Toma o comprimido que isso passa
A concurso em Berlim, Efeitos Secundários ou a despedida de Steven Soderbergh do cinema em modo divertimento de género.
Parece que Efeitos Secundários é o último filme de Steven Soderbergh antes de uma reforma (bem merecida, porque desde Sexo, Mentiras e Video que o rapaz não pára). O último é como quem diz, porque ainda falta Behind the Candelabra, o seu filme sobre Liberace com Michael Douglas e Matt Damon, que irá ser exibido no canal HBO nos EUA mas terá estreia em sala fora dos EUA.
Como “ponto final”, há que dizê-lo, Efeitos Secundários (estreia em Portugal a 7 de Março) não é um Soderbergh de primeira água como o foram Ocean's Eleven ou Traffic, nem uma das suas experiências menos evidentes como Bubble ou Vidas a Nu. É, antes, mais um eficiente e eficaz exercício de género como talvez só Soderbergh ainda seja capaz de fazer hoje em dia: um policial mais ou menos clássico que actualiza a velha história do bode expiatório apanhado numa conspiração que o transcende para o moderno mundo dos fármacos.
Há uma mulher deprimida (Rooney Mara, a Lisbeth Salander de David Fincher) a quem um psiquiatra de sucesso (Jude Law, muito sóbrio e muito à vontade) receita um novo anti-depressivo. Sob o efeito do medicamento, ela mata o marido recém-saído da prisão, mas é a reputação do médico que é posta em causa – e, confrontado com o risco de perder emprego, licença e família, começa a investigar e percebe que a história é muito mais complicada do que parece à primeira. E, neste tipo de filmes, é sempre.
Daí que, como “despedida” mais ou menos anunciada, Efeitos Secundários saiba a pouco: é um policial escorreito, desempoeirado, que Soderbergh dirige com a desenvoltura e a economia que lhe conhecemos, mas falta-lhe o rasgo de diferença, de humor, de energia, que o cineasta trouxe, por exemplo, ao recente Uma Traição Fatal. Essa moleza até faz algum sentido – tudo gira à volta de anti-depressivos, que não são conhecidos por darem energia – mas joga contra o filme. E é pena.