declarações aos jornalistas em Madrid, divulgadas pela Lusa, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros considerou ainda que “o sistema judicial português não é o lugar adequado para dirimir questões internas de outros Estados”.

No editorial de domingo, intitulado Portugal e Jonas Savimbi, o director do jornal José Ribeiro falava de desconfiança e má-fé e punha em causa o ministro Paulo Portas, que recentemente esteve numa visita a Luanda. Mas, em jeito de conclusão, deixava a porta aberta a um entendimento: “Hoje, Paulo Portas é um grande amigo de Angola e está a ser lançado para liderar a direita portuguesa em caso de as coisas correrem mal à actual coligação, o que mostra que é possível, afinal de contas, um entendimento com Portugal.”

O PÚBLICO tentou, nesta quarta-feira, ouvir Paulo Portas (já depois de uma primeira tentativa no domingo) e o gabinete do primeiro-ministro Pedro Passos Coelho questionando ambos sobre o estado actual das relações diplomáticas entre Lisboa e Luanda e pedindo-lhes que esclarecessem se as relações estão de facto a ser prejudicadas pelas investigações no DCIAP. O assessor de imprensa do ministro remeteu para as declarações da véspera, dizendo que “por agora”, Paulo Portas não tinha “mais nada a acrescentar”. Do gabinete de Passos Coelho não houve, até ao momento, resposta.

Outras investigações por suspeitas de branqueamento
Em Novembro, o Expresso já tinha avançado a notícia, confirmada ao PÚBLICO pelo DCIAP, da existência de uma investigação contra “altos dirigentes angolanos” por suspeitas de fraude fiscal e branqueamento de capitais, sem que no entanto tivessem sido ouvidos ou constituídos arguidos.

Seriam pelo menos três figuras do círculo mais próximo do Presidente José Eduardo dos Santos: Manuel Vicente, vice-presidente de Angola e ex-director-geral da empresa petrolífera nacional Sonangol; o general Hélder Vieira Dias "Kopelipa", ministro de Estado e chefe da Casa Militar da Presidência da República; e o general Leopoldino Nascimento "Dino", consultor do ministro de Estado e ex-chefe de Comunicações da Presidência da República.

Na altura, o Jornal de Angola denunciava, também em editorial, sob o título Jogos Perigosos, o que dizia ser uma “campanha contra Angola do poder ao mais alto nível” em Portugal, e previa que as relações entre Luanda e Lisboa fossem prejudicadas por ter havido um acto de “deslealdade”.

Também em 2008, quando o músico e activista Bob Geldof disse, numa conferência em Lisboa promovida pelo Banco Espírito Santo (BES), que Angola era “gerida por criminosos”, o jornal oficial reagiu de imediato em editorial e criticou, além de Bob Geldof, a imprensa portuguesa que dera voz às acusações do músico. Sobre o banco que patrocinou o evento, disse ter “largos interesses económicos em Angola” e acusou a sua administração de gostar “de lidar com criminosos”, além de deixar um aviso: "Pelos vistos o BES tem que ver quem convida para falar de desenvolvimento sustentado. É que lhe pode aparecer alguém a injuriar governantes estrangeiros".
 
 

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